31 de março de 2013

Pelo Misnistério Público

Jornal O Estado do Maranhão        

           Há uma discussão no Brasil a respeito da legitimidade do Ministério Público em fazer investigações criminais. Decorre daí a tramitação no Congresso Nacional da Proposta de Emenda Constitucional 37 ­­que, se aprovada, alterando nossa Constituição, criaria ameaça real à garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos porque ela pretende modificar o status do MP com respeito àquelas investigações, tornando a competência exclusiva das Polícias Federal e Civil.
          Como as guerras, que, de tão importantes à vida das nações, não podem ser confiadas exclusivamente aos generais, esta batalha não pode ser deixada tão só aos especialistas em direito. Os cidadãos leigos neste campo de estudos, como eu, podem e devem participar.
          Eu vejo a iniciativa como parte essencial e a mais perniciosa da campanha do PT contra o Supremo Tribunal Federal e contra o Ministério Público, pela exemplar atuação dos órgãos no mensalão. Alguém duvida das absolvições de José Dirceu e seus asseclas na ausência do MP nas investigações, como quer a PEC? Não, ninguém duvida, nem os petistas, nisto em inusitada convergência com os cidadãos ansiosos por ver um combate efetivo à corrupção.  
          Afastado o órgão ministerial, todo o trabalho de investigação da Polícia Federal, sua parceira, teria sido, nesse caso emblemático de combate ao crime, inútil para a sociedade, não por culpa da PF, mas de instâncias decisórias superiores do Executivo, como acontece com frequência. É limitação inerente a qualquer órgão dessa esfera de Poder, como o são as polícias. São os já condenados e os que os protegem os primeiros interessados em ver os promotores e procuradores pelas costas. Em outras palavras, os políticos corruptos e seus aliados no governo e no Congresso, como, por exemplo, o senador Fernando Collor, afastado da Presidência da República, vamos relembrar, por corrupção. Ele é inimigo declarado do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
          A quem mais interessa ver os promotores longe da cena do crime? Aos policiais que não cumprem suas obrigações e cometem arbitrariedades. Refiro-me somente, fique claro, a parcela minoritária da instituição. Mesmo assim, esses casos representam a parte maior das ocasiões em que a legitimidade do MP é questionada. Isso não é matéria de opinião, mas de fato. As estatísticas estão disponíveis. Não estou acusando os policias, ou outras pessoas que defendem a PEC 37, de agirem de má fé. Não. Digo unicamente isto: a PEC coincide com os interesses daquela minoria, que deseja ser investigada unicamente por sua própria corporação. De relação incestuosa desse tipo nunca saiu nem poderia sair bons resultados. A atuação do MP no controle externo e fiscalização da atividade policial incomoda exclusivamente quem tem culpa no cartório.
          Ouve-se dizer que constitucionalmente a investigação criminal é de competência exclusiva das polícias. Se fosse mesmo, então não haveria necessidade de PEC nenhuma. Ela afirmaria o já afirmado. Todavia, os entendimentos do STF e do Superior Tribunal de Justiça são outros. Há várias decisões favoráveis ao MP. Os tribunais superiores têm hoje uma jurisprudência consolidada acerca dessa matéria, da qual emerge muito claramente que a Constituição brasileira não dá exclusividade de investigação às polícias. A competência do Ministério Público de investigar crimes tem sido reconhecida seguida e unanimemente pela segunda Turma do STF.
          O legislador de 88 foi sábio ao não restringir a uma instituição apenas a competência de investigações criminais e ao atentar ao mandato constitucional do MP: o zelo pelo efetivo respeito aos direitos assegurados pela Constituição “promovendo as medidas necessárias à sua garantia”.
          Mas, afinal, duas cabeças pensam, ou não, melhor do que uma? Qual prejuízo à ordem democrática e os direitos do cidadão poderá advir da existência de mais de uma investigação do mesmo crime? Se a PEC fosse aprovada, o Brasil passaria a compor o grupo hoje formado por Ruanda, Gana e Indonésia, os únicos países em que o Ministério Público não investiga crimes.

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