25 de novembro de 2007

Machado e maranhenses

Jornal O Estado do Maranhão
Como cronista nos jornais do Rio de Janeiro, Machado de Assis fez, durante décadas, muitas referências a coisas e fatos do Maranhão, e a seus escritores. Entre estes, tinha especial admiração por Gonçalves Dias. Em crônica de novembro de 1893, revela que o vira pela primeira vez na redação do Diário do Rio de Janeiro e se emocionara: “Ouvia cantar em mim a famosa Canção do Exílio”. Mas, a muitos outros escritores maranhenses dedicou atenção também.
Em conhecida página de crítica, “A Nova Geração”, de 1879, publicada na Revista Brasileira, analisa um grupo que ia surgindo, de novos escritores. Entre eles, os maranhenses Teófilo Dias e Artur Azevedo. Aí, na primeira parte da análise, afirma o declínio do Romantismo e reafirma alguns conceitos estéticos sobre o Realismo, como já o fizera e viria ainda a fazer em outras ocasiões. Não deixa, porém, de colocar a discussão em perspectiva histórica apropriada ao ligar o ocaso do Romantismo ao “desenvolvimento das ciências modernas, que despovoaram o céu dos rapazes, que lhes deram diferente noção das coisas, e um sentimento que de nenhuma maneira podia ser o da geração que os precedeu”.
Não haveria, por isso, de condenar-se de forma absoluta um movimento literário que fornecera contribuição decisiva para nossa independência literária. E o Realismo? Tinha seu programa algum direito à exigência de ser chamado de verdadeira arte? Para Machado ele “é a negação mesma do princípio da arte” e “se a exata cópia das coisas fosse o fim da arte, o melhor romance ou o melhor drama seria a reprodução taquigráfica de um processo judicial”. No entanto, no ano anterior, 1878, em análise de O primo Basílio, de Eça de Queiroz, afirmava que “alguma coisa há no Realismo que pode ser colhido em proveito da imaginação e da arte”. Nesse quadro de idéias analisa a nova geração.
A Gonçalves Dias existem três curtas referências, de passagem apenas. Numa delas compara sua poesia com a de Teófilo Dias. “A Gonçalves Dias sobrava certo vigor, e, por vezes, tal ou qual tumulto de sentimentos, que não são o característico dos versos do sobrinho”. Para Machado o tom principal deste é a ternura cheia de melancolia e certa audácia de estilo. Descobre no espírito do poeta maranhense, ao comparar seu último livro, Cantos tropicais, com o anterior, Lira dos verdes anos, tendência nova, mais de acordo com os novos tempos.
De fato, uma das características da poesia da recente escola era a rejeição ao puro sentimentalismo romântico e a invocação de conceitos como Justiça, Liberdade, Revolução, Socialismo, Positivismo e outros que, constituindo nobres aspirações sociais, certamente não poderiam ser tomados como ideais literários ou estéticos. No poema Poesia Moderna, essas características se mostram e fazem sentir a Machado “que esses toques políticos do Sr. Teófilo Dias são de puro empréstimo, talvez um reflexo do círculo de amigos”. A avaliação final é positiva, pois diz que seu verso é melódico e puro.
Não é o caso com Artur Azevedo. Neste não encontra Machado a mesma propensão presente no poeta dos Cantos Tropicais, e considera sua poesia puramente satírica. De O dia de finados, A rua do Ouvidor e Sonetos diz “que o estilo de tais opúsculos é incorreto, que a versificação não tem o apuro necessário, e aliás cabido em suas forças. Sente-se naquelas páginas o descuido voluntário do poeta; respira-se a aragem do improviso, descobre-se o inacabado do amador”. Mas o defeito mais grave que lhe acha está em outro aspecto. “A cor das tintas é demasiado crua, e os objetos nem sempre poéticos”. Acha, de qualquer modo, nos sonetos do maranhense a melhor parte de sua obra, julgamento que não contempla evidentemente a produção completa de Artur, ainda em construção naquele 1879.

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