18 de dezembro de 2005

Ratos e Homens

Jornal O Estado do Maranhão 
Pesquisas científicas que procuram maneiras de utilizar células-tronco em seres humanos provocam intensos debates, pelas dúvidas que suscitam no campo da ética. Ao contrário das demais células, elas são capazes de se diferenciar, constituir diferentes tecidos em nosso organismo e de se auto-replicar. No entanto, tão-só as embrionárias, assim chamadas por serem encontradas nos embriões, podem se diferenciar ou se transformar em qualquer um dos 216 tecidos do corpo humano. O restante das células-tronco podem, em um caso, modificar-se em quase todos os tecidos, menos na placenta e anexos embrionários; em outro, se diferenciam em poucos; no último caso, em apenas um tecido. Elas poderão ser úteis, para citar somente dois casos de aplicação promissora, na cura da diabetes e na regeneração de lesões graves. (Não, eu não me tornei de repente um especialista no assunto, só usei a internet para obter essas informações no sítio do jornal O Estado de S.Paulo, na seção sobre educação).
Pois bem, acabo de ler na imprensa que o biólogo paulistano Alysson Muotri, à frente de equipe de cientistas do Instituto Salk de Estudos Biológicos, nos Estados Unidos, injetou células-tronco embrionárias humanas (CTEHs), ainda na barriga da mãe, no cérebro de filhotes de ratos. Elas se integraram com perfeição a estes, criando uma cobaia que passou a ter um órgão em parte humano, pelo menos do ponto de vista físico. Após o nascimento, os cientistas os sacrificaram com o fim de examinar sua estrutura cerebral. Descobriram que as CTEHs se espalharam por toda a massa craniana dos filhotes e conectaram-se com as células comuns. Na opinião do Dr.Allysson, as perspectivas são boas: “Poderíamos transplantar CTEHs derivadas de pacientes com Alzheimer [por clonagem] para o cérebro de animais normais e observar a capacidade de integração e diferenciação delas”. Eles funcionariam como modelos de doenças neuronais e seriam de fácil observação.
Se, como acabamos de ver, é possível injetar células humanas em animais por que não seria admissível o processo inverso? Isso com certeza não foi feito ainda pelos cientistas, mas não tenho dúvida de que a natureza já o fez há muito tempo, em verdade desde a humanidade se pôr de pé e andar ereta, olhando para a frente, achando-se superior a seus parentes do reino animal, com o nariz levantado, como a grã-fina de Nélson Rodrigues, no Maracanã. Em algum ponto da evolução das espécies (com a devida licença dos criacionistas) houve a transferência de células-tronco de ratos para certo tipo de seres humanos. Comprovaremos tal afirmação se observarmos com atenção o comportamento de exemplares com forma humana e mente de rato, que agem o tempo todo como roedores, sendo a comparação desfavorável a estes, que roubam e roem, quando roubam e roem, apenas pela instinto de sobrevivência e não pelo desejo de ostentação de riqueza e vontade de mando, intrinsecamente ligados ao tamanho do patrimônio desse pessoal.
A cena política brasileira nos fornece hoje incontáveis exemplos disso, que não é uma teoria, mas uma constatação: caixa dois, caixa três, recursos não contabilizados, mensalão, contas no exterior, dólares na cueca, mentiras nas CPIs do Congresso, surtos de “eu não sabia, não vi, estava bêbado”. Humanos com células-tronco de ratos, auto-intitulados, até bem pouco tempo atrás, monopolistas da honestidade e da pureza de intenções, roubaram dinheiro público, mas roubaram também as esperanças de seu seguidores. Agora tudo que desejam é ser iguais a quem acusavam de ratos, para assim justificar seus atos. Se todos são roedores, pensam, ninguém corre o risco de cair na ratoeira nem esta será sequer armada, em concordância com a oposição, que muito já comeu de seu delicioso queijo suíço.

Machado de Assis no Amazon