29 de fevereiro de 2004

Durma-se com um barulho desses

Jornal O Estado do Maranhão  
O pessoal que não gosta de futebol finalmente teve uma boa notícia. Os cientistas, capazes de fazer as mais inesperadas pesquisas, descobriram os malefícios dos pênaltis. Não propriamente com respeito ao time contra o qual eles são cobrados, situação angustiante bem conhecida pelos goleiros e até mesmo pela grã-fina de Nélson Rodrigues ao chegar ao Maracanã nos elevadores da tribuna de honra e perguntar pelo mais novo jogador, a grande revelação da temporada, um tal de Balão de Couro. O caso é muito mais grave. O problema é com a saúde de quem está fora de campo.
Cientistas britânicos da Universidade de Bristol e da Universidade de Birmingham descobriram que a cobrança da chamada “penalidade máxima”, no linguajar dos cronistas esportivos, é de parar o coração, podendo matar os pobres torcedores. A informação foi divulgada no British Medical Journal, uma das mais conceituadas revistas científicas do mundo.
Ao compararem as internações nos hospitais em conseqüência de ataques do coração, automutilações e acidentes de trânsito no dia das partidas da Copa do Mundo de 1998 com os mesmos tipos de admissões em outras ocasiões eles chegaram à seguinte conclusão. No dia do jogo entre Inglaterra e Argentina, 30 de junho, decidido na cobrança de pênaltis, houve um aumento de 25% nas entradas devidas a ataques cardíacos, que chegaram a 55, mas nenhuma alteração nas resultantes de outras causas. Surpreendentemente, houve um acréscimo maior entre as mulheres. Fora da época da Copa, não ocorrem modificações em nenhuma dessas ocorrências.
A sugestão dos cientistas, gente, evidentemente, sem intimidade alguma com o popular “esporte bretão” e com suas emoções, ou as de qualquer outro esporte, foi de que não mais se decidissem as partidas por meio de pênaltis, adotando-se a morte súbita, ou gol de ouro, como forma de desempatar os jogos, pelo bem da saúde pública. Estiveram perto de propor a eliminação do gol, outra fonte de perigosas emoções. Coisa de inglês, com sua famosa fleuma.
A coisa não pára aí, todavia. “A Copa do Mundo dura muito tempo. Se se bebe diariamente, a saúde será afetada”, disse o doutor Ian Banks, do Foro Masculino de Saúde. Ele chama a atenção para o fato de a ingestão de álcool vir quase sempre acompanhada de comidas “insalubres” como pizza, batata frita e salsicha. O ganho de peso, efeito natural da comilança, aumentaria as ameaças ao bem-estar do torcedor.
 Naturalmente, este abusa apenas durante o campeonato, quando, ganhando, comemora e, perdendo, afoga as mágoas no álcool. Mas, não no Natal, no Ano Novo, nos fins de semana sem jogo – quando fica chateado por não poder ver seu time predileto em ação –, nos feriadões, no seu aniversário, no da mulher, da sogra e dos filhos e, aqui no Brasil, durante o Carnaval e o São João. A vida é dura, afinal. É preciso ser cuidadoso, embora ao preço de morrer de tédio esbanjando saúde.
Por falar em pizzas e seus males, vejam o que outra pesquisa, feita na Itália, acaba de revelar. Comer habitualmente esses deliciosos discos de massa de trigo é um hábito benéfico, porque reduz em até 59% a probabilidade de aparecimento de câncer de esôfago, em até 26% o de cólon e em até 34% o de boca. O segredo pode ser o licopene uma substância química antioxidante presente no tomate usado nas pizzas, fazendo-nos duvidar da insalubridade delas.
A conclusão é inevitável. Essas investigações sobre os prós e os contras de certos alimentos podem ter um resultado exatamente oposto à intenção de seus patrocinadores, de melhoria na qualidade de vida das pessoas. Alguém preocupado em se manter saudável vai acabar adoecendo de tanto estresse causado pelo vai-e-vem das recomendações. Pode pizza? Não pode carne? Muito ou pouco exercício?
Por isso, não me surpreende esta história. Uma senhora foi a uma academia, olhou um bocado de gente roliça suando e sofrendo pra perder peso e declarou: “Puxa, eu não sabia que malhação engordava. Não demora, aqueles ali vão ficar do mesmo jeito”.
Difícil dormir com um barulho desses!

22 de fevereiro de 2004

Carnaval Malhado

Jornal O Estado do Maranhão 
Uma das novidades do Carnaval deste ano em nossa cidade é o Rei Momo malhado. Não sei quem teve a idéia, mas sei que não foi, vamos dizer, feliz nem baseada em sólidos princípios democráticos.
Explico-me. De saída, haverá com certeza uma confusão semântica com respeito ao nome. Algumas pessoas – por certo, apenas as menos familiarizadas com essa terminologia um tanto pesada – poderão pensar em malhado no sentido de portador de malhas ou manchas, como as de um bezerro malhado, por exemplo; ou no de surra com malho ou relho. Poderiam, nesta última hipótese, achar que o rei foi malhado por alguma turma invejosa da majestade dele.
Seria este um tipo de malhação em tudo diferente daquela das academias. No caso do malho, os malhadores batem nos adversários, não com pesos, mas a pezadas, sem piedade. No outro, os também malhadores “batem peso”, segundo antiga expressão fora de moda hoje em dia. Ou, o que é a mesma coisa, comem ferro e, às vezes, acabam por se ferrar, na tentativa de ostentar músculos avantajados. Alguns terminam se bombando, mas ficam bombardeados com doenças das quais dificilmente podem sarar. Tornam-se então os não-sarados.
Isso, porém, não é nada em comparação com a natureza discriminatória dessa tentativa de mudança numa das mais caras tradições de nossa terra. Se refletirmos bem, iremos ver que engordar é uma das coisas mais fáceis da vida, como bem sabe quem já tentou algum dia emagrecer, isto é, todo mundo. O peso do nosso corpo, contrariando os efeitos da lei da gravidade sobre os demais corpos, tende sempre a subir, nunca a descer. Ora, se é assim, haverá sempre um grande número de pessoas capazes de cumprir o primeiro pré-requisito para o acesso ao título de Rei Momo tradicional: ser gordo. Portanto, a oportunidade está democraticamente aberta a quase todos os cidadãos. Qualquer pessoa é um projeto de Momo.
Com o rei malhado a história é diferente. Quantas pessoas, entre nossos milhões de patrícios, especialmente depois de uma certa idade, poderão alcançar o cobiçado, contudo inalcançável, na maioria das ocasiões, status de malhado? Pouquíssimas, comparadas com o número daquelas com o potencial momesco clássico. Estamos, assim, diante de uma redução da oportunidade do cidadão comum de chegar à realeza e, por conseguinte, de um cerceamento do espírito democrático da nação brasileira. Coisa, suspeito, de alguma conspiração da globalização e do capitalismo selvagem que se comprazem em impor-nos valores estranhos à nossa rica cultura.
Essas considerações, somente, já poderiam servir de argumento contra essa novidade infeliz. Há mais, no entanto.
Vamos analisar uma situação hipotética, mas possível de acontecer, em que alguém, com ambição ao título de Rei Momo, tenha seguido todas as recomendações dos especialistas, com o objetivo de chegar ao Carnaval com os quilos e a silhueta ideais para derrotar a concorrência na busca pela coroa que, por sinal, dá o direito ao rei de desfilar na companhia de belas princesas.
O sujeito passou um ano inteiro arriscando as coronárias, o coração, o estômago, o sistema circulatório e seu próprio vigor masculino. Sacrificou sua saúde abusando de churrascos, pizzas, refrigerantes, cervejas, doces e sorvetes. Tudo com a esperança de botar a mão no título do campeonato, para usar uma metáfora tão ao gosto de Lula, outro que jamais poderia chegar lá, pois não se conhece nenhum presidente Momo.
Aí, chega alguém e lhe dá a surpreendente notícia. Agora o cara tem de ser malhado se quiser desfrutar a honra máxima do Carnaval. Todo o sacrifício foi em vão? De nada adiantaram a férrea disciplina e o cuidadoso preparo a fim de exercer o mando nos três dias de folia? Poucas surpresas serão tão frustrantes quanto esse verdadeiro golpe de Estado. Onde ficam os direitos adquiridos? Só porque usa um cinto de boxeador, o rei malhado tem o direito de usurpar um trono?
Desse jeito, nosso Carnaval, em vez de molhado pelas chuvas, como todo ano, vai acabar malhado daqui em diante.

15 de fevereiro de 2004

Cachorros e Formigas

Jornal O Estado do Maranhão
Não sei se os leitores se lembram de Bingo. Não? Eis a sua história. Ele foi arbitrariamente preso em Timon, no Maranhão. A irritação com um vizinho inconveniente que vivia buzinando na porta de sua casa dia e noite causou-lhe um incontrolável, mas compreensível, acesso de raiva. Bingo deu uma leve dentada nele. De nada adiantaram os pedidos às autoridades, em seu favor, de testemunhas do suposto ataque. A justiça não tardou nem falhou, pois ele recebeu voz de prisão logo após o ato impensado. Foi em seguida recolhido ao centro de controle de zoonoses do município.
Lá, aquela inofensiva mistura de poodle com pequinês, não pôde deixar de viver um sério conflito, nascido da diferença entre a natureza puramente canina de seus companheiros de infortúnio e a sua própria, humana. A propósito, foi o ex-ministro do Trabalho, Rogério Magri, quem descobriu essa humanidade dos cachorros, após uma longa convivência com Orca, sua cadela de estimação.
Fizeram com Bingo, em verdade, uma grande cachorrada. Ele permaneceu confinado sem formação de culpa, sem acusação formal, sem nada, até que, muitos meses depois, atendendo aos apelos de sua dona, de cortar o coração, o Tribunal de Justiça do Maranhão mandou o juiz libertá-lo, fazendo prevalecer a justiça humana para um humano injustiçado, embora na pele ou no pêlo de cachorro.
Mas, esse negócio de animal às voltas com demandas judiciais não é novo aqui. Vejam o processo das formigas, do início do século XVIII. Os capuchinhos acusaram formalmente, perante o juízo eclesiástico, os pobres insetos de furtarem alimento da despensa do convento de Santo Antônio e de contribuírem para a destruição do prédio, ao afastarem “a terra debaixo dos fundamentos, que ameaçava ruínas”, nas palavras do padre Manuel Bernardes na Nova floresta.
As formigas passaram a viver uma vida de cão. Nem por isso deixaram de ser tratadas como gente. João Lisboa afirma ter visto os autos do processo nos arquivos do convento. Ele transcreve uma certidão do escrivão José Guntardo de Beckmanns (escrito assim mesmo). Em um trecho dela pode-se ler isto: “[...] na sua cerca citei as formigas em sua própria pessoa [...] lendo-lhes tudo de verbo ad verbum [...]”. Disseram as “rés Formigas” através de seu curador ad litem, isto é, no processo, que sendo necessário, provariam que as testemunhas dos frades não eram confiáveis.
O caso de Bingo teve um final feliz. Não se sabe, contudo, o desfecho do das formigas, apesar do padre Bernardes ter feito referência em 1706 a uma decisão final. O juiz teria determinando aos frades a marcação “dentro de sua cerca [de] sítio competente para a vivenda das formigas, e que elas sob pena de excomunhão mudassem logo de habitação”. Impossível, no entanto, seria a imposição de tal sentença, ou de qualquer outra, naquele ano, porque o processo se arrastou até pelo menos 1713, da mesma forma como engatinham os de hoje.
Agora, o Supremo Tribunal Federal pretende manter a tradição de dar humana atenção aos humanos animais, porquanto em breve irá pronunciar-se sobre a morte de uma cadela mineira, Pretinha. Ela foi recolhida pela carrocinha da prefeitura de Belo-Horizonte e sacrificada antes do prazo legal de dois dias. A sua dona deu início a várias ações nos tribunais. Recurso vai, recurso vem, o caso acabou no STF.
Como Pretinha não era uma besta de carga, ninguém poderá dizer que essa história é uma besteira ou que besta é quem acredita na justiça. Pensando bem, a apreciação pelo Supremo é uma inequívoca fonte de esperança para o formigueiro humano de milhares de brasileiros que esperam alguma decisão sobre as ações de seu interesse. Eles haverão de achar que se, os cachorros são atendidos com tão boa vontade, então não haverá razão para os homens, de quem aqueles são os melhores amigos, não receberem o mesmo tratamento do nosso sistema de justiça. Toda a ansiedade vista hoje entre os demandantes humanos desaparecerá e a nação viverá em paz, felicidade e progresso eternos.

8 de fevereiro de 2004

As Índias

Jornal O Estado do Maranhão 
Em recente viagem à Índia o presidente Lula ralhou com os exportadores brasileiros ao dizer que eles deveriam vender mais e reclamar menos. De fato, os empresários têm reclamado, com razão, da burocracia estatal, pois, parece-me, é dela, principalmente, com seus regulamentos e normas confusos e obscuros, que eles se queixam.
Ela tem sido no Brasil um poderoso fator de inibição das exportações, especificamente, e das atividades econômicas, de um modo geral, bem como um inaceitável agente de opressão do cidadão indefeso nas suas mais corriqueiras atividades no trato com o Estado. Procedimentos vistos pelo senso comum como banais tornam-se garras da impenetrável lógica burocrática e instrumentos de seu autocrescimento e autojustificação. Somente quem nunca a enfrentou pode reclamar de quem reclama dela.
Esse não é certamente o caso do presidente Lula. Nos seus tempos de líder sindical quantas vezes não terá lutado contra a burocracia. Esta, provavelmente, era manipulada pelo regime militar com a intenção de tornar a vida dele difícil, mais do que já o era para um operário de uma sociedade distante ainda de proporcionar à maioria de seus cidadãos os direitos básicos à segurança material e à liberdade.
Mas, precisamente da Índia vem um exemplo de como a eliminação de entraves burocráticos, assim como de preconceitos ideológicos, pode tornar mais fácil o início de um processo consistente de desenvolvimento, única forma de arrancar um povo da pobreza, sem as ilusões de programas sociais de doação que reforçam a cultura da dependência e humilham os supostos beneficiários.
Lá, segundo dados da revista Veja, são necessários 88 dias e 10 procedimentos quando se abre uma empresa, números altos ainda, mas em declínio. No Brasil, pena-se durante 152 dias, quase o dobro, através de 15 procedimentos, número 50% maior do que o dos indianos. A carga tributária é de 10% do PIB (no Brasil, 40%), o juro real é de 8% (no Brasil, 12,8%), a poupança interna é de 22,4% do PIB (no Brasil, 18%) e suas reservas internacionais estão em US$ 102 bilhões (no Brasil, US$ 53 bilhões).
As reformas implementadas nos últimos tempos atacaram a papelada inútil daquele país de mais de um bilhão de habitantes, que está mudando rapidamente, colocando-se à frente do Brasil em vários campos. Todavia, elas foram mais amplas. Eis um exemplo. As restrições à propriedade por estrangeiros de empresas instaladas na Índia foram praticamente eliminadas em quase todos os setores da economia.
Essa atitude sensata tornou possível a obtenção de uma taxa de crescimento média anual de 6% nos últimos 5 anos, o dobro da mundial, perto da taxa da China e três vezes a do Brasil no mesmo período. Como conseqüência, o número de pessoas da classe média, isto é, com uma capacidade de consumo que lhes permite adquirir bens além daqueles destinados a lhes assegurar a sobrevivência imediata, como alimentação, vestuário e moradia, dobrou desde 1995, passando a 100 milhões de pessoas. Em outras palavras, o mercado interno expandiu-se consideravelmente, tornando lucrativos investimentos para atender a uma demanda interna ampliada.
Há, evidentemente, muitos problemas na Índia no campo social. O vergonhoso sistema de castas diminui a mobilidade social no país. Seu Índice de Desenvolvimento Humano - IDH ainda é baixo, comparado com o do Brasil e o de outras nações, e 350 milhões de indianos sobrevivem com menos de 1 dólar por dia.
Paradoxalmente, seu sistema educacional é muito bom, tendo produzido até agora excelência científica incontestável e 6 ganhadores do Prêmio Nobel, tanto em física, medicina e economia, quanto em literatura.
Mantidas as atuais tendências, o país, como a Coréia do Sul nos anos cinqüenta, poderá, em uma geração ou duas, eliminar a pobreza. Se de lá já importamos e nacionalizamos a mangueira, a jaqueira e o coqueiro, que hoje, depois de séculos, nos parecem tão nossos, por que não experimentar o exemplo dessa Índia Oriental nestas Índias Ocidentais brasileiras?

1 de fevereiro de 2004

De Boas Intenções...

Jornal O Estado do Maranhão 
Volta e meia, alguém se lembra de aumentar a lotação do inferno com – vá lá – boas intenções. Essa prática e suas conseqüências danosas são velhas, da idade de Matusalém, mas, lamentavelmente, continuam a ter muitos adeptos. Falo do Estatuto do Idoso em seu parágrafo terceiro, inciso V, do 15º. artigo, aprovado pelo Legislativo e sancionado pelo Executivo. Lá, está a eterna mania de quererem fazer obséquio com o dinheiro alheio.
Na tentativa de proteger o cidadão de 60 anos ou mais de supostos “aumentos abusivos” por parte das firmas que comercializam planos de saúde privados, proibiu-se a elevação dos valores cobrados dessa faixa etária. Resultou daí a elevação para os futuros idosos – aqueles com idade abaixo desse limite – da mensalidade a ser paga a partir de seu ingresso nos planos.
Ocorre o seguinte. As empresas, como forma de compensar a proibição relativa aos mais velhos, elevaram, muito previsivelmente, aliás, a contribuição dos mais novos, especialmente daqueles na faixa de 44 a 49 anos. O aumento previsto para atingi-los somente depois de completarem 65 anos passou a ser cobrado logo e continuará a sê-lo, exceto na hipótese de resolverem piorar a situação, estabelecendo a mesma restrição para todas as faixas. Na prática, muitos que pensavam participar não mais o farão. Um burocrata da Agência Nacional de Saúde disse com ar de sabichão e tom professoral que o Estatuto obriga um pacto entre gerações. Bacana!
Entre os que vêem o lucro como pecado e acham que o empresário o almoça e janta, não faltará quem apóie esse tipo de ação bem intencionada, porém tola e desastrada, e quem veja as empresas de saúde como gananciosas e merecedoras mesmo de punição, por meio da utilização de controles de preços. A suposição é, naturalmente, de serem elas entidades filantrópicas; de existirem só receitas, mas não custos; de o atendimento aos idosos, demandantes de mais assistência médica em comparação aos jovens, não provocar acréscimo de custos e de não haver a necessidade de cobri-los.
 Porém, como todo aluno de economia do primeiro período, ou qualquer um que se dê ao trabalho de abrir um livro de história econômica, sabe, controles de preços nunca funcionaram no passado, não funcionarão no presente nem no futuro em uma economia de mercado. Ou melhor, funcionam, mas ao custo da suspensão da produção de bens e serviços, com o conseqüente desabastecimento, desemprego e diminuição da renda nacional. Mais certo seria ficar vigilante contra cartéis e monopólios e estimular a competição.
Mesmo em economias centralmente planificada, em que o governo imagina controlar todos os preços, essa será sempre uma pretensão ingênua, ou talvez arrogante, mas inevitavelmente fracassada. Essa ilusão, com todas as ineficiências dela resultantes, muito contribuiu para a derrota da antiga União Soviética na disputa com os Estados Unidos pela hegemonia econômica mundial.
Quero deixar bem claro uma coisa. Não sou de modo algum contra o Estatuto nem poderia sê-lo, como nenhuma pessoa é. Sou, sim, contra esse dispositivo, pela sua irracionalidade travestida de boas intenções. Ele não representa uma conquista social, como muita gente gosta de proclamar. É uma derrota da economia do país e de todos, pobres e ricos, jovens e idosos, como o foram muitas das “conquistas” da Constituição de 1988.
Os legisladores têm a tendência de conceder benefícios sem consideração alguma dos custos da concessão. Se tal procedimento fosse sustentável, para usar uma palavra da moda, então estaríamos no paraíso terrestre, pelo menos do ponto de vista material. Infelizmente, tudo tem preço, nada é de graça, como Adão e Eva já sabiam desde antes de sua injusta expulsão do Éden. Se nossos dirigentes querem cumprir suas obrigações, dando condições de vida dignas aos idosos, temos a obrigação de apoiá-los. Devem fazê-lo, todavia, de outra forma. Não é pela adoção de ilusionismo econômico-social que os mais velhos serão salvos. Nem eles nem ninguém.

Machado de Assis no Amazon