10 de dezembro de 2006

Nada e tudo

Jornal O Estado do Maranhão

Folheio os jornais da semana anterior à passada e leio com alegria a notícia da absolvição pelo Superior Tribunal de Justiça, por 23 votos a zero, do desembargador Mílson Coutinho, em ação penal proposta pelo Ministério Público Federal, originada em representação da Associação dos Magistrados do Maranhão acerca de hipotética contratação irregular de funcionários pelo Tribunal de Justiça do Estado durante o período em que ele foi seu presidente. Minha surpresa foi nenhuma, pois isso era mesmo reclamado pelo bom senso, que nem sempre está presente nas proposituras do Ministério Público, ou nas sentenças dos tribunais, que dão, algumas vezes, a impressão de pretenderem atuar em algum vácuo social, cegos às exigências de uma sociedade complexa como a nossa, como no caso da derrubada pelo STF da cláusula de barreira para os partidos políticos. Surpresa foi descobrir que o STJ havia tomado a decisão havia algumas semanas, sem Milson, durante esse tempo, ter dito uma palavra sequer sobre o assunto a nós, os seus confrades da Academia Maranhense de Letras freqüentadores do Jomingo, reunião domingueira assim batizada por Benedito Buzar, numa alusão ao Sabadoyle, encontro de intelectuais cariocas aos sábados na casa de Plínio Doyle, bibliófilo e criador do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira. A nossa é aos domingos, no Renascença, na residência de Jomar Moraes. Daí o Jomingo, com o “Jo”, de Jomar, e o “mingo”, de domingo. Dela participam regularmente, além, claro, do anfitrião, Lourival Serejo, Mont’Alverne Frota e eu, sendo esse o “núcleo duro” do grupo. Há, porém, participantes eventuais, que sempre os haverá a fim de dar respaldo a nossos decretos literários. Pois Mílson, que foi defendido com brilhantismo por Alberto Viera da Silva, outro confrade da AML, preferiu, apesar dessa fraterna convivência semanal, quase esconder de nós sua vitória, aliás como ele faz com freqüência, característica sua ao longo de décadas como jornalista, advogado militante, procurador do Estado, consultor jurídico da Assembléia Legislativa do Estado, membro da AML e do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e historiador com 23 livros sobre a história do Maranhão. O que fez ele, afinal, para merecer tal embaraço? Nada. Ou melhor, tudo. Tudo que era seu dever e por isso não se entende sua inclusão na ação. Sua antecessora, Etelvina Gonçalves, em corajosa iniciativa criou por lei o quadro permanente de funcionários do Tribunal velho de mais de 190 anos. Como determina a Constituição do Brasil, o preenchimento das vagas teria de ser feito por concurso público. Assumindo a presidência, Milson, apesar das resistências, determinou sua realização, mas só pôde homologar o resultado no último dia de sua gestão, após rechaçar várias ações de grupos interessados em dificultar a realização do certame. Seu sucessor, o desembargador Militão Gomes, não poderia demitir de imediato todos os contratados, sob pena de provocar o caos administrativo no Poder Judiciário. Iniciou então, gradativamente, as demissões e as nomeações, sem incluir nestas ninguém que não estivesse na lista dos aprovados. O procedimento sensato completou o processo histórico de legalizar a situação administrativa do Poder. Assim como Mílson, foram objeto da ação os ex-presidentes Jorge Rachid, Bayma Araújo, Etelvina Gonçalves, absolvidos também por unanimidade. Todavia, como não contratar sem concurso na época de suas administrações, se não houvera inda condição de criar-se o quadro de funcionários e de realizar-se o concurso?. Lamentável, é que o desembargador João Miranda Sobrinho, falecido havia 7 anos, foi também denunciado. Há uma ironia em tudo isso. O homem que apenas seguiu a lei foi acusado de desrespeitá-la. Não importa. A justiça prevaleceu.

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