18 de dezembro de 2011

A favor de Papai Noel





          Engana-se quem pensa que Papai Noel distribui brinquedos aleatoriamente, sem se preocupar com as consequências de seu apostolado. O bom velhinho obedece a critério claro e objetivo, bastante antigo, usado desde o início de sua autoimposta tarefa de andar pelo mundo no dia do nascimento de Jesus Cristo: a crianças ricas, presentes ricos; a pobres, pobres; a remediadas, remediados. Nada mais acertado. Com a sabedoria acumulada em séculos de trabalho, ele entendeu as dificuldades de oferecer aos miúdos brinquedos iguais com respeito ao preço e resolveu dar a desiguais tratamentos desiguais. 

          Oferecer só os mais caros às crianças exigiria recursos não disponíveis em seu orçamento, limitado como todos os orçamentos. A saída, dados seus parcos recursos, desfalcados por altos impostos do governo da Lapônia, local onde ele mora, poderia ser a doação somente daqueles brinquedos de preço médio, situado entre o mais alto e o mais baixo. Contudo, como fino conhecedor da natureza humana, ele deve ter visto logo as dificuldades de adoção de tal critério.
          Os ricos reclamariam imediatamente porque esperariam mimos compatíveis com sua autoproclamada importância social. Quem sabe exigiriam para seus filhos um desses brinquedos recheados com as mais modernas tecnologias; ou um smartphone da Apple, não um simples e comum celular. Todavia, os garotos receberiam coisas muito mais modestas, já banalizadas pelo consumo de massa. A insatisfação desse pessoal seria fonte certa de agitação e revolta, nem sei se das crianças, mas de seus pais, preocupados com o frágil bem-estar espiritual de seus herdeiros. Ninguém poderia garantir, nessas circunstâncias, a estabilidade política da nação e a felicidade do povo.
          Os pobres, pobres coitados, ficariam inicialmente satisfeitos. Quantos deles teria sequer sonhado em ganhar aquilo que os abastados rejeitariam? Um super-herói de plástico já seria suficiente. Consoles de jogos eletrônicos, dos modelos mais simples, seriam razão de festejos. Até um caminhãozinho de madeira cairia bem. Mas, eles talvez fossem mais perigosos ainda do que os ricos com respeito à tranquilidade dos cidadãos. Depois de experimentarem o gostinho do bem-bom, presenteados com coisas acima de seu desejo, não deixariam de querer mais e mais. Eternos insatisfeitos, sempre com exigências descabidas! Daí a uma revolução “socialista e popular” seria um curtíssimo passo. O melhor, mesmo, seria não agitar as massas. Tudo poderia desandar e os comunistas poderiam ser tentados a novamente comer criancinhas.
          Os remediados, aqueles do meio, imprensados entre os de cima e os de baixo, aparentemente indiferentes a tudo, ficariam muito ressentidos. Eternas incógnitas, quietos pelos cantos, eles não sabem se são ricos ou pobres. Pela manhã ficariam sempre agitados e revoltados, como os ricos e, à tarde, insaciáveis, como os pobres. Dupla fonte de problemas.
          Está aí, portanto, a explicação desse esse antigo procedimento de Papai Noel, de dar presentes caros aos ricos e baratos aos pobres, neste último caso, quando traz algum. Bem avaliada, é uma atitude bastante prudente.
           Não há sentido, portanto, nos comentários que por vezes tenho ouvido de amigos supostamente esquerdistas, de ele não contribuir em nada na luta pela diminuição das desigualdades e promoção da paz social em nosso país e em outros, de desviar a atenção das crianças e seus pais dos verdadeiros problemas da humanidade, de impedir a criação do Paraíso na Terra, etc.. Em exame mais ponderado, no entanto, acabamos por concluir que Papai Noel está certo. Seu critério milenar de distribuição serve para evitar a desordem, a intranquilidade, a instabilidade política, em suma, o caos na sociedade.
          Seja como for, aquela figura simpática ainda estará muito tempo por aí enchendo de boas lembranças a imaginação das crianças, como as lembranças de minha infância, quando, fingindo estar dormindo a fim de flagrar Papai Noel no desempenho de sua missão, eu, despertado por meus pais, acordava feliz com os brinquedos debaixo de minha cama.

4 de dezembro de 2011

Um século de um homem bondoso: a meu pai

Jornal O Estado do Maranhão

Mario Vargas Llhosa disse, a respeito de seu pai, na semana passada no debate de abertura da 25ª edição da Feira Internacional de Livro de Guadalajara, no México: “Tinha medo muito medo dele, e a literatura virou uma possibilidade para que eu mantivesse a dignidade.”
Menciono a declaração do escritor peruano não com a intenção de fazer um julgamento acerca de seu liame – ou sua ausência –, com o pai, mas de referir-me às infinitas formas de que pais e filhos se utilizam em seus relacionamentos, cada uma produto de uma história pessoal e por isso mesmo única. A minha com o meu pai era de outra natureza.
A quarta feira passada marcou os 100 anos de nascimento dele, Carlos Saturnino Moreira, falecido em 1986, filho do comerciante Lino Antônio Moreira. Quando este morreu em 1928 do século passado, vítima de complicações de diabetes, até hoje uma ameaça a seus descendentes, o filho Carlos, da prole o mais velho do sexo masculino, tornou-se o chefe da família com apenas 17 anos. Havia a necessidade de orientar os irmãos e irmãs daí por diante e, sobretudo, de assegurar a sobrevivência material deles, até que pudessem andar pelas próprias pernas: Aldenora, a mais velha de todos, Lino Antônio Moreira Filho, Pérola, Cecília, João e Dayse, mais a viúva Josefina, minha avó.
Entre as virtudes de Carlos, essa, da coragem de colocar sobre os próprios ombros tanta responsabilidade tão cedo na vida, sem mãos de fora do círculo familiar que pudessem ajudá-lo, numa cidade acanhada e escassa em oportunidades, contando apenas com sua determinação de trabalhar e o sentimento de sua obrigação com os seus, é uma das que mais me comovem.
No mundo dos negócios, nunca agiu com a dureza quase sempre associada às atividades econômicas, para ter o sucesso que garantiu a seus filhos a melhor educação da época em São Luís. Temperamento afável e conciliador, dificilmente dizia não, em especial aos filhos e à esposa Maria, que cuidava da disciplina dos filhos nos estudos e em tudo mais. Nada conseguia estressá-lo ou colocá-lo em pânico. Nem a notícia, na madrugada indelevelmente gravada na minha memória, do incêndio do escritório da sua firma de representações na Praia Grande, em sociedade com o português seu Azevedo, como o chamávamos. “O seguro cobre os prejuízos”, ele disse sem se alterar.
É na imagem deixada nas mentes e corações dos filhos, como um homem bondoso, que mais vejo aquela ausência do medo que assombrava Vargas Llhosa. Isso me leva, ao recordar algumas passagens de minha infância e a colocá-lo entre os meus heróis arquetípicos e eternos. Imaginem por um momento um homem e seu filho pequeno, meio calado e muito tímido, num ônibus a caminho da escola. Na confusão da hora de sair do veículo ele se coloca à frente do menino e vai abrindo passagem heroicamente até descer à rua. Quanta coragem, ninguém me faria mal algum, disso eu podia ter certeza.
Agora me vejo de novo, em tempo mais recuado, ao saltar do ônibus na rua do Sol, quase na esquina da rua de São João, caminhando, seguro pelas mãos de meu pai, até a residência de minha avó Marcelina na rua Cândido Ribeiro entre a Rua Grande e a de Santana, para aulas na escola das irmãs Varelas. O esforço que eu fazia na tentativa de acompanhá-lo, com meus passos curtos em comparação com os deles, larguíssimos, não me incomodava. Antes, aumentavam minha admiração pelos passos do gigante. Poxa, quando eu crescer vou andar assim também, eu vinha repetindo comigo mesmo.
Um hábito, já antigo quando eu tive consciência de estar no mundo, bem revelador do relacionamento dele com os filhos, que não era feita, no entanto, de muitas conversas, era o de, perto da hora de sua chegada para o almoço por volta das 11 horas (almoçava-se então mais cedo) tomarmos banho a fim de aguardá-lo. Então, quando ele entrava em casa, aquela fieira de meninos corria até ele ainda no terraço da casa do Monte Castelo e, em completo alvoroço, começava a gritar, todos ao mesmo tempo: quero beijar, quero beijar. Então, um a um, o beijávamos no rosto e ele a nós e à sua mulher, minha mãe.

22 de novembro de 2011

Ilusão Populista




Jornal O Estado do Maranhão

          O IBGE acaba de publicar os resultados do Censo Geral de 2010. Os mais importantes indicadores socioeconômicos do país continuam inalterados nos aspectos negativos que tinham no Censo anterior – e ainda têm –, com todas as inevitáveis consequências também negativas sobre a qualidade de vida dos brasileiros. Vejamos alguns números que, é imperativo dizer, são preliminares, embora sujeitos a poucas alterações em sua versão final. Valho-me principalmente dos sítios Veja Online e Folha.com, pois não tive ainda tempo para análise detalhada dos dados originais do IBGE.
          Vamos começar com a desigualdade de rendimentos entre mulheres e homens. Estes ganhavam, em média, 53 % mais do que aquelas, de acordo com o Censo de 2000. Neste de agora ganham apenas 42 % mais. Digo apenas porque houve uma queda de 11 pontos percentuais na diferença. Mas, convenhamos, ela ainda é enorme e difícil de aceitar porquanto as mulheres têm mais anos de escolaridade quando comparadas com os homens. Se considerarmos somente o Nordeste, a situação chega a ser de calamidade pública. Em todas as outras regiões a diferença diminuiu, menos entre os nordestinos.
          Ainda no campo da desigualdade, vamos examinar as taxas de analfabetismo, que no Brasil foram de 13,6% a 9,6% entre 2000 e 2010, diminuição de 4 pontos percentuais. Nas cidades pequenas (até 50.000 habitantes) do Nordeste a taxa é de 28%. Entre as crianças de 10 anos de idade, ela caiu de 11,4% para 6,5% na média do Brasil, mas chega a 16,4% no Maranhão e 13,7% no Piauí. Se associarmos a taxa de analfabetismo à cor, o retrato fica mais feio. A população branca brasileira tem 5,9% de analfabetos com 15 anos ou mais; na negra a proporção é de 14,4% e na parda, de 13%. Nas cidades pequenas, o analfabetismo dos negros chega a 27,1%. Todos esses dados não consideram o imenso analfabetismo funcional.
          Todas essas desigualdades parciais são expressas sinteticamente pelo rendimento. Os dados do Censo são estes: o grupo de 1% das pessoas mais ricas ganha por mês, em média, R$ 16.651 e o 1% das mais pobres, R$ 393. Ou seja, é necessário somar os rendimentos de 42 destes a fim de igualar o rendimento de apenas um daqueles. Se, em vez de 1%, tomarmos os 10% das duas extremidades da distribuição de renda, a relação não muda muito, pois iria tão só a 39, não distante dos 42 mencionados acima.
          Outros indicadores mostram igualmente grandes desigualdades, pouco diferentes das da década 2001-2010. O leitor já terá percebido minha intenção de não falar de mudanças absolutas, mas de movimentos relativos. Assim, ao mencionar a quase ausência de mudança na desigualdade, quero dizer que os indicadores das regiões ou Estados mudaram ao longo desses dez anos a taxas próximas, a distância entre eles permanecendo aproximadamente a mesma. Certamente, a maioria deles melhorou no Nordeste, mas não o suficiente à melhora da posição relativa da região. É como correr a alta velocidade numa competição ciclística. Não basta ir depressa. É necessário ir mais rápido do que os outros.
          Após 9 anos de governo de um partido, o PT, acostumado a colocar ênfase retórica na justiça social e em programas destinados à diminuição de desigualdades socioeconômicas, é de lamentar o pouco alcançado até agora. Tal fato não é de surpreender. Ouvem-se com frequência afirmações atribuindo ao Bolsa Família papel preponderante numa hipotética melhoria na distribuição da renda no Brasil. No entanto, estamos cansados de saber que programas de transferências de renda, por definição temporários, não devem ter tal objetivo porque não são capazes de provocar alteração tão profunda. Mudanças de tal natureza somente podem ser alcançadas de forma permanente e consistente com o acesso pelas pessoas à propriedade, inclusive de fatores de produção (tarefa nada fácil), aí incluído o capital humano, a ser acumulado com o suporte de um bom sistema de educação e tecnologia, fatores ausentes no Brasil de hoje. A ilusão populista de que dar dinheiro aos pobres transformará o país não nos levará a lugar nenhum.

6 de novembro de 2011

Anafabetismo de (maus) resultados

Jornal O Estado do Maranhão

A Universidade Estadual de São Paulo – USP é a melhor e mais importante do Brasil. Poucas, ou mesmo nenhuma, de nossas instituições de ensino superior gozam, fora de nosso país, de seu prestígio. Sei disso por experiência própria, pois quando estudava nos Estados Unidos eu via na minha própria Universidade, Notre Dame, em Indiana, que era apenas dela que os americanos aceitavam créditos obtidos no Brasil. Pois tal conceito está ameaçado por um ajuntamento de bandidos dispostos a subjugar por métodos violentos e antidemocráticos a maioria dos verdadeiros estudantes.
Um destes, Felipe Paiva, levou de assaltantes um tiro na cabeça em maio, dentro do estacionamento da faculdade de economia e morreu. O conselho da Universidade decidiu então pela assinatura de um convênio de patrulhamento ostensivo com a Polícia Militar de São Paulo. Iniciado o trabalho, os índices de criminalidade diminuíram vigorosamente: roubos de veículos, queda de 92,3%; furtos a veículos, de 90%; sequestro-relâmpago, de 87,5%; lesão corporal, de 77,8%; roubos em geral, de 66,7%. A conclusão é óbvia: faltava policiamento. Os membros da comunidade universitária recebiam enfim respostas adequadas às ameaças a suas vidas e patrimônios.
O aumento da segurança incomodou dois grupos. Um, formado por trotskistas profissionais que ali vão tão só fumar baseado, se entupir de outras drogas e, ainda, posar de líderes. No empreendimento, contam com os serviços do segundo grupo, o dos traficantes. Sem a polícia, a situação era perfeita. Os agentes do tráfico forneciam as drogas ao público interno do campus e, de quebra, ainda utilizavam a área como base de distribuição para os também lucrativos mercados, vamos dizer assim, externos. Daí a gritaria contra o policiamento de parte dos revolucionários de fancaria (desculpem o termo antigo, mas fazer a revolução com o dinheiro de pais de classe média alta é coisa bem antiga e fracassada) e a favor de um suposto território livre, como se autonomia fosse sinônimo de soberania.
Espera aí, baderneiros, território livre de quê? Da Constituição do Brasil, das demais leis e de potenciais empecilhos ao livre comércio de drogas. Armou-se então um confronto: quando a PM, em cumprimento da lei brasileira, prendeu dois pseudoestudantes que fumavam baseados foi atacada pela bandidagem minoritária empenhada em impor suas ideias à maioria, com paus, pedras e barras de ferro. Um articulista de um grande jornal brasileiro disse: “Um delito menor, como a posse de um cigarro de maconha, não justifica a presença de um batalhão da PM em ambiente escolar”. Essa tipificação não existe na lei e, como se sabe, esta tem de ser cumprida. Esse é um exemplo de tentativa de distorção dos fatos, de má-fé, pois a razão da presença das forças de segurança lá foi, como dito acima, a crescente criminalidade. Em seguida, o sujeito tira uma carta de seguro: “Não de trata aqui de fazer a apologia às drogas”. Se não é apologia, é o quê? Condenação? E continua: “Estudantes saíram mais uma vez feridos”. É mesmo? E os policiais, receberam flores?
Evidência do analfabetismo revolucionário desses trogloditas é o cartaz que colocaram na entrada do prédio da administração da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências, da Universidade, ocupado pela turma de porras-loucas, em protesto contra a PM: “Os policiais não são trabaliadores. São o braço armados dos exploradores”. Rima e português de péssima qualidade. Trabaliadores, braço armados? Devem ser discípulos de Fernando Hadad, suspeito de mandar ensinar às crianças brasileiras o errado como se o certo fosse.
Em votação entre os estudantes para decidir sobre a continuação da ocupação do prédio, perderam. Reagiram ocupando outro, da administração central da Universidade. Aí está o método: se uma votação democrática não lhes dá a vitória, dane-se o resultado. Cometem outra ilegalidade.
Acho que as autoridades deveriam descobrir a escola onde esses caras fizeram o estudo médio, a fim de mandar seus dirigentes de volta aos bancos escolares. Mas, não peçam para Haddad cumprir a missão.

23 de outubro de 2011

Palavra de honra


Jornal O Estado do Maranhão


Samuel Johnson (1709-1784), autor do famoso Dicionário da língua inglesa, de 1755; de uma edição comentada das obras de Shakespeare, de 1765; da descoberta de que as obras atribuídas pelo poeta escocês James Macpherson, contemporâneo de Johnson, a um suposto poeta irlandês do século III, chamado Ossian, não eram deste, e, sim, do próprio Macpherson; e autor, ainda, das Vidas dos mais eminentes poetas ingleses, obra escrita entre 1779 e 1783, costumava classificar o patriotismo como o último refúgio dos canalhas. O dito pode ser tomado em seu sentido original e literal para classificar os argumentos usados pelo Poder Executivo brasileiro em sua burlesca disputa com a Fifa e a CBF sobre a realização aqui em 2014 da Copa do Mundo de Futebol.
A história é esta. O Brasil teve sua candidatura única à realização da Copa aprovada a seis anos do início da competição, a ser realizada daqui a três. Hoje, depois de três anos da escolha, praticamente todas as providência de responsabilidade brasileira estão atrasadas. Pode haver alguém disposto a dizer que no fim tudo se arranjará e as coisas acontecerão como previstas. No entanto, esse é um argumento de difícil uso pelo governo. Se dele lançar mão, estará confessando sua irresponsabilidade e ouvirá a pergunta: Por quê? Seis anos não bastam? Vocês não sabiam que seis anos são seis anos?
Se não sabiam, digo eu, se pensavam que seis anos são seis anos vezes dez, comprometeram-se com o desconhecido, mais uma irresponsabilidade. Se, ao contrário, conhecem aritmética, deveriam ter levantado o traseiro da poltrona e feito seu trabalho. Falta de tempo bastante à tarefa, não foi a causa da demora.
Entre os compromissos assumidos está o de estabelecer uma lei geral da Copa. Ela deveria estar em vigência há dois anos. Não está. Nela serão inscritas diversas regras discutidas com antecedência entre aquelas entidades e autoridades brasileiras, que com elas concordaram, com vista ao bom andamento da competição e à preservação dos direitos comerciais das entidades envolvidas em sua organização – Fifa e CBF – bem como de marketing de patrocinadores, transmissão de TV, etc.
Como todo mundo sabe, a Copa é um evento esportivo e, igualmente, ou principalmente, um megaevento de negócios, como não poderia deixar de ser. Ou queremos algo do porte de um campeonato mundial de seleções sem alguém disposto a bancar seus custos e riscos a troco, é evidente, de justa remuneração acordada previamente? Na famosa lei, até o momento virtual, existente apenas como projeto no Congresso Nacional, foi incluído um dispositivo que dá a estudantes e idosos desconto de 50% nos ingressos, em prejuízo da receita dos jogos, com óbvias repercussões financeiras sobre grandes atores envolvidos na Copa. A medida, se de fato adotada, irá encarecer o preço das entradas.
 Aqui entra Samuel Johnson. Figuras governamentais e a quase totalidade da mídia recorreram ao argumento patriótico para justificar o descumprimento de acertos prévios com a Fifa e a CBF, no caso específico dos ingressos e, da mesma forma, em outros. Inicialmente, o acertado era o impedimento de qualquer desconto. Os patriotas exaltados disseram então que por motivo de soberania nacional o Brasil não deve abrir mão de dar os 50% por causa de leis existentes aqui, como se elas não vigessem na época das primeiras tratativas. Se for assim, se prevalecer essa posição, deve o governo compensar quem de direito pelo desfalque na arrecadação. Mas, não é assim. A questão não é de uma ridícula soberania de um país sem controle de suas fronteiras. É de cumprimento da palavra empenhada não por Lula ou Dilma, mas pelo Brasil. A questão, patriotas postiços, é de acabar com o nefasto jeitinho brasileiro de prometer tudo e não cumprir nada, achando que depois vai ocorrer um milagre.
Essa confusão me lembra dos tempos de criança. Quando queríamos dar garantia definitiva de cumprimento de um acordo, dizíamos de maneira solene: Palavra de honra!
Não se refugiem no patriotismo, patriotas de picadeiro. Cumpram, com ou sem honra, a palavra do país.

9 de outubro de 2011

ONGs

Jornal O Estado do Maranhão

Acertada e a bom tempo a decisão do recém-empossado ministro do Turismo, Gastão Dias Vieira, de suspender os convênios de ONGs com o Ministério atualmente sob sua direção, para exame detalhado de possíveis e prováveis irregularidades. Como a imprensa está cansada de noticiar, não são de agora as suspeitas de uso de verbas públicas por essas organizações para fins não propriamente públicos, mas privados. Tal procedimento levou em muitos casos ao sufocamento e posterior encerramentos das atividades daquelas que em número não pequeno sem dúvida prestavam e ainda prestam bons serviços de caráter social.
O curioso sobre as ONGs é serem, no Brasil pelo menos, verdadeiros oximoros ambulantes, pois, tendo em sua denominação genérica a intenção ou a decisão de não serem governamentais, com entusiasmo o são, mais do que qualquer outra organização, porque não vivem sem dinheiro governamental (são privadas, mas não o são), ou dito de outra forma, só vivem dele, farto e generoso, não sei se sob a devida fiscalização. A desenvoltura delas é tanta que criam a impressão de falarem em nome do povo. No caso das ONGs ambientais, elas se julgam a própria consciência do conservacionismo nacional. Afinal, quem as elegeu ou a seus dirigentes para falar pela sociedade? Quem lhes deu um mandato para representarem o nosso pensamento?
 Nesse aspecto, tive uma experiência valiosa com respeito ao aprendizado das manhas do setor quando fui secretário do Meio Ambiente nos dois primeiros governos Roseana Sarney. Sofri assédio de algumas, não muitas, pois aqui no nosso Estado elas são em pequeno número. Uma tentou obter da Secretaria uma boquinha argentária, recursos de cuja aplicação nunca prestaria contas ou o faria ficcionalmente. Seu chefe, ou dono, ou capo, como se queira chamar, era um sujeito autointitulado jornalista. A julgar pelas agressões sistemáticas e incansáveis ao idioma pátrio, a faculdade onde ele estudou deveria ser fechada imediatamente. Ele não conseguia juntar nada com nada ao escrever uma simples linha.
Uma vez me enviou uma correspondência que começava assim: “Senhor secretário, diante mão quero [...]. “Diante mão”, quando o sujeito queria dizer, suponho, “de antemão”. De sua vasta produção literária, não cito outros achados da mesma natureza porque não quero com eles ocupar o espaço restante desta conversa quinzenal. Com críticos assim, nenhum secretário precisa de quem o elogie.
Tendo uma coluna num jornal local, o “jornalista-ambientalista” era considerado um guia, uma referência por muita gente do setor e fora dele. Como não obteve meio grama do vil metal do governo, passou a me atacar, mas por mim foram ignorados a coluna e ele, o contumaz agressor do português. Pela falta de uma delegacia especializada em crimes contra a língua nacional, não o levei à polícia onde ele poderia ser obrigado a escrever duzentas vezes num caderno pautado: “Não devo maltratar o idioma de minha pátria”. Ou levar meia dúzia de bolos, à moda antiga, além de chibatadas, de forma semelhante à proposta do senador Reditario Cassol para condenados que se recusarem a trabalhar na prisão.
Em seu início, essas organizações guardavam a imagem de serem feitas por pessoas dispostas a dedicar parte do tempo de seu próprio lazer a atividades de interesse público. Ainda hoje é o que a maioria faz, notadamente as pequenas. Elas representam quase 80% do total, segundo o IBGE. As grandes, no entanto, tornaram-se verdadeiras empresas, meio de seus dirigentes ganharem a vida – e que vida – honesta ou desonestamente, e de mal aplicar dinheiros do governo. Elas pretendem influir na vida política do país sem mandato de ninguém para isso, a não ser delas mesmas e da própria certeza de que sabem o que é bom para o Brasil.
Não duvido da perseverança do ministro em sua determinação de pôr fim à situação pelo menos em sua área de atuação. Ele saberá separar as ONGs interessadas em prestar bons serviços à sociedade daquelas preocupados apenas no próprio bem-estar de seus dirigentes.

25 de setembro de 2011

Eu voto distrital

Jornal O Estado do Maranhão

          Eu Voto Distrital é um movimento que prega a adoção do voto distrital nas eleições brasileiras. No saite http://www.euvotodistrital.org.br um manifesto on line pode ser encontrado e assinado, de apoio à adoção desse tipo de escolha de representantes no Brasil. Para a formalização da passagem do atual formato eleitoral, proporcional, ao distrital existe um projeto de lei em tramitação na Câmara. Quanto mais pessoas assinarem o manifesto, maiores serão as chances de sua aprovação.
          Ninguém envolvido no movimento acredita nesse tipo de votação como a solução de todos os problemas de nossas instituições político-eleitorais. Temos certeza, entretanto, de ser esse um sistema superior ao atual. Neste, encontramos uma pegadinha capaz de fazer o eleitor votar num candidato e eleger outro, permitindo aos chamados puxadores de votos, de que é bom exemplo o comediante Tiririca, de apelo popular por motivos alheios à vida política, mas sem capacidade de representação e, até mesmo, sem legitimidade, elegerem candidatos sem-voto. Uma espécie de pague 2 e leve 10 com o sinal negativo.
          Quebra-se, assim, um princípio das democracias representativas: o vínculo sem intermediários entre o representante e o representado. Sem essa ligação as instituições democráticas se enfraquecem. Atualmente, um mês depois de qualquer eleição proporcional, 30% dos votantes não lembram em quem votaram. Resultado, o eleito também não se importa com o eleitor e age sem lhe dar satisfação. No atual Congresso nacional, apenas 36 dos 513 deputados federais se elegeram com voto próprio. O restante, pela mágica do sistema proporcional.
          Mas, o PT pretende piorar a coisa bizarra, pois é a favor da implantação de um mecanismo pelo qual o eleitor votaria duas vezes: numa lista pré-ordenada pelos partidos e, inacreditável, novamente em um candidato de sua escolha, seguindo as atuais normas proporcionais, complicando ainda mais algo já complicado. Se qualquer um do povo quisesse votar num candidato, mas de forma alguma em outro da lista, estaria impedido de fazê-lo. Ou nela vota integralmente, não, porém, nos candidatos que a compõem (vamos supor que a lista contenha mensaleiros do PT, um deles Zé Dirceu), todos escolhidos pela direção partidária, ou vota em branco; ou vota na lista de outro partido; ou amaldiçoa o autor da ideia; ou diz como Roberto Carlos na canção: e que tudo mais vá pro inferno.
         Quanto ao financiamento público de campanha, também defendido pelo PT, pode-se classificá-lo como a via mais rápida de tirar dinheiro do bolso do contribuinte e doá-lo aos políticos, porque se, com a legislação atual, parte dos recursos de doações privadas, dos quais os candidatos têm de prestar contas, vão parar no caixa dois, se forem proibidas, então 100% – uma vez que continuarão a existir –, irão entupir os bolsos de muitos candidatos e partidos.
          Voltemos ao distrital. Na eleição de deputados federais e estaduais, os Estados são divididos em distritos em número igual ao de deputados hoje existentes, de tal forma a atribuir a cada distrito um número aproximadamente igual de habitantes. No caso do Maranhão, haveria então 46 distritos na eleição de deputados estaduais e 18 na de federais, visto serem esses os números de deputados do Estado. A eleição é majoritária no distrito, cada partido tem só um candidato e apenas um de todos os candidatos é eleito, por maioria simples ou qualificada, a depender de definição prévia. Neste último caso, poderá haver dois turnos.
          O resultado é o barateamento da eleição porque o candidato precisa percorrer apenas parte pequena da área do Estado, reduzindo a influência do poder econômico; incentiva (não proíbe) a redução do número de partidos, facilitando a governabilidade; fortalece o Poder Legislativo; aumenta o número de representantes que convivem com a população no dia a dia de seu distrito; facilita a fiscalização, pelo representado, do desempenho de seu representante no Congresso.
          O leitor poderá avaliar por si mesmo no saite as vantagens do distrital e tomar uma decisão bem informada de assinar ou não o manifesto.

14 de setembro de 2011

12 de setembro de 2011

Cenas famosas de filmes clássicos - E o vento levou...



Para tocar novamente, clique ao final na seta para a esquerda ao lado da palavra EMBED Fonte: http://www.65anosdecinema.pro.br

11 de setembro de 2011

Um senhor e uma senhora


Jornal O Estado do Maranhão 

Algo o PT tem de sobra: persistência. Virtude ou defeito? Depende do ponto de vista. Para quem acredita nos valores da democracia sem adjetivos, a insistência do partido em tentar implantar no Brasil o “controle social da mídia” é ameaçadora ou, vamos dizer melhor, é doença da qual, dado o DNA estalinista e bolchevique do PT, não pode haver cura. A esperança de um milagre vem das novas tecnologias de manipulação genética. Mas, quem sabe quando elas poderão ser aplicadas nos companheiros?
Para os crentes no partido como o infalível guia das massas, condutor iluminado dos povos e organizador da sociedade por meio do aparelhamento de sindicatos, empresas estatais, fundos de pensão, mensalões e crimes assemelhados, censurar críticas de gente que é “contra o povo” é virtude democrática. Contudo, quem controlaria os controladores que, como é previsível, seriam escolhidos pelo PT? Quem seria premiado com o cargo de comissário ideológico com a missão de fazer cumprir a tal lei?
Quando muita gente a descartava como perniciosa  – essa ideia cuja formalização foi autorizada por Lula e realizada por Franklin Martins, este em tempos recuados presidente da UNE, entidade hoje apêndice do governo federal, de quem recebe milhões em verbas –, ela voltou ao palco com novo cenário, pretensão a realismo socialista e preocupação com o bem-estar das massas. A desculpa para voltar a um debate superado, além da antiga e surrada sobre como existe no Brasil apenas uma visão dos fatos – a da Globo, ponto de referência desses verdadeiros catões de araque, antigos pregadores da moral e bons costumes e hoje adeptos do contrário da pregação – nasceu da reportagem da revista Veja sobre as atividades clandestinas do “consultor de empresas privadas”, José Dirceu, réu confesso de furto de hóstia quando pré-adolescente. No entanto, ele e o PT classificam as informações da revista como invasão de privacidade e perseguição da imprensa.
Foi essa vocação precoce para a ilicitude, esse despertar indômito para as lutas renhidas da vida, esse exercício premonitório de atividades futuras, esse ato de ousadia iconoclasta com raiz em impulsos incontroláveis que deve ter conduzido o sujeito a ser classificado mais tarde, no caso do mensalão, pelo procurador-geral da República, como mentor intelectual do bando de assaltantes do erário  e, nessa condição, indiciado como quadrilheiro.
A Veja, ao fazer o que qualquer órgão da imprensa independente faz num país democrático, mas não nos casos da Venezuela, Equador, Bolívia e Argentina, países cujos governos estão em guerra com a imprensa, revelou a existência de esconderijo do “consultor” num hotel de Brasília, espécie de governo B da República, onde ele recebia figurões e até um senador da oposição, entre as figuras claramente identificadas em fotos do entra e sai da caverna. É muito poder para alguém sem cargo nenhum no governo. Mas, naturalmente esse pessoal ia ao cafofo do Dirceu conversar sobre os velhos tempos e a morte da bezerra: um ministro de Estado, o presidente de uma das empresas mais poderosas do mundo, a Petrobrás, e, até, o ex-líder dos caras  pintadas da época de Collor, o hoje senador Lindberg Farias, anteriormente acusado pelo Ministério Público de superfaturamento em licitações e de implantação de um mensalinho na Câmara de Nova Iguaçu.
Não há dúvida, esse é um caso especial de alguém especial, o Zé. Poderia se esperar, talvez, o contrário: o consultor à procura do ministro e do presidente da estatal às claras. Mas não foi assim. As montanhas vieram a Maomé. Maomé, no entanto, tem clientes com interesses na área de petróleo, sugerindo conflito de interesses com informações obtidas da estatal do petróleo.
A presidente Dilma deixou claro anteriormente seu desapreço pelo projeto de amordaçamento e o pôs de lado tão logo assumiu a Presidência. Agora, reafirmou sua posição e quer explicações sobre o comportamento de seus subordinados, o presidente da Petrobrás e o ministro, pretendentes a servir a dois senhores ao mesmo tempo, ou a um senhor e uma senhora, nesta ordem.

28 de agosto de 2011

Pulsos sensíveis, mãos ágeis

Jornal O Estado do Maranhão

Quando a Polícia Federal cumpre ordem judicial de prisão de suspeitos de cometerem crimes, os partidos políticos não se indignam. Ao contrário, aplaudem de pé e pedem bis, como ao fim do concerto ou do grande show de rock pauleira no Maracanã. Afinal, esse é certamente o desejo dos eleitores: ver bandidos algemados e encarcerados pelo resto da vida. A falta de indignação só ocorre quando o ladrão é um pé de chinelo qualquer, um reles do povo, um desclassificado, um menos igual sob a chibata dos mais iguais, como na Revolução dos bichos: “Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais que outros.”
Caro leitor, a indignação dos mesmos partidos é imensa com o uso recente de algemas em alguns malandros federais de muita pose e muitas posses. Seguindo antiga tradição brasileira, estes se distraíram e acabaram misturando seus recursos financeiros com os do governo, arrancados com voracidade de nossos bolsos de contribuintes indefesos por um sistema fiscal cada vez mais injusto, irracional e disfuncional.
No entanto, esse é um procedimento corriqueiro nos meios policiais de todos – repito, todos – os países democráticos. É adotado tanto para a segurança do preso quanto dos responsáveis pela sua custódia. É evidente a possibilidade de haver, em tal circunstância, caracterizada pela condução coercitiva do acusado, tentativas de fuga com o uso da violência, sob grande risco à própria vida do custodiado bem como à da autoridade policial. Não há razão nenhuma de se supor que presos “de bem”, gente de influência econômica e social, pertencente a grupos de nível de renda alto, muitas vezes ocupante de cobiçados cargos da hierarquia da administração pública, não arrisque fugir, atentando, até, contra a existência de seus condutores, dadas as circunstâncias de grande estresse por que passa naquele momento. Mas essa é suposição, nunca explicitada, – de gente rica não pensar em fugir –, que prevalece na argumentação dos adversários das algemas.
De modo nenhum estou defendendo a pirotecnia, já abandonada, vista mais de uma vez em algumas operações da Polícia Federal, atitude que de fato criou constrangimentos a várias pessoas. Devemos colocar de um lado o uso das algemas e, de outro a exposição pública degradante do preso, pois são acontecimentos de fato separados. Mas, desrespeito semelhante a esse tem sido no Brasil tão comum quanto a violência, por exemplo, contra mulheres, idosos e crianças. Alguém se lembra de ter visto algum protesto entre nós contra as conhecidas “apresentação do suspeito à imprensa” pelas polícias estaduais, forma de pré-condenar, de dizer “pegamos o culpado”, antes de qualquer julgamento formal? Essa conduta causa surpresa a estrangeiros, choque e revolta neles. Contudo, estamos tão acostumados com esse péssimo hábito que sequer notamos quanto ele é perverso além de ilegal. O. J. Simpson, o famoso Pelé do futebol americano, quando capturado, depois de tentar fugir da polícia em velocidade pelas ruas de Los Angeles, acusado de matar a mulher, inculpação de que, correta ou incorretamente, obteve absolvição, foi “apresentado” à imprensa? Lá, inconcebível seria se o fosse. Claro, nem sempre é possível evitar a divulgação de imagens do algemado pela imprensa, mas a liberdade de informação prevalece em casos como esse.
Já ouço ali protestos: o Supremo Tribunal Federal já proibiu o uso de algemas. O tribunal proibiu em verdade apenas alguns procedimentos considerados humilhantes e degradantes, não necessariamente as algemas. Proibiu também a tal “apresentação” de suspeitos? Não, mas quem se importa com pés-rapados? A coisa só tem repercussão quando pega gente como secretários-executivos de ministérios e outros desse tipo.
O certo é isto. Algumas pessoas andam com os pulsos muito sensíveis. Não deveriam se expor a situações que coloquem em risco parte tão sensível do corpo humano e tão útil em tornar ágeis as mãos, pois como iriam sobreviver sem a reconhecida eficiência deste instrumento de trabalho numa das profissões mais antigas da humanidade, mas tão de nossos dias?





14 de agosto de 2011

Cortinas do espetáculo


Jornal O Estado do Maranhão

           Eu sempre gostei do futebolês, um linguajar engraçado, imaginativo e inovador de verdade, usado pelos que trabalham com o esporte bretão: jogadores, comentaristas de rádio e televisão, treinadores, preparadores físicos, torcedores e a restante multidão das pessoas ligadas ao futebol. Muitas delas nunca deram um reles chute numa bola.
           Na televisão, após a partida, o jogador, após coçar a cabeça, ajeitar o penteado esquisito, olhar à direita e à esquerda, cumprimentando quem passa, declara muito sério que o grupo, nome antigo de time deu o máximo de si para seguir a orientação do professor (este é o técnico, chamado, em Portugal, de mister), mas que aquele não foi um dia bom. (Enquanto fala, ele pensa em obter um contrato com uma equipe da Europa, servindo também do Cazaquistão, da segunda divisão da Grécia e outros desconhecidos). O entrevistado marcou um gol na derrota de seu time e solta esta: “A bola foi cruzada do lado direito do nosso ataque na direção da meia-lua da grande área e aí eu tive a felicidade (atitude de modéstia bonita e comovente) de acertar o chute, de canela, é verdade, e coloquei a bola pra dentro”. Ele jamais diz “eu dei um bom chute” ou “eu fui certeiro no chute”. Ele sempre tem a felicidade, quer dizer a sorte, de acertar. Parece não ficar bem “confessar” talento e habilidade, humilhando os adversários e, principalmente, seus companheiros, desprovidos de igual felicidade.
           Já não falo da famosa afirmação usada na explicação de derrotas: o futebol é uma caixinha de surpresa, que bem poderia ser “um caixão de surpresa”. Já é um chavão falar desse chavão. Melhor é lembrar outra tirada de curso comum no meio: hoje em dia não tem mais ninguém bobo no futebol ou não se pode escolher adversários. De qualquer maneira, o time às vezes não alcança um resultado positivo (tradução, não ganha o jogo). Quando ganha, o jogador diz: O importante é que saímos com os três pontos, depois de buscar o resultado. Nesse momento ele sempre corre para o abraço (hoje não é mais abraço, mas dancinhas e coreografias engraçadinhas) depois de encher o pé e balançar o véu de noiva, como um bom atacante impetuoso que, junto com os companheiros, imprime velocidade ao ataque. Sem dúvida, nessa hora, nenhum jogador sente o peso da camisa e o grupo faz as pazes com a vitória.
           O pessoal dos meios de comunicação, esse não tem limites. Se o juiz deixa de marcar uma falta, o crítico de arbitragem, com um tom de autoridade infalível, não perde a oportunidade de enfiar um sua senhoria fez vista grossa. Senhoria num jogo de futebol? A tia idosa de um amigo meu perguntou qual o papel de uma senhorita num jogo tão violento. Será que o namorado da moça está jogando? – perguntou a respeitável senhora.
Sobre o desempenho dos times, isto é, dos grupos, os locutores esportivos garantem aos gritos: o jogo é lá e cá. Em português, a disputa está equilibrada, ou o volume de jogo dos contendores é o mesmo, com ambos jogando com garra e determinação, até mesmo o atacante que jogou no sacrifício. Pena ele ser marcado pela torcida. O repórter à beira do gramado afirma, porém, que o centroavante estava num grande dia (ou numa grande noite). Afinal, trata-se do futebol pentacampeão do mundo.
           O final do jogo é ocasião de correria da imprensa. Ao apagar das luzes, os repórteres já preparam a conquista do gramado. Terminado o jogo, eles invadem o campo e atacam o primeiro atleta disponível. Perguntas inteligentes e respostas mais ainda são feitas então: – Mikesuelovsky, como você avalia o jogo, houve ou não vacilo da defesa do Tabajarão, o Leão da Paraíba e Adjacências? – Foi tudo muito difícil desde o apito inicial, erramos em alguns lances, o pessoal estavam desatentos, mas vamos dar a volta por cima e trabalhar com o professor e o grupo durante a semana a fim de corrigir os erros. O mais importante é que respeitamos os adversários. Não existe jogo ganho de véspera. O Brasileirão tá só começando. Vamos ter tempo de se recuperar.
Nada mais a dizer, pois fecham-se as cortinas do espetáculo.

11 de agosto de 2011

Cenas famosas de filmes clássicos - Casablanca




Para tocar novamente, clique ao final na seta para a esquerda ao lado da palavra EMBED
Fonte: http://www.65anosdecinema.pro.br

10 de agosto de 2011

Prioridades - por Antonio Delfim Netto


Folha de S. Paulo, 10/8/2011

Quatro eventos recentes são exemplos de que a racionalidade que preside o processo civilizatório não está garantida:

1º) O cabo de guerra entre os republicanos e os democratas nos EUA aumentou a incerteza sobre a qualidade e a funcionalidade da administração da maior economia do mundo.
Uma lamentável falta de liderança mostrou maior preocupação com interesses eleitoral-paroquiais, do que com o papel moral e material que se esperava da nação que se pretende o paradigma do regime republicano;
2º) A inacreditável tragédia norueguesa produzida pelas mãos de um demente foi instrumentalizada pela regressão do espírito civilizatório revelada no avanço do extremismo racial e religioso que, um pouco mais, um pouco menos, vem atacando todos os países;
3º) A separação que se aprofunda entre os interesses materiais de longo prazo da China e dos EUA tem grandes consequências para a estabilidade do Oriente Médio e da Ásia. O exemplo é o apoio dissimulado da China (e da Índia) ao Irã com a troca física (em acordo de liquidação recíproca) de fornecimento permanente de petróleo -inclusive com a construção de um oleoduto- por bens industriais chineses, o que ilide o "embargo" da ONU (de efeito duvidoso) que tenta impedir a criação de mais uma potência atômica e
4º) O claro aprofundamento dos investimentos militares da China e da Índia. A ênfase da primeira na expansão de sua marinha para o domínio do chamado "mar da China", com vistas à busca de recursos naturais, revela que ela (como toda "potência", particularmente os EUA) está também à procura das três autonomias: a alimentar (a China já é a maior produtora de alimentos do mundo e graças à tecnologia que está gerando com rapidez pode crescer muito mais); a energética (que desenvolve a partir do carvão e agora do gás, eólica e outras tecnologias de ponta); e a militar que ela expande rapidamente.
O desenvolvimento dos países emergentes nos próximos dez anos vai se dar num ambiente de estresse crescente pela disputa de recursos naturais na terra e no mar. Países que, como o Brasil, abdicaram da autonomia "militar", mas dispõem de recursos naturais, precisam ter esse quadro em mente e insistir na construção de Forças Armadas enxutas, bem treinadas e com adequado poder "dissuasivo".
Não é exagero dizer que investimentos numa indústria bélica eficiente e competitiva externamente, inclusive a ênfase no domínio da tecnologia atômica, provavelmente mostrarão -em dez anos- uma taxa de retorno social superior à daqueles que hoje ocupam nível mais alto em nossas prioridades. Como disse o ilustre ministro Celso Amorim, "um país pacífico não pode ser confundido com um país desarmado e indefeso".

7 de agosto de 2011

Amy

Jornal O Estado do Maranhão

Há persistente mito na cultura de massas do mundo ocidental, essa que nos trucida diariamente com toneladas de breguice no rádio, na televisão, nas revistas de fofocas, nos tabloides britânicos e em outras mídias, bem como nos satura com os tristes espetáculos de pessoas desorientadas existencialmente, alimento da indústria de autoajuda, exemplarmente personificada na produção dos livros de Paulo Coelho e assemelhados, há um mito, eu dizia, de que o talento artístico é, relativamente a seu possuidor, uma inescapável maldição dos deuses, ditadores de sentenças como esta: te demos essa habilidade, mas exigimos retorno em termos infelicidade. Um falso pacto fáustico.
O alcoolismo dos ídolos e o vício em outras drogas perigosíssimas, passam, por meio de um mecanismo de racionalização, culpabilização e de ideologização, à categoria de contestação aos "valores burgueses” e de desprezo pelos valores éticos universais de respeito à vida e valorização da ética do trabalho. A culpa não é nem de Fausto nem de quem teve vendida a alma antes de nascer, mas do “sistema”. Isso é bastante evidente, por exemplo, na área musical, campo propício à veneração inconsequente de astros populares pelas massas sem rumo e em busca desordenada de princípios morais a que se agarrar. Elas se dedicam a endeusar seus ídolos, não pelos méritos estéticos da “obra” deles, mas por suas atitudes ditas rebeldes e contestatórias de “tudo isso que aí está”.
Estas considerações me ocorrem agora a respeito da morte da cantora inglesa Amy Winehouse, encontrada morta em seu apartamento em Londres, de causas não ainda não determinadas pelos legistas ingleses, mas certamente ligadas ao megaconsumo de álcool e de drogas de vários tipos. Se não foi por excesso, foi por falta delas, levando Amy, afirmam seus pais, a uma síndrome de abstinência fatal para ela, dona de um organismo dependente de produtos químicos.
Deixe-me mencionar, caro leitor, minha própria avaliação da cantora: em sua curta carreira ela foi uma artista de grande e original talento. Na primeira vez que ouvi uma de suas canções, Rehab, pensei em alguma cantora afro-americana, pelo timbre de sua voz e o modo característico de interpretação da música negra, ao estilo da feita nos Estados Unidos. Aliás, entre as muitas coisas boas produzidas por aquele país está sua música: jazz, soul, rhythm and blues, etc. Durante os poucos anos da presença de Amy na cena musical mundial, ela provocou um reviver do soul, a despeito de não ser americana nem morar nos Estados Unidos, numa área com muita gente competente, talentosa e competitiva.
Amy Winehouse tinha a respeito da vida uma atitude autodestrutiva. Ao mesmo tempo, como todos os artistas capazes de exercer influência sobre milhares de pessoas, tinha responsabilidade com o público jovem que a admirava pelas razões erradas, independentemente do próprio desejo dela ou da visão de seu papel na sociedade. Querendo ou não, ela servia de exemplo – mau exemplo – para a juventude. Esta não é uma afirmação moralista no sentido trivial. Quem, entre os relativistas culturais, disser que cada um tem sua moral, então sugiro que ele faça a experiência de se entupir de drogas e sofrer as consequências. Sem, porém, provocar danos a outras pessoas. O importante é, em verdade, saber a qual moral aderimos. Se defender a vida e rejeitar a cultura da morte e da autodestruição for moralismo pequeno-burguês, como o pensamento esquerdista empavonado proclama, viva a moral burguesa. A questão não é a do suicídio de Amy Winehouse – não se pode negá-lo –, pois não se pode impedir ninguém de cometê-lo. A questão é se ela, assim, fazendo,  não levará outros jovens à tentação de seguir seu exemplo.
Ao final, lamentável quanto possa ser ou parecer, a morte dela resultou de uma escolha particular, não da imposição de um “sistema” abstrato, misterioso e perseguidor dos bons e puros, impedindo-os de procurar a realização pessoal e a felicidade.
Como dizem os economistas com razão: não existe algo chamado almoço grátis.

22 de julho de 2011

Eleição na AML

          A Academia Maranhense de Letras elegeu ontem Agostinho Marques para ocupar a Cadeira 5, do quadro de membros efetivos, vaga com o falecimento de Clóvis Sena. O acadêmico eleito teve 23 votos, Ana Luíza Ferro, 11 e Wilson Cerveira, nenhum. Por correspondência, votaram 22 acadêmicos, 12 compareceram à sessão de eleição e 4 se abstiveram. 
          Após a proclamação do resultado do pleito na sede da Academia, o presidente Benedito Buzar, na companhia de diversos membros da AML, foi à residência de Agostinho para a comunicação oficial de sua eleição, como é costumeiro naquela instituição.
          O prazo de inscrição para a outra cadeira vaga na Academia, a de número 7, antes ocupada pelo saudoso Carlos de Lima, terminou esta semana. Nenhum candidato se inscreveu. Novo prazo de inscrição será aberto em sessão ordinária da Casa, na próxima quinta-feira.

17 de julho de 2011

Fé polonesa

Jornal O Estado do Maranhão


O sentimento religioso católico é uma segunda natureza do povo polonês. Para começar a sentir-se a verdade de tal afirmação é preciso estar na Cracóvia, no dia da Festa de Corpus Christi, instituída na Igreja Católica pelo Papa Urbano IV em 1264. Em algumas regiões do Brasil, durante a festividade, as ruas por onde passam as procissões comemorativas do Corpo de Cristo, são decoradas com enormes tapetes de serragem, borra de café, farinha ou areia, com motivos religiosos.
 A Polônia, porém, é um caso especial. Lá o catolicismo e o nacionalismo são inseparáveis, como se pode perceber das bonitas e imensas procissões que se realizam por todo o país. Todos participam. Ao lado de bandeiras com símbolos religiosos, de batalhões de freiras e padres, de centenas de membros de ordens religiosas, de belas imagens da Virgem Negra, podem-se ver participantes das procissões vestidos à maneira de soldados da Primeira Guerra Mundial, insígnias de guerra, estandartes com representações da nação polonesa. Vista isoladamente, essa mistura poderia parecer estranha mas, naquela terra e em função de fatores históricos adquire uma coerência surpreendente.
A Polônia teve em sua história diversos momentos de ameaça à sobrevivência como nação. No final do século XVIII, foi partilhada entre a Rússia, Prússia e o Império Austro-Húngaro. Até então e desde 1569 (o primeiro Estado polaco foi criado em 966), houvera a União de Lublin, com a Lituânia, que resultou na formação da República das Duas Nações por mais de dois séculos. Esta se tornou o maior país da Europa e experimentou imensa prosperidade, durando até 1795, quando da partilha. Por breve período entre 1807 e 1815, Napoleão Bonaparte recriou-a. Mas, o Congresso de Viena, realizado após a derrota do francês, voltou a retalhá-la, concedendo o lado leste à Rússia que depois anexou a outra metade, decretando sua não existência.
Ao final da Primeira Guerra Mundial, ela recuperou a independência durante, apenas, 21 anos, até a Segunda Guerra Mundial, cujo início deu-se exatamente com sua invasão pelas tropas de Hitler no dia 1º de setembro de 1939. Os mapas deixaram a partir daí de assinalar a sua existência, pois o leste foi anexado pela Rússia e o oeste, pela Alemanha. Nenhum país perdeu no conflito tão grande número de cidadãos, relativamente à população, como a Polônia. Entre os 6 milhões de pessoas assassinadas pelos nazistas, quase a metade era de judeus. O tristemente famoso conjunto de campos de concentração de Auschwitz-Birkenau, construído em seu território, quando da ocupação alemã, tornou-se um dos símbolos da barbárie nazista, mas é lugar cuja visitação é indispensável à reflexão sobre a capacidade do ser humano de infligir dor, humilhação e sofrimento a seus semelhantes. Após a guerra, em 1948, a União Soviética impôs aos polacos um regime comunista, o primeiro a cair na Europa do Leste, após o fim do comunismo na região.
Vêm dessas vicissitudes da história bem como da religiosidade, que serviu de cola à coesão social e nacional daquele povo em períodos conturbados, a explicação da rejeição pela sociedade ao regime totalitário e antinacional, de inspiração soviética e russa. A eleição do papa polonês João Paulo II, tendo um claro componente político de combate ao regime vigente na época, contou também, para esse fim, com o sentimento, fácil de perceber naquela sociedade, de apego a sua cultura cristã e, em especial, católica. As procissões na Cracóvia mostram bem a naturalidade e a autenticidade das práticas religiosas, sem afetações, parte do dia a dia da vida de homens, mulheres e crianças, da família toda, arraigadas na cultura, espontâneas, não apenas destinadas a cumprir uma obrigação. Tudo, no entanto, sem carolice ou pieguice. Isso nos faz compreender a alegria do povo quando da eleição a papa de Karol Wojtyła. Teve o sabor de justa e oportuna retribuição por sua fidelidade à Igreja Católica à qual quer permanecer fiel.
Mesmo para um não crente, emociona ver aquela fé autêntica, sólida e inabalável.

3 de julho de 2011

Sem defesa

Jornal O Estado do Maranhão

Há na peça de teatro Le Diable Rouge, de Antoine Rault, um diálogo entre Colbert e o cardeal Mazarino. O primeiro foi ministro das finanças Luís XIV e é o representante mais conhecido da variante do pensamento mercantilista conhecida por colbertismo ou Mercantilismo francês, que defendia o estabelecimento pelos países de uma balança comercial em permanente superávit, visando o acúmulo de metais preciosos.
Mazarino, italiano de nascimento, era núncio papal em Paris quando foi convocado ao serviço do rei Luís XIII pelo cardeal Richelieu, tendo obtido então a nacionalidade francesa. Tornou-se depois primeiro ministro da França, sucedendo ao próprio Richelieu, e responsável pela educação do futuro rei Luís XIV. Pouco antes de morrer recomendou Colbert, a quem havia feito administrador de sua fortuna pessoal, a Luís XIV que fez o indicado, em 1661, ministro de Estado.
Dou esses resumos biográficos a fim de mostrar que Rault, dramaturgo da nova geração francesa, nascido em 1965, colocou o diálogo (ficcional, claro) na boca de conhecedores das finanças estatais e dos mecanismos aplicados na arrecadação de impostos:
Colbert - Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar [o contribuinte] já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço... Mazarino - Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto de dívidas, vai-se parar à prisão. Mas o Estado... o Estado, esse é diferente!!! Não se pode mandá-lo para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem! Colbert - Ah sim? O Senhor acha isso mesmo? Contudo, precisamos de dinheiro. E como é que havemos de obtê-lo se já criamos todos os impostos imagináveis? Mazarino - Criam-se outros. Colbert - Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazarino - Sim, é impossível. Colbert- E então os ricos? Mazarino - Os ricos também não. Eles não gastariam mais. Um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert - Então como havemos de fazer? Mazarino - Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico de um doente! Há uma quantidade enorme de gente situada entre os ricos e os pobres: são os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos mais eles trabalharão para compensarem o que lhes tiramos. É um reservatório inesgotável.
A inspiração do dramaturgo vem da economia francesa. Ainda assim, o diálogo mostra a situação do contribuinte fiscal de classe média no Brasil. Os pobres de fato têm um poder de contribuição tributária reduzido. Mesmo na hipótese de não ser dessa forma (o conceito de pobreza tem muito de relativo), quem, em tempos do politicamente correto, ousaria sugerir o aumento da carga de impostos sobre eles?
No outro extremo da renda, a cobrança excessiva sobre os ricos poderia reduzir a taxa de poupança e investimento da economia, com reflexos negativos óbvios porque, como a teoria econômica e evidências empíricas nos dizem, níveis elevados de renda apresentam propensão marginal a poupar maior do que níveis baixos. Tirar a poupança das mãos dos ricos e colocá-la nas do governo é transformá-la em consumo improdutivo e implorar por desastre.
A classe média brasileira é massacrada de todos os lados. Ela paga o governo, sem opção de não fazê-lo, para ter assistência pública de saúde, mas não a tem; paga por planos de saúde privados e, quando mais deles precisa, fica ao desamparo; e, finalmente, é obrigado a tirar dinheiro do bolso pela terceira vez, em pagamento de elevadas quantias a médicos e hospitais particulares, se, doente, não quiser correr o risco de morrer por falta de atendimento.
Os pobres têm seus defensores, sinceros ou não; os ricos não precisam de quem os proteja; e a classe média, obrigada a entregar cerca de um terço de seus rendimentos ao governo sob a forma de imposto de renda e mais em impostos indiretos, como o ICMS, quem a defenderá?

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