20 de novembro de 2016

Justo e legal

Jornal O Estado do Maranhão

          Leio declaração de João Ricardo Costa, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, feita na quinta-feira passada, sugerindo o afastamento do senador Renan Calheiros da presidência do Senado, pois ele, afirma João Ricardo, usa a importância de seu cargo para tentar resolver seus variados problemas com a justiça.
          O presidente da Associação exterioriza ponto de vista dos cidadãos minimamente preocupados como o futuro do Brasil, pois o conserto da nossa economia exige e exigirá dos brasileiros pagamento por crime que não cometeram, recaindo sobre os mais pobres o peso relativo maior das medidas corretivas a serem tomadas.
          Seu pronunciamento se deu após reunião com a presidente do STF, Cármen Lúcia, e os presidentes de duas outras associações de juízes, para pedir manifestação dela acerca da instalação de comissão especial do Senado, com a missão de identificar servidores públicos que estariam ganhando acima do teto constitucional.
          Há aqui duas questões. Devemos separá-las. A primeira é a atitude retaliatória de Renan Calheiros. Neste aspecto, podemos admitir que as associações tenham razão, mas tal postura do senador não alteraria a realidade dos fatos. Interessa saber, em primeiro lugar, se existem, ou não, remunerações que afrontem mandamento constitucional. Existem? Dar resposta a essa pergunta é a primeira tarefa da comissão.
          Seja qual for, no caso do Judiciário, mas também dos outros poderes, os nomes dados ao que está sendo chamado de super-remuneração, tais como adicional a cada cinco anos de magistratura; auxílio-transporte; auxílio-alimentação; auxílio-moradia; auxílio-capacitação; auxílio-plano de saúde; auxílio mudança; auxílio-creche; auxílio-plano de saúde, para dependente; auxílio-educação para segundo filho em escola privada; adicional por curso, em sentido amplo, de pós-graduação; por mestrado; por doutorado; por função administrativa no tribunal; por participação em mutirões; por produtividade; por locais de difícil acesso; por permanecer na ativa mesmo tendo tempo para aposentadoria; e venda de metade dos 60 dias de férias; seja qual for o nome dado, eu dizia, e sem entrar no mérito de saber se situação como essa seria justa e, ao mesmo tempo, legal, a fonte dos recursos é uma só, o pobre contribuinte.
          Essa segunda questão não pode deixar de ser discutida. A tentativa de desqualificar a criação da comissão apenas porque foi Renan quem a propôs é usar o mesmo argumento subjetivo de Dilma Roussef a respeito da aceitação por Eduardo Cunha da tramitação do pedido de impeachment dela. O Congresso quis saber se havia fatos concretos, não quem eram os denunciantes. A denúncia era somente ponto de partida para investigações adicionais. Notemos, ainda, que a discussão de agora é semelhante àquela sobre alteração na lei de abuso de autoridade, também patrocinada por Renan. Pelo visto, onde ele se mete, as coisas ficam embaralhadas.
          O debate sobre esse problema, embora exija rapidez, pelos seus potenciais efeitos nas finanças públicas, deveria ser deixado para depois, em ambiente menos contaminado por Renan, mas ela não poderá ser deixada para as calendas gregas, tem de ser feita no início de 2017 no Congresso Nacional.

6 de novembro de 2016

Noites maldormidas

Jornal O Estado Maranhão

           Dirijo-me ao prefeito de São Luís, Edivaldo Holanda Filho. Faço-o, às vésperas do início de seu segundo mandato consecutivo como prefeito de São Luís, a fim de apelar por seu empenho – em cooperação com o governo do Estado e o Ministério Público do Maranhão –, na resolução definitiva de grave problema, que afeta o dia a dia de milhares dos habitantes de nossa cidade, mas não exige do poder público, para sua resolução, novos investimentos, pois demandará apenas a utilização de pessoal e equipamentos já existentes no Executivo.
          Senhor prefeito, falo da poluição sonora, cujas fontes são bares, casas de shows, clubes e estabelecimentos assemelhados assim como veículos automotores. Não preciso deter-me, a fim de enfatizar a gravidade do transtorno, em detalhes dos prejuízos à saúde das pessoas, causados pela emissão de ruídos emitidos acima de determinados níveis, já de longo tempo estabelecidos tanto na legislação estadual, pela Lei do Silêncio (Lei 5.715, de 1993, alterada pela Lei 8.364, de 2006), quanto na federal, esta última sistematizada na Resolução no 1 do Conselho Nacional do Meio Ambiente e na NBR 10.151 - Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas, da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.
           Dou, tão só, exemplo da área onde moro, apenas um entre centenas, ou, até, milhares. Aqui tivemos, até pouco tempo atrás, luta de mais de três anos contra um poluidor sonoro. Ele reunia em eventos festivos de fim de semana mais de duas mil pessoas em algumas ocasiões. Vencemos, com o apoio do IPHAN e do Ministério Público Federal, tendo decisão da Justiça Federal criado condições para o fim da anomalia, pois os eventos ameaçavam o forte de Santo Antônio, bem do patrimônio histórico nacional. A fonte da poluição teve de se retirar do local. Isso depois de várias tentativas infrutíferas na Justiça Estadual, em sua área de competência. Agora tenho notícias de situação semelhante a essa, em bairro residencial, criada pela tabacaria Big Joe. O caso não é diferente do que ocorre em toda a cidade, em áreas chamadas nobres, nas populares e em bairros de classe média, todos estes grupos de moradores merecedores de proteção igualitária da lei.
          É fácil imaginar o que sofrem crianças convocadas pelos regulamentos escolares a acordar cedo com o fim de ir à escola na manhã seguinte, sem terem tido um bom sono na noite anterior, ou recém-nascidos sem poder dormir, sob intenso estresse; ou enfermos obrigados a suportar a falta de repouso adequado, em consequência de noites maldormidas, empecilho real a sua recuperação; ou, ainda, idosos impedidos de atender suas necessidades de sossego, próprias da idade. É drama de milhares de cidadãos de São Luís, mas também dos outros municípios da Ilha.
          Senhor prefeito, creio falar em nome dessas pessoas. Muitas vezes, elas não têm acesso a meios com que possam expressar suas queixas. Não podemos permitir que nossa cidade passe a ser conhecida como a capital da poluição sonora, lugar onde não se cumpre a Lei do Silêncio. Confiamos em sua sensibilidade e em sua capacidade de liderar, em parceria com outras esferas de governo e outros órgãos, a coordenação das ações necessárias à eliminação desse problema.
          Esse, o apelo.

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