14 de dezembro de 2003

Luz no túnel!

Jornal O Estado do Maranhão
Foram avisar o presidente de que o Ministério do Exterior estava sem luz.
– Sem luz? Como sem luz? Isso é alguma piada de mau gosto? Vocês é que são uns apagados. Em todas as minhas viagens ao exterior ninguém me dá mais luz do que aqueles competentes companheiros do Ministério. Até agora, não senti falta de absolutamente nada nesta minha volta pelo mundo, principalmente de luz. Como é que eles podem estar sem luz, umas pessoas tão inteligentes como elas?
– Desculpe, presidente. Nós não estamos falando no sentido metafórico. O caso é que cortaram...
– Não me venham com essa conversa fiada. Vocês ficam aí falando de falta de luz, quando todo mundo conhece o brilho do Ministério do Exterior. Como pode faltar luz num órgão tão brilhante? E tem mais. Eu já não agüento mais essa história de metáfora. Toda semana aquele pessoal da televisão me torra a paciência com essa gracinha. Agora, vocês me aparecem com essa. Sim senhor, metáfora... Aliás, hoje em dia metáfora é como cargo no governo: todo mundo quer ter uma. Ah, esqueçam essa metáfora.
– Presidente, com sua licença, mas não é sobre esse tipo de luz que estamos falando, é...
– É o quê? Desembucha, companheiro ajudante-de-ordem.
– O problema aconteceu por causa do aperto orçamentário que o...
– Quer dizer que a culpa é do Falofe, quer dizer Falofe, não é? Eu já sabia. Tudo que vocês pensam que é ruim, é culpa dele. Quantas vezes eu já disse que o presidente da República sou eu e não Fa..., quer dizer, o ministro da Fazenda? Se vocês e a imprensa não têm coragem de me criticar diretamente por causa de meu cargo, eu tiro esta faixa presidencial e nós vamos sair no braço já, já. Com minha bursite no ombro esquerdista, isto é, esquerdo e tudo.
– Calma, excelência...
– Eu vou dizer uma coisa. Vocês não sabem de nada mesmo. O Ministério do Exterior é como o sol: tem luz própria, não precisa da luz de ninguém. Ouviram bem? De ninguém.
– Se o senhor nos autorizar, nós podemos...
– Não autorizo nada. O que eu tinha de autorizar, já autorizei. Ou vocês não conhecem o programa Luz para Todos que eu acabei de criar? Vocês não lêem jornal? Se lêem, então essa minha equipe da comunicação não está funcionando. E eu que pensei que os meus marqueteiros eram brilhantes. Nem o pessoal do governo sabe o que estamos fazendo!
– Claro que a gente sabe, presidente. Faltou vontade política do governo passado para fazer um programa como esse. Daqui pra frente, tudo vai ser diferente. Agora, o negócio é dar a luz para....
– Esperem um pouco. Ninguém vai dar luz coisa nenhuma, desse jeito que vocês estão pensando. Nós precisamos é reduzir a nossa taxa de natalidade, não incentivar o aumento da população. Aliás, esse nosso programa foi feito pra isso mesmo. Com muita luz por todo este imenso país a população não vai crescer rápido. Ou vocês não se lembram do que aconteceu no dia do grande apagão em Nova York? Nove meses depois a taxa de natalidade da cidade foi lá pra cima.
– Presidente, voltando à luz...
– Quem disse pra vocês que a gente estava às escuras? Que insinuação é essa? A gente sabe muito bem o que a gente quer fazer com este país. Mas não vou revelar, pra oposição não atrapalhar nossos planos. Vejam bem, é só uma questão de tempo até os resultados aparecerem. Esse pessimismo é que acaba com este país. Assim não pode, assim não dá.
– Excelência, desculpe, mas “assim não pode, assim não dá” é um bordão do outro presidente. Mas, com sua permissão, acabamos de receber uma mensagem de nossa capital dizendo que o problema está sendo resolvido. Logo, logo, a situação estará mais clara. Existe uma luz no fim do túnel!
– Eu não acredito. Lá vêm vocês de novo. Não tem jeito mesmo. Por que no fim e não no começo desse túnel aí?
PS: No dia 11/12, quando terminei de escrever esta crônica, recebi a notícia de minha eleição para a Academia Maranhense de Letras. Compartilho essa alegria com os leitores.

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