O Consultor



Jornal O Estado do Maranhão

          Não sei a razão de tanta agitação com o anseio de trabalhar do apenado José Dirceu, num hotel de luxo de Brasília. Certo, ele já desistiu da ideia. Felizmente, todavia, a cooperativa de presidiários Sonho de Liberdade comunicou ao STF que oferece novo emprego a ele, por R$ 505,00 por mês. Aceitará? Perdeu-se, no entanto, no setor hoteleiro grande oportunidade de serem usadas em benefício da nação as habilidades de um trabalhador altamente qualificado. Afinal, o Zé tem experiência nesse ramo. Lembram-se de quando até políticos do PSDB corriam a outro hotel na mesma cidade para se consultar com o ex-líder estudantil dos anos 60? As visitas iam de dirigentes de grandes estatais a ministros, ávidos por sábios conselhos. A lista tinha peso em dois sentidos. Um derivava da importância política e econômica dos que nela figuravam e, o outro, das toneladas de quilos em excesso de muitos deles, senhores que prosperaram na vida honestamente, claro, em muito aumentando o patrimônio da família, e, junto com este, a circunferência de suas barrigas, com reflexos espetaculares na balança e na conta bancária de conceituados médicos.
          Lembremos os frequentadores do Dirceu enquanto ele atuava em hotéis (o que seria de mim sem o Google!): o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, os senadores Walter Pinheiro, Delcídio Amaral e Lindbergh Farias, do PT, Eduardo Braga, do PMDB, o então presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, os deputados Devanir Ribeiro e Cândido Vaccarezza, do PT, Eduardo Gomes, do PSDB, e, por fim, o ex-senador tucano Eduardo Siqueira Campos. Era um grupo ecumênico: PT, PMDB, PSDB e outros gatos escondidos com o rabo de fora.
          Esse pessoal chegava ao quartel-general, ajoelhava e rezava. E as fervorosas preces eram quase sempre atendidas. Afinal, tratava-se de alguém que, segundo suas próprias palavras, quando chamava alguém do governo, não estava tão só fazendo uma ligação telefônica. Estava disparando “a ligação”, apesar de na ocasião já estar em andamento no Supremo Tribunal Federal uma tal Ação Penal 470, por outro nome Mensalão. Qual maluco acreditaria na época que algum dos acusados, principalmente o consultor, seria condenado e estaria hoje no presídio da Papuda, em Brasília? Natural, assim, a romaria a seus aposentos.
          Essas credenciais do Zé me levaram a apoiar o desejo inicial dele. Não dizem que os condenados precisam de oportunidades de ressocialização? De ombros amigos e conforto da família? Pois no hotel pertencente a um amigo panamenho, por modéstia morador da periferia da Cidade do Panamá, ele teria tudo isso e mais, sem aquele atrapalho de só poder receber os clientes com dia da semana e hora marcados, com filas, revista dos visitantes, cheiro de povo e outras aporrinhações da vida de um penitenciário. O mais prático seria ficar no hotel mesmo. É mais confortável, o semipreso não precisa pedir licença para isso e aquilo a toda hora, principalmente ir ao banheiro. Não, com certeza, o Zé é feito de substância mais nobre e resistente. Sua vocação é outra.
          Por isso, agora, apoio agora da mesma forma a exigência do fanqueiro do povo brasileiro – esta palavra, fanqueiro, de delicioso sabor arcaico, entrou na língua por volta de 1538, e se refere não a funk, mas a fancaria, trabalho grosseiro, ordinário, mal-acabado, segundo o Houaiss) – apoio a exigência dele, eu dizia, de continuar a colocar matérias em seu blog a partir de sua cela.
          É fácil imaginá-lo postando textos e mais textos naquela sintaxe muito peculiar, gritando contra as injustiças que tem sofrido da mídia golpista, do tribunal de exceção, o STF, que tem oito ministros nomeados pelo seu partido, por banqueiros que não lucraram nada durante os governos do PT, por gente inconformada com as espetaculares taxas de crescimento da economia no governo Dilma e com o controle rigoroso da inflação.
         Mas o mais bonito, o verdadeiramente educativo seria acompanhar no blog os capítulos diários da nova novela das 8, “O Julgamento do STF”, escrita, estrelada e dirigida por... Zé Dirceu.

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