2 de junho de 2002

Começou de novo

Jornal O Estado do Maranhão
De repente, me dou conta de que a Copa do Mundo, a décima sétima, iniciada há dois dias, é a décima terceira que acompanho, desde a da Suíça em 1954, minha primeira, quando o Brasil, vindo de uma inesperada derrota em 1950 para o Uruguai, no Maracanã, haveria de ser derrotado novamente, desta vez pela Hungria, bicho papão daquela época. Os húngaros, por seu turno, como o Brasil quatro anos antes, mas sem a vantagem de jogar em casa, perderam o título para a Alemanha, mesmo sendo os mais cotados para vencer.
Em 1954, eu tinha seis anos de idade. Ainda se ouvia nos mais velhos o eco da derrota na Copa anterior. Quem foi culpado, quem não foi, faltou fibra, não faltou. Às vezes penso que, sem essa derrota, com seus ensinamentos, o Brasil não teria tido uma trajetória vitoriosa nesses torneios.
Se considerarmos aqueles realizados de 1938 em diante, quando o Brasil ficou pela primeira vez entre as quatro equipes mais bem colocadas, e deixarmos de fora os dois primeiros, vencidos pelo Uruguai, em 1930, e pela Itália, em 1934, veremos algo interessante. Em quatorze Copas, ficamos em primeiro lugar em quatro (1958, 1962, 1970, e 1974), em segundo em duas (1950 e 1998), em terceiro em duas (1938 e 1978) e em quarto lugar em uma (1974). Portanto, nove vezes entre os quatro primeiros. Ou, se incluirmos todas as Copas, nove em dezesseis.
Nas seis entre 1958 e 1978, estivemos sempre em uma dessas quatro posições, exceto na de 1966, na Inglaterra. Nas duas Copas anteriores à deste ano, jogamos a partida final. Ganhamos a primeira, em 1994, e perdemos a outra, em 1998. Apesar do choro antecipado e persistente dos pessimistas, temos razão para otimismo, agora, e para orgulho, permanentemente, ainda que o Brasil não vença esta Copa e as próximas que eu puder acompanhar pelo resto de minha vida. Umas sete ou oito, espero.
E por falar em pessimistas, é claro que, calculada como probabilidade estatística, qualquer previsão mostrará nossas chances de terminar em primeiro lugar como alguma coisa em torno de 25%, quatro vezes em dezesseis. Fica evidente, assim, o acerto dos derrotistas, na maioria dos casos, em prever nossa derrota. Ser pessimista é mais fácil por causa desse fato probabilístico. O Brasil não triunfou na maioria de suas participações em Copas nem irá fazê-lo na maior parte das próximas. Todavia, foi o vencedor mais freqüente em comparação com todos os países, por qualquer medida que se queira usar ou em quase qualquer período que se queira tomar. A questão é saber se algum outro país tem tanto sucesso quanto o nosso. Quem fez mais do que nós?
Mas, não posso exigir de nenhum torcedor ou de mim mesmo, uma análise tão racional. Jogo é jogo. Essa frieza, pode-se ter antes do começo. Durante a Copa a história é outra. O que conta é a paixão do esporte, o mais popular no mundo. De outra forma, tudo ia ser muito insosso, sem graça, pálido, chato. Mostro os números tão-somente para lembrar que somos os melhores, embora não possamos vencer todas as disputas.
Há, repito, razão para otimismo. Com ou sem a declaração boba de Pelé, sobre o Brasil não estar entre os favoritos. Se esse gênio da bola prestasse mais atenção aos números, evitaria algumas de suas mancadas. O Brasil forma, junto com a Argentina, Itália e Alemanha, um grupo especial. Um desses quatro sempre disputou a partida final em todas as Copas. Em todas, sem exceção. E mais, dos dezesseis títulos, doze são deles. Eles são eternos favoritos, apesar de seus eventuais maus momentos, como é o caso da Alemanha ultimamente.
Em Copa do Mundo não existe zebra. Ela só deu as caras quatro vezes. Duas com o Uruguai, uma com a Inglaterra e uma com a França que perdeu por um a zero para o Senegal na abertura da Copa, na Coréia, na sexta-feira passada. Pelé ainda a classifica como favorita? O Brasil é, sim, favorito. Se vai ganhar, é outra história. Isso, saberemos em breve. Agora, é vestir a camisa, levantar a bandeira, torcer pelo Brasil e comemorar.

Machado de Assis no Amazon