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Mostrando postagens de maio, 2010

Vida kafkiana

Jornal o Estado do Maranhão , 30/5/2010 A imprensa deu notícia há poucos dias de um caso terrível. Em Curitiba um homem ficou preso durante um ano e dois meses, mesmo depois de inocentado da acusação de assalto a uma residência. Os policiais suspeitaram dele apenas porque os verdadeiros assaltantes moravam no mesmo bairro do inocente. O pobre pizzaiolo afirmou que vai processar o governo do Paraná por sua prisão. A prevalecer essa ideia de moradores da vizinhança de bandidos também o serem necessariamente, teríamos de criar bairros exclusivos de marginais, a fim de evitar que as pessoas honestas fossem com eles confundidas. Agora outro caso, mais terrível ainda. Na época do Estado Novo, em 1937, na cidade de Araguari, em Minas Gerais, um homem, Benedito Pereira Caetano, enganou seus dois sócios e primos e fugiu com toda a receita resultante da venda da safra de arroz pertencente aos três. Os enganados, os irmãos Joaquim e Sebastião Naves, denunciaram o ladrão à polícia e acabaram pas

Pantojão

Jornal O Estado do Maranhão, 16/5/2010 Quando morre um amigo de décadas – amigo de 43 anos no caso de Afonso Celso Santos Pantoja –, é inevitável lembrar-me daquelas palavras de Machado de Assis, ditas há 122 anos, por ocasião da morte de seu amigo maranhense Joaquim Serra: “Quando há dias fui enterrar o meu querido Serra, vi que naquele féretro ia também uma parte da minha juventude.”. Envelhecer é em grande parte isso, ver que pouco a pouco parentes e amigos, gente que conosco conviveu por longo tempo, vão desparecendo, levando (para onde, afinal?) um pedaço do patrimônio em comum conosco, sua cota, por assim dizer, sem o ausente nomear um substituto, de um condomínio compartilhado de ideias, alegrias, tristezas, decepções, amores, ódios e todos os mais sentimentos que são parte da aventura de viver, e, ao mesmo tempo, e a despeito desse compartilhamento, formam experiência singular a cada ser humano, impossível de ser comunicada ao próximo em sua plenitude ou, ainda, de ser sentid

A BOLA COMO METÁFORA

BLOG DE REINALDO AZEVEDO quarta-feira, 12 de maio de 2010 | 4:51 Sentei aqui para falar da não convocação de Neymar e Ganso. Mas acho que há algo mais rondando aqui a minha cachola. Na política, nas ciências, nas artes, no pensamento, a voz do povo não é a voz de Deus. Ao contrário até: o capeta costuma ser mais íntimo do alarido das ruas do que o Altíssimo. Os grandes horrores da história foram perpetrados quase sempre sob o calor enfurecido da turba ou sob seu silêncio frio e cúmplice. Se “o povo” fosse um ente, teria uma longa lista de crimes nas costas. Mas não é. A democracia representativa é uma grande invenção porque os lugares de mediação das demandas — o Legislativo, o Judiciário e o Executivo — geram eles próprios um novo saber, que é diferente do saber das ruas. Se as massas querem, para citar um exemplo, justiça imediata — de que o linchamento é expressão máxima —, o Poder instituído tem de dizer “não” porque esse imediatismo traz consigo o risco de degeneração do sist

O CASO DOS BARCOS APREENDIDOS PELO IBAMA - O QUE FAZ, AFINAL, A SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DE SÃO JOSÉ?

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Barco colocado pelo Ibama sob a responsabilidade da Secretaria de Meio Ambiente de São José de Ribamar pelo Ibama e que foi danificado, tendo inclusive sido afundado. Foto do último dia 1 de maio  Detalhe de dano causado ao barco.   Utilizadas sem cuidado pelos que foram indevidamente passear e fazer comércio particular com o barco, com infração da lei, as velas foram danificadas, com prejuízo para o proprietário. Antes estavam cuidadosamente acondicionadas no interior da embarcação. O dono do barco, seu Pipi, tenta diminuir os danos.   Outro detalhe das velas danificadas. O Secretário de Meio Ambiente de São José de Ribamar, Isaac de Tal, telefonou para o fotógrafo Edgar Rocha e o ameaçou de denúncia à Polícia Federal, atitude típica de quem, vendo-se acossado pelos fatos, procura intimidar quem lhe exige o cumprimento da lei. Voltarei ao assunto no momento apropriado. O Secretário, por sinal, tentou intimidar também a presidente do Conselho Regional de Economia ao

O Acordo Possível II

Jornal O Estado do Maranhão , 2 de maio de 2010 Um dos argumentos contra o Acordo de Reforma Ortográfica de 1990 é de caráter político-econômico na superfície, porém de fundo emocional em sua essência, de mistura com um nacionalismo démodé. Tomo como representativo dessa visão Vasco da Graça Moura, tradutor de A Divina Comédia , de Dante, para o português, renomado intelectual e um dos mais ativos opositores das mudanças. Por serem extremadas, suas posições acabam deixando claros pontos de vista implícitos que de outro modo não se mostrariam. Ele as formalizou no Diário de Notícias , jornal do Porto, entre 21.11. 2007 e 23.4.2008, e em intervenção na Assembleia da República de Portugal em 7.4.2008. Quais os seus argumentos? “Não deixará de haver grupos editoriais brasileiros que a grande velocidade lhe tomarão (de Portugal) o lugar em África [...] uma vez que não têm de fazer absolutamente nada para se adaptar à situação” (28.11.2007). Desta vez o grande homem se deixa levar pela e