12 de junho de 2002

Meio ambiente na ilhinha

Jornal O Estado do Maranhão
Uma velha amizade e uma mais velha ainda admiração pelo comovente esforço de auto-organização de comunidades pobres em São Luís levaram-me a falar sobre preservação ambiental, quarta-feira passada, à noite, dia mundial do meio-ambiente, em uma pequena igreja na Ilhinha. Embora essa não seja mais minha área de atuação profissional, um amigo meu, o jornalista Aldir Dantas, homem profundamente religioso, atuante na Igreja Católica, na Pastoral Familiar, achou que minha experiência como Secretário de Meio Ambiente do governo Roseana Sarney, poderia ser de alguma utilidade em uma conversa informal com membros da comunidade Santo Antônio, naquele bairro.
O convite veio dessa avaliação feita por ele e um pouco, também, de sua perene esperança de minha conversão e da pronta redenção de meus pecados, que eles diz não serem muitos nem mortais. Será verdade? Mas, quem sabe, algum crédito ganharei por conta dessas poucas horas de aprendizado. Poderei usá-lo para alcançar uma hipotética vida de bem-aventurança mais tarde!
Concentrei-me em fazer os membros da comunidade verem que a preservação faz sentido por uma razão econômica, tão importante quanto à que leva todos a preocuparem-se com o efeito sobre a saúde das pessoas, do lançamento, no ambiente, de esgotos in natura, exemplo de fácil compreensão por todos os presentes ao encontro. Afinal, eles convivem diariamente com o problema. Tentei mostrar a destruição da base de recursos naturais de nossa sociedade, através do desmatamento e do uso predatório de qualquer recurso natural não renovável, e da prática de uma agricultura predatória, como uma ameaça concreta a seus empregos.
O motivo poder ser percebido com facilidade.  Sem essa base, as empresas não poderão aumentar a produção ou o farão a custos maiores, sempre repassados aos preços. Ora, sem incremento da produção, novos empregos não poderão ser criados e muitos dos existentes serão eliminados. Ou, se os produtos se tornarem mais caros, muitos de seus consumidores anteriores não poderão mais adquiri-los. Nestas circunstâncias, os mais pobres serão os mais penalizados. Portanto, a preservação, longe de ser um “obstáculo” ao desenvolvimento, é sua pré-condição.
  No entanto, é comum ouvirem-se referências, nos meios políticos e econômicos, à preservação como impeditiva do crescimento. Ela estaria “criando problemas” a novos investimentos, necessários justamente à criação de empregos. A referência desses críticos pode ser a grupos que vêem a preservação como um fim em si mesmo, como se o meio ambiente fosse intocável. Se for esse o caso, suas críticas estarão certas. Mas, não se trata disso, certamente. A maioria dos ambientalistas quer preservar, exatamente para poder crescer.
É esse esforço que, em regiões pobres, cria um falso dilema, fonte de muitos equívocos. A aplicação estrita da legislação pode gerar situações de ameaça à sobrevivência de grupos sociais vulneráveis, que ganham seu sustento, por falta de alternativas, com atividades nocivas ao meio ambiente. O que fazer? Aplicar a fria letra da lei, desconhecendo, até, um estado de necessidade, e criar a ameaça de fome para eles? Ou não aplicá-la, permitindo a destruição e correndo o risco de sanções legais, por omissão?
Em verdade, as duas coisas podem ser feitas simultaneamente, sem prejuízo para as pessoas e o meio ambiente. É imperativa, para isso, a criação, pelo setor público, de alternativas econômicas para esses grupos, que lhes permitam sobreviver com o mínimo de impactos sobre o ambiente. Proibir, tão-só, é inócuo, pois seria impossível controlar a pressão originada na necessidade de continuar a viver. Permitir tudo, em nome da sobrevivência, seria provocar mais pobreza em pouco tempo.
Por ora, é bastante animador ver o permanente interesse de comunidades humildes, como essa da Ilhinha, pela preservação. É prova da força da causa e de sua importância cada vez maior em nossas vidas, hoje, e nas de nossos filhos e netos, amanhã.

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