22 de maio de 2014

José Chagas



Jornal O Estado do Maranhão

          A morte de José Chagas me leva a pensar sobre o destino da obra dos grandes homens como ele. Olhemos sua literatura. São unânimes as opiniões dos mais influentes analistas literários de nossa terra como também do restante do Brasil e até do exterior: a importância de seu trabalho é enorme. Não quero, assim, chover no molhado louvando suas qualidades indiscutíveis. Estas têm sido apontadas por gente qualificada a fazê-lo, tanto agora, quando de seu falecimento, quanto ao longo desses anos todos de farta e bela produção artística.
          Vindo da Paraíba para o Maranhão em 1948, exatamente no ano em que nasci, aqui deu nesses 66 anos contribuição inestimável a nossa cultura. No entanto, o homem do campo paraibano que o habitava, ou, dizendo com mais propriedade, o homem nordestino, no que este tem de único e não maranhense – na maior parte história o Maranhão esteve mais voltado, cultural e economicamente na direção do Norte e não do Nordeste –, jamais o abandonou, pois representava experiência da época da vida de todos nós em que nada falha em deixar marcas inapagáveis em nossa mente e visão do mundo. Não era ele quem dizia não saber direito se era maranhense-paraibano ou paraibano maranhense?
          Essa obra, cumprindo seu destino, daqui por diante viverá ou não, apartada de seu criador, na dependência de como for manuseada, se assim posso dizer, por nós, que temporariamente sobrevivemos fisicamente a ele. O alto valor literário de seus escritos nos tornará prazerosa a tarefa de passá-la adiante aos que nos sucederem. Mas vejam, amigos, esse não é missão simples a ser delegada às instâncias burocráticas do sistema cultural. Ele exige não somente a consciência do valor de José Chagas, mas, igualmente, o saber apresenta-lo às novas gerações.
          Afinal, qual a razão de eu fazer afirmação como essa? Lembram-se os leitores de José Tribuzi Pinheiro Gomes, conhecido como Bandeira Tribuzi? Quando ele completou 50 anos de idade, em 1977, foi aclamado pela intelectualidade da terra e de fora como um dos maiores entre os nossos maiores. Ele foi então justificadamente homenageado. Participaram dos festejos grandes nomes da literatura nacional, a exemplo de Jorge Amado e Ferreira Gular. Poucas vezes houve aqui tamanha unanimidade em torno de um homem de letras ainda em atividade. Depois de quase 37 anos de sua inesperada morte naquele mesmo ano, o que é feito de seu trabalho? Quantas edições por ensaístas de reconhecida competência daqui e de outros estados foram feitas, de tal forma a ser possível distribui-la por todo o Brasil com bom aparato crítico? Quantas traduções para idiomas como o inglês, espanhol, alemão, francês e italiano foram publicadas? Quantos seminários se realizaram sobre sua poesia? Quantas monografias foram elaboradas? Tribuzi vai aos poucos sofrendo uma segunda morte, da pior maneira: pelo esquecimento e indiferença, pois nenhum autor pode resistir à falta de publicação bem cuidada de seus escritos. Quem lê Tribuzi hoje? Bem poucos. Esse destino triste não pode se repetir com Chagas.
          Falta-nos pessoas com conhecimento aprofundado de sua produção assim como da história da poesia e prosa maranhenses, que possam fazer um estudo crítico de sua poesia e de sua prosa? Não me parece ser esse o caso. Aí está Nauro Machado, capacitado a dar-nos essa apreciação destinada a acompanhar as obras completas do poeta recém-falecido, com edição e distribuição por editora com atuação por todo o país. Além de ser poeta de reconhecimento nacional e internacional, Nauro é excelente ensaísta. Concluída essa primeira etapa, se seguiriam edições de outros autores maranhenses importantes do século XX.
          Essa, penso eu, a melhor maneira de homenagear José Chagas: evitar-lhe a segunda morte, fazê-lo viver. Os dirigentes do setor público em todos os níveis de governo, as instituições culturais, as universidades, os estudiosos de sua obra têm no que expus acima a sugestão de um programa de trabalho. Feito em indispensável parceria trará bons resultado à alta cultura do Maranhão.

4 de maio de 2014

Bola e Política



Jornal O Estado do Maranhão

          A primeira Copa do Mundo realizada no Brasil, em 1950, permanece até hoje, passados sessenta e quatro anos, como lembrança dolorosa pela inesperada derrota da Seleção para o Uruguai. Necessitávamos tão só de empatar, mas perdemos por 2 a 1, apesar de termos feito 1 a 0 na partida do quadrangular final que proporcionou a obtenção pelos simpáticos uruguaios do segundo título mundial no torneio (o primeiro foi em 1930, quando o futebol era quase outro esporte em comparação com o de hoje).
          Tenho escutado de pessoas sensatas, em outras circunstâncias incapazes de se deixarem levar pelas emoções do momento, o desejo de novo fracasso em casa, neste ano de 2014. Elas desejam justificadamente tirar o PT do poder, como também desejamos, eles e eu, dentro da legalidade, sem mensalão nenhum e sem tentativas de desmoralização do Supremo Tribunal Federal e, portanto, da justiça. Pensam essas pessoas que nossa vitória diminuiria a rejeição de Dilma, facilitando sua reeleição em outubro. Preferem, assim, perder. É falacioso o raciocínio visto não haver evidência de que vitória na competição aumenta a popularidade do presidente da República da hora.
          Sou de uma geração que viu o Brasil conquistar os cinco títulos mundiais de futebol de sua coleção até o momento inigualável. Não me lembro de ter visto nesse tempo todo de nossa hegemonia futebolística – de 1958 a 2002 –, demonstração irrefutável de que a avaliação de um único chefe do Executivo tivesse melhorado como decorrência de alguma dessas conquistas nem que candidatos ao cargo no período após a implantação da reeleição presidencial tenham capitalizado tal melhoria na renovação do mandato. Frequentemente, 1970 é citado como prova não provada da existência de relação de causa e efeito entre sucesso esportivo e sucesso político.
          Encaremos os fatos. O regime militar era naquele ano bem aceito pela população, em prejuízo da democracia. O presidente de então, general Emílio Médici, ia aos estádios com radinho de pilha ao ouvido e era aplaudido, não vaiado, pois o país estava crescendo a taxas altíssimas. Não importa que a conjuntura externa fosse favorável à nossa economia até 1974. Importam os resultados no bolso do cidadão. Ainda que a distribuição de renda não tenha melhorado, a condição econômica de todos melhorou. A desqualificar a administração da época por ter aproveitado o bônus internacional, seríamos obrigados a fazer o mesmo com a de Lula, navegante de bons ventos de fora também. É aquele fator, a economia, principalmente, que decide eleições em qualquer democracia do mundo. O mais famoso mote oficial de então, “Brasil, ame-o ou deixe-o”, nada tinha a ver com o futebol. Em verdade, o ter caído no gosto do povo veio da boa avaliação do governo.
          Quando ganhamos em 1970, a ditadura já era popular. A lenda de sua aceitação por causa exclusivamente da Copa foi invenção do discurso esquerdista com pretensão à correção política. Hoje, acredito, uma vitória da Seleção não irá melhorar a imagem de incompetência, ineficiência, corrupção e sobretudo de pobríssimos resultados econômicos ao longo de quase quatro anos do atual governo, que prometeu reduzir os juros, mas, depois de curto período de baixa, foi obrigado a trazê-lo de volta a nível superior ao do início do mandato de Dilma. Tais juros foram herdados da era Lula, em que os banqueiros, tão atacados retoricamente pelo PT, nunca antes na história deste país tiveram lucros tão altos.
          Temos uma excelente equipe e um técnico com talento especial para motivar os jogadores. Jogar em casa não deve ser motivo de preocupação com a natural pressão exacerbada da torcida. É razão de otimismo realista, sem exageros, pelo aumento da vontade de vencer dos atletas e do ambiente favorável a quem joga em casa. Veja-se a humilhação a que o Brasil submeteu a Espanha na Copa das Confederações. A derrota não virá de dentro dos gramados, mas da desorganização fora, com estádios, aeroportos e obras de mobilidade urbana incompletos, com gambiarras por todos os lados.

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