5 de maio de 2002

Lua, júpiter, marte...

Jornal O Estado do Maranhão
Escrevem-me alguns leitores. Dizem ter percebido algo estranho em meu artigo do último domingo. É que não havia nenhuma relação do texto com o título. Além disso, este era repetição de outro, “Todos os Santos”, de um artigo meu anterior, de março deste ano, sobre o livro Olhos da alma: Escola Maranhense de Imaginária, de autoria de Kátia Santos Bogéa, Emanuela Sousa Ribeiro e Stella Regina Soares de Brito. No artigo da semana passada, o assunto era diferente. Não era sobre santos, embora falasse do céu.
Têm razão os leitores. Eu mesmo fiquei surpreso com o título que não dei. Explico. Um dia desses, eu ouvia uma bela canção popular americana, chamada “Fly me to the Moon”, do compositor Bart Howard. Nela, há o romântico pedido de um namorado a sua amada de irem juntos à Lua, a fim de cantar entre os astros, e a Júpiter e Marte, somente para ver como é a primavera lá. Eu me lembrei, então, dos avanços da humanidade na conquista do espaço sideral. Escrevi sobre o assunto. Concluí dizendo não adiantar nada ao homem conquistar o Universo, se não achar também a felicidade. O título era “Júpiter e Marte”. Publicado, ele mudou. Virou “Todos os Santos”.
Afinal, o que aconteceu? Faço suposições apenas. Debito o engano à pressão do tempo nas redações e ao uso intensivo da informática. Essa tecnologia onipresente vive pregando peças nos seus usuários, somente para confirmar a Lei de Murphy, segundo a qual tudo que pode dar errado vai dar errado. De qualquer modo, não poderia ignorar as observações dos leitores. Afinal, eles tiveram o trabalho de escrever-me, apontando a troca dos títulos. Assim, evito o risco de ser acusado de ter a cabeça no mundo da Lua, ou nos de Júpiter e Marte.
Mas, já que o assunto é o Universo, abro espaço, aqui mesmo em nosso planeta, para falar das novas câmaras fotográficas colocadas no telescópio espacial Hubble em março. Esses equipamentos ampliam a visão da humanidade sobre o infinito do Universo e ajudam-nos a avançar em nosso conhecimento. Temos dele, agora, imagens mais nítidas e deslumbrantes. Elas mostram um berçário estelar na nebulosa do Cisne e uma impressionante colisão de duas galáxias, entre outras fotos. Astros antes tão longe de nós, que sequer podíamos percebê-los, ficaram de repente ao alcance de nossas vistas.
Isso me leva a pensar na Lua, admirada e reverenciada durante milhares de anos, até a chegada do homem lá, o que não diminuiu seu fascínio. Como ao nosso satélite, tão próximo, chegaremos a outros corpos celestes distantes. Já começamos a admirá-los à distância. Chegará o dia, porém, não importa quantos milhares ou milhões de anos isso possa levar, de passearmos neles e entre eles, esquecidos, pelo menos durante esses momentos de deslumbramento, da dura realidade da vida quotidiana que é, como diz o grande escritor argentino Ernesto Sabato, “uma desoladora confusão de belos ideais e canhestras realizações”. Contemplar o infinito universal é uma forma de ter a ilusão de que se pode escapar da mediocridade geral.
A mesma fascinação do primeiro ser humano a levantar os olhos para o céu e espantar-se com a Lua e as estrelas, domina agora não só os astrônomos e outros profissionais, mas todos os olhares voltados em direção ao céu, a interrogarem-se sobre o começo e o fim de tudo. Tudo começou, segundo a teoria do Big Bang, com uma grande explosão, há bilhões de anos, de um “átomo primordial” que ocupava um espaço infinitesimal, dando origem a um Universo em expansão até hoje.
Virá a hora, no entanto, de essa força expansiva ser mais do que compensada pela força da gravidade. O Universo irá contrair-se, terminando por concentra-se de volta naquele átomo singular. De acordo com uma variante da teoria, a partir desse momento haverá uma nova explosão, em um processo cíclico sem fim. E sem começo. Esse um dos grandes mistérios perante a humanidade. Ele vem inquietando a mente humana há milênios. Será, algum dia, totalmente compreendido pelo homem?

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