20 de abril de 2014

Refinados

Jornal O Estado do Maranhão

           Vamos supor, apenas supor, porque sei que você, leitor, não é dono de empresas nem pessoa sedenta de lucro, insensível aos problemas sociais, adepto do capitalismo selvagem –que você possua uma refinaria. Um dia tem notícia da existência de outra colocada à venda por meros US$ 40 milhões. Seu instinto de homem de negócio (vou dizer baixinho: seu instinto de obter lucro no mercado) lhe diz: “Vai lá e compra, o preço está uma pechincha. Corre agora”. Chegando lá, o proprietário muda a conversa e lhe diz que as dificuldades têm sido imensas, devido a problemas trabalhistas e gerenciais. Encurtando a conversa: ele só vende por R$ US$ 350 milhões, pois precisa sair do buraco.
           Você é um empresário com muito dinheiro de seu próprio bolso investido em sua própria empresa, corre riscos na concorrência com outras de seu ramo, pois pode quebrar de uma hora pra outra se não administrá-la bem, mas é bom cristão, não um coração de pedra e não resiste a dramas vivido por seus semelhantes. Saca do talão de cheques (ainda se usam cheques?) e fecha a transação na hora. Depois enxuga lágrimas furtivas correndo pelo canto dos olhos. Trata-se mesmo de homem de boa índole.
          Daí a poucos meses vem pela calçada pensando na morte da bezerra. De repente para um Mercedez Benz e alguém lhe acena sorridente. É o ex-dono da refinaria. Automóvel bacana e caro, motorista fardado, ares de prosperidade, feliz da vida, vida de magnata. Ele pergunta como vão as coisas. Está tudo bem? Bem?! Você está ali na calçada porque não tem mais nem automóvel, mesmo barato, mora de aluguel, seus filhos tiveram de frequentar depredadas escolas públicas, seu patrimônio se evaporou, a mulher lhe abandonou, os outrora bons amigos agora viram a cara quando o veem. Coitado! Sente-se um trapo, um fracassado.
          É, meu amigo, o mercado pune os vacilões. Vacilou, dançou. Uma decisão idiota levou de você toda a riqueza, a família, esperanças, projetos, tudo. Quem mandou adquirir um estabelecimento por várias vezes o preço certo? Por falar em erros, quem não se lembra do exemplo recente de Eike Batista. Seus empreendimentos subiram e desceram rapidinho, como resultado de decisões desastradas dele. Quem foi punido? O próprio Eike, o mercado cobrou. 
          Mas, vamos, fazer suposição alternativa. Você não era dono do negócio quando tomou a decisão errada de comprar por valor muito elevado a refinaria. Era apenas seu dirigente no mais alto nível e ela era estatal. Ao fazer a mesma idiotice que o hipotético empresário privado fez, de onde viria sua punição? Do mercado, não diretamente. Pequeno corretivo talvez fosse aplicado à empresa. O dono desta, ou seja, o governo, o demitiria de seu posto? Pelo visto atualmente, não. Pode ser até que lhe desse um prêmio, mandando-o dirigir a área financeira de uma filial no exterior. Os eventuais prejuízos seriam pagos por nós, contribuintes, por meio de mais impostos com o fim de cobrir o rombo nas contas públicas.
          Aí está exatamente o que aconteceu com a Petrobrás com a famosa compra em Pasadena. Alguns me acusarão de exagerar, fazer caricatura injusta da situação. Não é verdade. Na essência, as coisas se passaram dessa forma, com o envolvimento não apenas da diretoria, mas também do conselho de administração, do qual faz parte a presidente da República. Apenas esse episódio justifica sua privatização, mas não há perspectiva disso acontecer, quando até a oposição tem medo até de propor essa solução. Portanto, nada de nervosismo, defensores da estatização da economia. O “patrimônio do povo” continuará sendo usado em benefício de meia dúzia de burocratas. Sabem os brasileiros quanto ganhou em média um membro da diretoria da Petrobrás no ano passado? Eu digo: R$ 150 mil por mês ou (dou por extenso) um milhão e oitocentos mil reais por ano. Sabem com o fim de quê? Realizar negócios suspeitos assim, capazes de fazer este último valor parecer uma merrequinha.
          Eis a verdade: a unidade de Pasadena refinou até agora só óleo de peroba para esfregar na cara de pau desses verdadeiros dono da Petrobrás, ladrões refinados.

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