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Mostrando postagens de fevereiro, 2003

Reynaldo Faray

Jornal O Estado do Maranhão Quando o grande artista maranhense Reynaldo Faray morreu inesperadamente, na semana passada, Oliveira Ramos, um dos nossos melhores cronistas, disse escrever “sobre ele sem conhecimento de causa ou com pouco conhecimento”. Eu, de minha parte, devo dizer que pretendo fazê-lo sem nenhum conhecimento pessoal, pois nunca tivemos a oportunidade de um encontro, mesmo breve. Dessa forma, duas dificuldades se me apresentam agora à tentativa de dizer aqui alguma coisa sobre o morto. A primeira é a de escrever depois daquele cronista. Sendo o excelente escritor que é, não vejo como eu poderia expressar melhor do que ele a grande admiração dos maranhenses por Reynaldo. Devo por isso resignar-me a tentar apenas, mas sem a esperança de sucesso. A segunda dificuldade está naquele fato que mencionei, de não ter sido seu amigo, próximo dele. Esta, porém, não deve impedir-me de dizer algumas coisas sobre o homem que muitos, como eu, viam diversas vezes somente de longe, pou

As palavras

Jornal O Estado do Maranhão As palavras têm história. Como todos nós, como todos os seres vivos, como o próprio idioma, como o próprio Universo, como a própria vida, como o próprio tempo. Longa história, na maioria dos casos, breve em outros, finita em todos. Mas, ao nascer, crescer e morrer, seguindo a ordem natural das coisas, elas transmitem seus genes etimológicos aos descendentes e freqüentemente nestes sobrevivem. Vamos tomar o exemplo do Latim. Quantas palavras desse idioma chamado de morto, usadas pelos antigos romanos, fazem parte do nosso cotidiano. Até os aparentes neologismos condenáveis vêm do Latim. Como o verbo deletar, incorporado ao português através da língua dos novos romanos, com o verbo to delete , que significa apagar, suprimir, remover, destruir, muito usado atualmente no jargão da informática. Sua origem está em deletus , particípio passado do verbo delere . Muito se ouve falar da sentença de Catão, o Antigo, ou o Censor, ao final de seus discursos no Senado ro

Lisboa, nova cidade

Jornal O Estado do Maranhão Chego a Lisboa. No caminho até o hotel o motorista de táxi me informa de que, havia pouco, devido ao despiste de um autocarro duas pessoas haviam se ferido. Isso, dizia ele, estava a acontecer freqüentemente nos últimos tempos. Penso na longa viagem e sinto o cansaço. Eles certamente estavam a afetar minha compreensão das coisas mais simples ditas em português, mas resolvo ficar calado a fim de não dar a impressão de não saber a língua. Antes, no aeroporto, ao entrar no elevador com a minha bagagem eu havia encarado aquele aviso: “ carregue o botão ”. Ora, como eu podia carregá-lo se ele estava firmemente fixado? Além do mais, poderia alguém fazer algo de útil com ele, se fosse possível levá-lo? Seria um brinde insólito aos recém-chegados, para ajudá-los a ter uma boa estada em solo português? Ou quem sabe tratava-se de algum tipo de espionagem eletrônica destinada ao controle dos brasileiros em Portugal? Agora me aparecia a história do despiste . Eu de

Armadilhas

Jornal O Estado do Maranhão Perguntam-me se não me falta assunto para escrever todas as semanas. Falta, claro, algumas vezes. Acontece com todo mundo que escreve. Ninguém esteve, está ou estará livre dessa pane periódica de idéias. Em algum momento ela vai atacar. É uma situação semelhante à do sujeito chamado a dizer alguma coisa, as famosas “breves palavras para não me alongar”, de duração, não raro, de no mínimo meia hora. De repente, lhe dá um branco. Como tem de dizer alguma coisa, ele diz. Tem início aí uma pequena tragédia. Ele começa a soltar as primeiras coisas que lhe vêm à cabeça, a dar voltas, a repetir-se, a dizer que vai terminar logo, mas, de verdade, não diz coisa nenhuma nem sabe como terminar. Exceto no caso de o “discurso” ser dirigido a seu chefe na festa do seu aniversário. Aí o discursador sabe direitinho os elogios a fazer. Nesta última situação, não falta matéria para ele deitar falação à vontade. Quem escreve, porém, precisa ter cuidado. O vento leva a palavra