20 de março de 2005

A César o que é de César

Jornal O Estado do Maranhão  
O Ministério da Saúde e a prefeitura do Rio de Janeiro engalfinham-se pela saúde do povo da Cidade Maravilhosa. Mas, quem achar que da briga resultará algum benefício de caráter permanente para a população, trate de se internar num hospital longe de lá, a fim de se tratar de ingenuidade aguda. Em meio a golpes baixos e altos, e contra-golpes sujos e malcheirosos, o governo federal decretou estado de calamidade pública na rede hospitalar do Rio e interveio em seis hospitais municipais.
Em represália, o prefeito César Maia exonerou 51 funcionários dos hospitais de seus cargos em comissão, depois retirou as gratificações e cargos de chefia de 285 e, por fim, suspendeu o fornecimento às unidades hospitalares de kits para análise de tipos sangüíneo dos pacientes, que precisariam de toda a paciência do mundo para aceitar essas decisões. Todas essas medidas edificantes, prova de elevado fervor cívico e comovente preocupação do prefeito do Rio com a saúde do povo carioca, foram vetadas pela justiça.
Do outro lado do ringue, ou da rinha, encontra-se o ministro da Saúde, Humberto Costa. Foi dele a genial afirmação, alguns dias atrás, sobre a “normalidade” das mortes por desnutrição de crianças indígenas em Dourados, Mato Grosso do Sul. Auxiliares dele, há pouco tempo, participaram de fraude na licitação de hemoderivados, no Ministério da Saúde. Isso mostra que lhe falta discernimento na escolha de auxiliares, como lhe faltou no episódio da morte dos pequenos índios.
Não se deve estranhar declaração como essa, pois é consistente com um governo cujos ministros vêm se especializando na tentativa eliminar cidadãos e valores democráticos. Lembram-se daquele outro, Ricardo Berzoini, que, quando estava no Ministério da Previdência, ameaçou os aposentados de 90 anos e mais com a suspensão do pagamento de suas pensões, atentando, assim, contra a vida de milhares deles, ao lhes exigir a presença em postos de recadastramento do INSS? (Cadastros, como se sabe, resolvem todos os problemas da burocracia estatal, mas não os dos supostos beneficiários). Depois, como ministro do Trabalho, ele propôs a criação de um tal de Conselho Federal de Jornalismo, idéia trotskista voltada para o assassinato da liberdade de imprensa, digna de comandantes do MST, velhos companheiros do ministro.
Quem paga o pato dessa disputa irresponsável e ainda leva patadas é o povo do Rio de Janeiro. Se não há recursos para aplicação na saúde, deve haver de sobra para vilas olímpicas, já que a prefeitura assumiu compromissos de R$ 232 milhões para construção de uma, a ser usada nos Jogos Pan-americanos de 2007. De fato, o caso não deve ser mesmo de falta de dinheiro, senão como explicar a aplicação no mercado financeiro, pelo secretário municipal da Saúde, que é sócio de um banco, de R$ 30 milhões, antes destinados ao setor da saúde e não à produção de receitas financeiras?
Com prefeitos desse tipo, espalhados por todo o Brasil, não só em cidades grande, mas nas de todos os tamanhos, como ter esperança de melhoria na qualidade de vida dos cidadãos? Esses dirigentes não dão bola para a saúde pública, a educação, o trânsito, a coleta de lixo e o calçamento das ruas. Um alvo muito caro a eles é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que sofre uma campanha irresponsável visando torná-la irrelevante.
Alguns querem a Presidência da República, como César Maia. A ambição de outros é se reeleger, empregar parentes e aderentes, enriquecer com o dinheiro público e, se restar alguma coisa, fazer alguma pracinha ou campo de futebol. O povo que se vire com os brioches dormidos de Maria Antonieta. Mas, para ficar com mais uma figura histórica, a César o que é de César: esse pessoal bem merece ser decapitado de nossa vida pública.

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