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A missa do galo

Jornal O Estado do Maranhão Entre as muitas obras primas do conto produzidas por Machado de Assis, uma é de minha especial predileção, Missa do Galo . O conto é narrado em primeira pessoa por um adulto, Nogueira, incapaz de entender acontecimentos de muitos anos antes, na véspera de Natal, na casa de Meneses, escrivão, contando o rapaz de então dezessete anos. Era ali que Nogueira se hospedava quando vinha de Mangaratiba. Conceição, casada com o dono da casa, tinha trinta anos. Naquela noite especial, o escrivão “foi ao teatro”, senha que usava quando de suas idas à casa da amante, local de seus pernoites uma vez por semana. As pessoas da casa – a esposa, sua mãe e duas escravas – já estavam recolhidas. Nogueira ficou na sala à espera de um amigo com quem iria à Missa do Galo à meia noite em uma igreja próxima. Depois de algum tempo, Conceição veio à sala. Na conversa entre ela e o rapaz, nada acontece objetivamente, mas tudo, subjetivamente. O comportamento dela é ambíguo, como em...

Sapo, queijo, nada

Jornal O Estado do Maranhão Eu morei 10 anos em Brasília onde, entre muitas coisas boas de sua concepção urbanística, há um sistema de endereços capaz de permitir a alguém de fora, sem experiência prévia com a cidade, uma orientação fácil, sem perda de tempo e sem necessidade de perguntas a ninguém no meio da rua. Bastam explicações sucintas sobre a lógica do sistema, tarefa de não mais de cinco ou dez minutos. Falo especificamente do Plano Piloto. A cidade foi concebida na forma de avião e construída sobre dois grandes eixos, referências fundamentais dos endereços. O eixo maior é o corpo, ou charuto, do avião. Na extremidade na direção leste, está a cabine do piloto, com a Praça dos Três Poderes, o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto. Na outra, a oeste, uma grande Torre de TV, o Memorial JK, o Palácio do Buriti, sede do governo do Distrito Federal e diversos órgãos públicos. Entre os extremos estão os prédios dos ministérios e a catedral de Brasí...

Pacificação?

          Jornal O Estado do Maranhão           Pela obviedade de suas falhas, nunca me dei ao trabalho de comentar a política de segurança do Estado do Rio de Janeiro. Deveria ser evidente que, expulsa pelas UPPs – Unidade de Polícia Pacificadora das favelas onde se havia estabelecido e deitado raízes durante décadas, o narcotráfico iria procurar, o mais perto possível de sua base original de operações, local para continuar suas lucrativas atividades. Isso apenas se seus operadores não fossem presos. Não vi nos jornais informação sobre o número de encarcerados na “pacificação” e ninguém tem certeza sequer se tal objetivo estava nos planos das autoridades do Estado nem se elas pretendiam combater também as milícias. Vamos pensar. Se os bandidos não foram parar atrás das grades, onde se meteram? Na Coreia do Norte não, pois lá seriam presos ao entrar naquele paraíso terrestre da classe trabalha...

Lucchesi na ABL

Jornal O Estado do Maranhão            Faleceu no dia 6 deste mês, aos 92 anos, em Belo Horizonte, onde no mesmo dia teve o corpo sepultado, o padre Fernando Bastos de Ávila, ocupante durante 13 anos da cadeira de número 15 da Academia Brasileira de Letras, fundada por Olavo Bilac, já ocupada por Odilo Costa Filho e cujo patrono é Gonçalves Dias. Sua posse na Academia deu-se no ano do quadricentenário da morte de José de Anchieta e tricentenário da de Antônio Vieira e s eu antecessor foi dom Marcos Barbosa. Segundo dom Dimas Lara Barbosa, bispo auxiliar do Rio de Janeiro e secretário-geral da CNBB, “sua biografia atesta a fidelidade de seu amor a Cristo e à Igreja no exercício de um longo e frutuoso ministério presbiteral”. O padre, membro da Companhia de Jesus desde 1935, fez em Roma, onde se ordenou em 1948, mestrado em Filosofia e Teologia, na Universidade Gregoriana. Em 1954, doutorou-se em Ciências Políticas e Sociais na Univer...

Pelo telefone

            Jornal O Estado do Maranhão             Hoje tento evitar temas políticos, sempre contaminados por paixões do momento, e corro os olhos pelos segundos e terceiros cadernos da grande imprensa em busca de um bom tema. Até a página policial – ou principalmente ela – poderia me servir em dias como este, de falta da chamada inspiração, que seria mais bem denominada como falta de disposição para escrever. É no caderno Cotidiano, da Folha de S. Paulo , que tomo conhecimento de uma situação, descrita em crônica de Danusa Leão. Em muitos aspectos é semelhante a mais de uma vivida por mim. E daí, por associação de ideias, lembrei de minha recente entrevista à tv Mirante. Nos dois casos – a da crônica e da minha entrevista – o assunto é o mesmo: os péssimos serviços das companhias de telefonia no Brasil. A cronista narra suas atribulações com estas, no caso a Oi, a respei...

Rosa na Academia

Jornal O Estado do Maranhão      Tomou posse no quadro de membros correspondentes da Academia Maranhense de Letras na quinta-feira passada, dia 14, a Dra. Rosa Pacheco Machado. Ela passou a ocupar a Cadeira N o 5, fundada por João de Melo Viana e cujo patrono é Belarmino de Matos, o Didot Maranhense. É interessante a cadeia sucessória dessa Cadeira e já digo por quê. Ela é sucessora de José Mindlin, conhecido empresário e bibliófilo brasileiro, mais bibliófilo do que empresário, penso eu. Ele por sua vez foi sucessor de Elza Pacheco Machado justamente a mãe da Dra. Rosa.      Com o fim de evitar erro do leitor que poderia supor intencionalidade no fato de ela suceder ao sucessor de sua mãe, informo isto. Quando, em sessão ordinária da Academia, seu nome foi indicado pelo acadêmico Benedito Buzar para ocupar um das Cadeiras vagas na época (17 de setembro de 2009), iniciativa formalizada depois por ele e por mim, os dois subscritores da propo...

Votar

Jornal O Estado do Maranhão      O Brasil com as eleições de hoje aprofunda ainda mais um sistema democrático sólido, que parece ter lançado raízes profundas em nossa cultura nas últimas duas décadas e meia. Evidência do acerto dessa afirmação está no ambiente já estabelecido no país, hostil a sonhos de continuísmo – ou pesadelo, para quem acredita mesmo no princípio da alternância do poder, dentro de regras previamente estabelecidas – de parte não pequena do Partido dos Trabalhadores, inclusive de seus mais altos dirigentes. Centrada na popularidade de Lula, a ideia circulou, envergonhada e acanhada (ou não), entre chefes petistas e os chamados militantes, palavra usada na imprensa internacional na designação de extremistas de todos os matizes. No Brasil ela traz à mente o pessoal do pt .      Precisamos lembrar que populares foram diversos chefes de governo que, por circunstâncias históricas e de outras naturezas, depois se tornaram ditador...