17 de abril de 2005

Nepotismo

Jornal O Estado do Maranhão 
Os cientistas sociais, ao estudar o nepotismo, não indicam sua origem, limitando-se a descrevê-lo. Veja-se, por exemplo, o que diz o Dicionário de Ciências Sociais, da Fundação Getúlio Vargas, editado sob a coordenação geral de Benedicto Silva, no verbete de Charles Aiken: “Nepotismo é a prática pela qual uma autoridade pública nomeia um ou mais parentes próximos para o serviço público ou lhes confere outros favores, a fim de promover o prestígio da família, aumentar a renda da família ou ajudar a montar uma máquina política, em lugar de cuidar da promoção do bem-estar público”. Ora, como esse comportamento não é exclusividade brasileira, ocorrendo em todas as sociedades, falta a explicação, que necessariamente deve ter caráter de universalidade, de sua origem.
Os especialistas em sociobiologia, no entanto, ciência nova, dedicada a estudar as bases biológicas de todo o comportamento social, inclusive dos chamados insetos sociais, como as abelhas e as formigas, e dos seres humanos, dizem ser a tendência ao nepotismo inata a todas as espécies animais, que nisso muito se assemelham, pois representa uma estratégia de garantir a transmissão, da maneira mais segura possível, dos próprios genes, presentes em parentes próximos, às gerações futuras, objetivo, segundo eles, de todo ser vivo e garantia de sobrevivência da espécie.
Edmundo O. Wilson, proeminente sociobiologista americano, diz no seu Sociobiology que “o principal objetivo de uma teoria geral da sociobiologia deve ser a habilidade em predizer características das organizações sociais a partir do conhecimento dos parâmetros da população sob exame, combinada com informação sobre as restrições de comportamento impostas pela constituição genética da espécie”. Dessa perspectiva, combater o nepotismo, é como combater a tendência aquisitiva de parte do ser humano, muitas vezes expressa no puro e simples roubo dos bens do fraco pelo forte. Combate-se o mal sabendo-se que ele não desaparecerá e estará pronto para se impor a qualquer hora.
Essas razões me levam a duvidar da futura eficiência da legislação em tramitação no Congresso Nacional, visando eliminar o nepotismo. Atualmente, a fim de não chamar a atenção dos eleitores e leitores do Diário Oficial, os dirigentes, nos três Poderes, autorizados por lei a nomear pessoas para os chamados cargos de confiança, fazem acordos, aos pares, com os colegas, pelos quais cada um nomeia os parentes do outro.
Um das idéias a serem incluídas na lei ainda em debate seria a de proibir essas chamadas nomeações cruzadas. Mas, quem garante que elas não serão ressuscitadas por acordos entre três, quatro ou mais administradores, cada um nomeando sucessivamente os parentes dos outros, até a corrente da felicidade se fechar, tornando mais difícil ainda a identificação pública do nepotismo? Haverá sempre mil maneiras de burlar as novas exigências legais, através de manobras conhecidas e arquitetadas por muitos dos próprios legisladores, adeptos da “doutrina” de São Mateus, aquela do “primeiro os meus”.
Contudo, há uma medida tão óbvia, adequada, não à eliminação, mas, à minimização do problema, que se pode perguntar pela razão de ninguém, até agora, ter proposto a adoção imediata dela: a pura e simples eliminação dos milhares de cargos de confiança. No caso, todavia, de se provar que os postos eliminados eram necessários à boa administração, seria realizado concurso público para seu preenchimento. Finalmente, se preservariam um ou dois cargos de livre nomeação pelos dirigentes porque, de fato, eles necessitam do auxílio de pessoas de sua estrita confiança no exercício de suas funções.
Adotada essa sugestão, a luta, acredito, seria mais simples e eficiente, com resultados positivos para o erário e a sociedade.

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