22 de outubro de 2006

Manipulação

Jornal O Estado do Maranhão


No debate da semana passada entre os candidatos a governador do Maranhão, encontrando-se de um lado a senadora Roseana Sarney e do outro o ex-prefeito de São Luís, Jackson Lago, este afirmou que 900.000 maranhenses já deixaram o Estado como resultado de dificuldades econômicas e pôs a “culpa” desse suposto êxodo no grupo Sarney, ao qual atribui com freqüência tudo que acontece no Maranhão desde 1612 ou antes.
Esse antiqüíssimo discurso, tão antigo quanto as idéias dos anos cinqüenta do ex-prefeito, não deixa de ser um tributo inconsciente, pois confere aos adversários terríveis poderes, capazes de fazer José Sarney voltar séculos no tempo a fim de reescrever a história, assumindo culpas antigas de nossa formação social, se se pode colocar culpa em alguém pelo males do Maranhão em quatro séculos de história. Mas, muita gente autodenominada marxista ou socialista, adepta de interpretações grandiosas e grandiloqüentes da história, não resiste ao impulso de procurar culpados individuais, esquecendo suas próprias idéias sobre “grandes forças históricas”. Que fazer?, como perguntaria o companheiro Lenine.
O leitor estranhará por certo o gigantesco número 900.000, quase um milhão. Qual o sentido de falar-se em um movimento migratório do tamanho desse, se não se indica o período de sua ocorrência, se não se especifica a unidade de tempo? A idéia de fluxo, pois é disso que estamos tratando, é a de “quantidade por unidade de tempo”.
Se, por exemplo, esse monte de gente saiu daqui durante, digamos, o ano passado, então poderemos dizer que o fluxo foi de “900.000 pessoas (quantidade) em um ano (unidade de tempo)”. Neste caso, um quinto da população teria emigrado e estaríamos diante de um fenômeno extraordinário, incomum em qualquer lugar ou tempo, comparável talvez ao acontecido no século XIX com o Paraguai. O país teve a população em muito diminuída como conseqüência da Guerra com a Tríplice Aliança composta pelo Brasil, Uruguai e Argentina. Ao que eu saiba, o Maranhão nunca guerreou, vamos dizer, com o Pará, por questões de limite, que as houve durante certo tempo, nem com o Piauí nem com ninguém.
Se não foi assim e a migração ocorreu em período muito mais longo, de, vamos supor, 100 anos, então a conversa é outra e estaríamos falando de um fenômeno de natureza diversa, todavia comum, aceitável, compreensível, porque a saída de tanta gente num tempo tão longo se enquadra em padrões migratórios de longo prazo . Se, no entanto, isso aconteceu nos últimos quatro, oito ou doze anos, deveríamos analisar os números com mais cuidado. Para isso, sua apresentação de maneira honesta é necessária.
O certo é isto. A menção a dados numéricos no debate exemplifica muito bem a manipulação de informações de parte do candidato da antiga oposição, hoje no governo, bem como torna evidente a tentativa de enganar o eleitor, na suposição de ser fácil fazê-lo. Ele, no entanto, está mais atento do que imagina esse agrupamento de oficialistas ruborizados que se recusa a admitir que tem o apoio desse mesmo governo na presente eleição.
Atitudes como essa de agora mostram um padrão de outrora. Quem não se lembra da negativamente famosa inovação representada pelas inaugurações de obras públicas em forma de maquetes, feitas pelo ex-prefeito às vésperas de deixar o cargo, no afã de criar uma imagem de governante empreendedor e de tirar proveito eleitoral de obras de ficção, deixando porém o pepino da cobrança dos eleitores nas mãos e no cofre de seu sucessor? Quem lesse as notícias dos jornais da época acreditaria que obras de pedra e cal e não de gesso e cola seriam inauguradas.
Métodos de administrar desse tipo levaram a escândalos como o do sumiço de caminhões da Coliseu, empresa de coleta de lixo da prefeitura.


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