22 de julho de 2011

Eleição na AML

          A Academia Maranhense de Letras elegeu ontem Agostinho Marques para ocupar a Cadeira 5, do quadro de membros efetivos, vaga com o falecimento de Clóvis Sena. O acadêmico eleito teve 23 votos, Ana Luíza Ferro, 11 e Wilson Cerveira, nenhum. Por correspondência, votaram 22 acadêmicos, 12 compareceram à sessão de eleição e 4 se abstiveram. 
          Após a proclamação do resultado do pleito na sede da Academia, o presidente Benedito Buzar, na companhia de diversos membros da AML, foi à residência de Agostinho para a comunicação oficial de sua eleição, como é costumeiro naquela instituição.
          O prazo de inscrição para a outra cadeira vaga na Academia, a de número 7, antes ocupada pelo saudoso Carlos de Lima, terminou esta semana. Nenhum candidato se inscreveu. Novo prazo de inscrição será aberto em sessão ordinária da Casa, na próxima quinta-feira.

17 de julho de 2011

Fé polonesa

Jornal O Estado do Maranhão


O sentimento religioso católico é uma segunda natureza do povo polonês. Para começar a sentir-se a verdade de tal afirmação é preciso estar na Cracóvia, no dia da Festa de Corpus Christi, instituída na Igreja Católica pelo Papa Urbano IV em 1264. Em algumas regiões do Brasil, durante a festividade, as ruas por onde passam as procissões comemorativas do Corpo de Cristo, são decoradas com enormes tapetes de serragem, borra de café, farinha ou areia, com motivos religiosos.
 A Polônia, porém, é um caso especial. Lá o catolicismo e o nacionalismo são inseparáveis, como se pode perceber das bonitas e imensas procissões que se realizam por todo o país. Todos participam. Ao lado de bandeiras com símbolos religiosos, de batalhões de freiras e padres, de centenas de membros de ordens religiosas, de belas imagens da Virgem Negra, podem-se ver participantes das procissões vestidos à maneira de soldados da Primeira Guerra Mundial, insígnias de guerra, estandartes com representações da nação polonesa. Vista isoladamente, essa mistura poderia parecer estranha mas, naquela terra e em função de fatores históricos adquire uma coerência surpreendente.
A Polônia teve em sua história diversos momentos de ameaça à sobrevivência como nação. No final do século XVIII, foi partilhada entre a Rússia, Prússia e o Império Austro-Húngaro. Até então e desde 1569 (o primeiro Estado polaco foi criado em 966), houvera a União de Lublin, com a Lituânia, que resultou na formação da República das Duas Nações por mais de dois séculos. Esta se tornou o maior país da Europa e experimentou imensa prosperidade, durando até 1795, quando da partilha. Por breve período entre 1807 e 1815, Napoleão Bonaparte recriou-a. Mas, o Congresso de Viena, realizado após a derrota do francês, voltou a retalhá-la, concedendo o lado leste à Rússia que depois anexou a outra metade, decretando sua não existência.
Ao final da Primeira Guerra Mundial, ela recuperou a independência durante, apenas, 21 anos, até a Segunda Guerra Mundial, cujo início deu-se exatamente com sua invasão pelas tropas de Hitler no dia 1º de setembro de 1939. Os mapas deixaram a partir daí de assinalar a sua existência, pois o leste foi anexado pela Rússia e o oeste, pela Alemanha. Nenhum país perdeu no conflito tão grande número de cidadãos, relativamente à população, como a Polônia. Entre os 6 milhões de pessoas assassinadas pelos nazistas, quase a metade era de judeus. O tristemente famoso conjunto de campos de concentração de Auschwitz-Birkenau, construído em seu território, quando da ocupação alemã, tornou-se um dos símbolos da barbárie nazista, mas é lugar cuja visitação é indispensável à reflexão sobre a capacidade do ser humano de infligir dor, humilhação e sofrimento a seus semelhantes. Após a guerra, em 1948, a União Soviética impôs aos polacos um regime comunista, o primeiro a cair na Europa do Leste, após o fim do comunismo na região.
Vêm dessas vicissitudes da história bem como da religiosidade, que serviu de cola à coesão social e nacional daquele povo em períodos conturbados, a explicação da rejeição pela sociedade ao regime totalitário e antinacional, de inspiração soviética e russa. A eleição do papa polonês João Paulo II, tendo um claro componente político de combate ao regime vigente na época, contou também, para esse fim, com o sentimento, fácil de perceber naquela sociedade, de apego a sua cultura cristã e, em especial, católica. As procissões na Cracóvia mostram bem a naturalidade e a autenticidade das práticas religiosas, sem afetações, parte do dia a dia da vida de homens, mulheres e crianças, da família toda, arraigadas na cultura, espontâneas, não apenas destinadas a cumprir uma obrigação. Tudo, no entanto, sem carolice ou pieguice. Isso nos faz compreender a alegria do povo quando da eleição a papa de Karol Wojtyła. Teve o sabor de justa e oportuna retribuição por sua fidelidade à Igreja Católica à qual quer permanecer fiel.
Mesmo para um não crente, emociona ver aquela fé autêntica, sólida e inabalável.

3 de julho de 2011

Sem defesa

Jornal O Estado do Maranhão

Há na peça de teatro Le Diable Rouge, de Antoine Rault, um diálogo entre Colbert e o cardeal Mazarino. O primeiro foi ministro das finanças Luís XIV e é o representante mais conhecido da variante do pensamento mercantilista conhecida por colbertismo ou Mercantilismo francês, que defendia o estabelecimento pelos países de uma balança comercial em permanente superávit, visando o acúmulo de metais preciosos.
Mazarino, italiano de nascimento, era núncio papal em Paris quando foi convocado ao serviço do rei Luís XIII pelo cardeal Richelieu, tendo obtido então a nacionalidade francesa. Tornou-se depois primeiro ministro da França, sucedendo ao próprio Richelieu, e responsável pela educação do futuro rei Luís XIV. Pouco antes de morrer recomendou Colbert, a quem havia feito administrador de sua fortuna pessoal, a Luís XIV que fez o indicado, em 1661, ministro de Estado.
Dou esses resumos biográficos a fim de mostrar que Rault, dramaturgo da nova geração francesa, nascido em 1965, colocou o diálogo (ficcional, claro) na boca de conhecedores das finanças estatais e dos mecanismos aplicados na arrecadação de impostos:
Colbert - Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar [o contribuinte] já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço... Mazarino - Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto de dívidas, vai-se parar à prisão. Mas o Estado... o Estado, esse é diferente!!! Não se pode mandá-lo para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem! Colbert - Ah sim? O Senhor acha isso mesmo? Contudo, precisamos de dinheiro. E como é que havemos de obtê-lo se já criamos todos os impostos imagináveis? Mazarino - Criam-se outros. Colbert - Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazarino - Sim, é impossível. Colbert- E então os ricos? Mazarino - Os ricos também não. Eles não gastariam mais. Um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert - Então como havemos de fazer? Mazarino - Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico de um doente! Há uma quantidade enorme de gente situada entre os ricos e os pobres: são os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos mais eles trabalharão para compensarem o que lhes tiramos. É um reservatório inesgotável.
A inspiração do dramaturgo vem da economia francesa. Ainda assim, o diálogo mostra a situação do contribuinte fiscal de classe média no Brasil. Os pobres de fato têm um poder de contribuição tributária reduzido. Mesmo na hipótese de não ser dessa forma (o conceito de pobreza tem muito de relativo), quem, em tempos do politicamente correto, ousaria sugerir o aumento da carga de impostos sobre eles?
No outro extremo da renda, a cobrança excessiva sobre os ricos poderia reduzir a taxa de poupança e investimento da economia, com reflexos negativos óbvios porque, como a teoria econômica e evidências empíricas nos dizem, níveis elevados de renda apresentam propensão marginal a poupar maior do que níveis baixos. Tirar a poupança das mãos dos ricos e colocá-la nas do governo é transformá-la em consumo improdutivo e implorar por desastre.
A classe média brasileira é massacrada de todos os lados. Ela paga o governo, sem opção de não fazê-lo, para ter assistência pública de saúde, mas não a tem; paga por planos de saúde privados e, quando mais deles precisa, fica ao desamparo; e, finalmente, é obrigado a tirar dinheiro do bolso pela terceira vez, em pagamento de elevadas quantias a médicos e hospitais particulares, se, doente, não quiser correr o risco de morrer por falta de atendimento.
Os pobres têm seus defensores, sinceros ou não; os ricos não precisam de quem os proteja; e a classe média, obrigada a entregar cerca de um terço de seus rendimentos ao governo sob a forma de imposto de renda e mais em impostos indiretos, como o ICMS, quem a defenderá?

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