2 de dezembro de 2012

Sem assunto?


Jornal O Estado Maranhão

          Há uma praga entre os cronistas, ou pelo menos a maioria deles diz haver: a falta de assunto, o computador ali mirando o potencial autor do texto, a tela branca do Word esperando o início da conversa. Quantas vezes o leitor já leu alguém confessar não saber sobre o que escrever naquele dia, como começar o texto com prazo certo de chegar ao jornal? Dezenas, por certo. Nessas ocasiões a desculpa da falta permite ao cronista escrever uma crônica inteira, exatamente a propósito da ausência de assunto. No entanto, não existe escassez mas excesso de temas.
          Esta semana, o leitor já deve ter notado, há coisas demais a respeito das quais falar. Ou pelo menos assim me parece: a escolha de Felipão como o novo técnico da seleção, tendo como coordenador técnico Parreira, dois profissionais do futebol ganhadores de Copas do Mundo pelo Brasil, em 2002 e 1994; o péssimo resultado do Brasil em avaliações internacionais de sistemas de ensino num grupo de 40 países; o excelente artigo de Eliana Cardoso, atualmente professora da Escola de Economia de S. Paulo, Fundação Getúlio Vargas, em contestação da tese de Caio Padro Júnior exposta no seu livro Formação do Brasil contemporâneo, segundo a qual a formação econômica do Brasil deu-se exclusivamente segundo um modelo de latifúndio escravagista, baseado na exportação de bens primários; a posse de Joaquim Barbosa, merecidamente novo herói nacional, mas não do PT, na presidência do Supremo Tribunal Federal; o término do julgamento do mensalão, com a condenação de mensaleiros de alamares máximos, alguns em regime fechado de prisão, e dessa forma os fatos se apresentam.
          O problema, como se vê, é outro: escolher apenas um tópico ou, no máximo dois, entre vários, levando em conta a finitude de espaço no jornal. Como fazer? Felipão e a seleção já foram objeto de uma série de crônicas que escrevi em 2002, depois selecionadas para meu livro de crônicas Pedaços da eternidade, do primeiro jogo até o sétimo e último, todos com vitórias do Brasil, campeão pela quinta vez da Copa do Mundo de futebol daquele ano. Em 2014 é ter a esperança de a combinação dos treinadores do tetracampeonato e do penta dar certo e resultar no hexa na Copa brasileira.
          Em relação à péssima qualidade da educação no Brasil e as consequências desastrosas de tal descaso das autoridades, já fiz inúmeras referências a fim de dizer que sem um bom e sólido sistema educacional sociedade alguma sustém seu crescimento. Tomemos como exemplo a Coreia do Sul, que, apenas cinco ou seis décadas atrás, tinha renda per capita inferior à do Brasil. Os coreanos fizeram uma revolução educacional a partir dos anos cinquenta e sessenta, tornando-se potência econômica, tendo a melhor educação do mundo, segundo a avaliação referida acima. Parece ser chuva no molhado falar disso no Brasil.
          E acerca da interpretação marxista de Caio Prado sobre a formação econômica do Brasil? Já dei notícia aqui do livro História do Brasil com empreendedores, de Jorge Caldeira, que, apesar de escrito de um ponto de vista igualmente marxista, é livro importante, refutando as ideias de Prado Júnior e atribuindo papel importante na história de nossa economia a empreendedores independentes e não apenas aos ligados ao latifúndio. Caldeira soube usar judiciosamente os dados disponíveis, sem permitir à ideologia ficar no comando de sua análise.
           Resta dizer algumas palavras relativamente a Joaquim Barbosa, pois sobre o mensalão já o fiz repetidamente. Tenho lido declarações que associam as virtudes de Barbosa à cor de sua pele, como se atributo físico ou fisiológico como esse fosse pré-condição para ele pensar de uma forma ou outra, ser isso ou aquilo. Não é assim. Se ele fosse branco, teria de pensar de forma diferente? Teria de ser desonesto, racista e subordinado a partidos políticos?
          Às vezes os temas a nossa disposição são numerosos a tal ponto que se acaba falando de todos, ou fingindo falar, ou de quase nenhum, como agora. Mas, todos passam, menos um, diria Carlos Heitor Cony: “Onde estão os ossos de Dana de Teffé?”

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