22 de dezembro de 2013

Em benefício da cidade

Jornal O Estado do Maranhão

          Uma pessoa segue pela avenida dos Holandeses. Dirige seu automóvel enquanto fala ao celular. Então joga fora um papel de bombom. Se somente ela se comportar de modo semelhante, ninguém será prejudicado. A relação entre o número de acidentes provocados por quem dirige e ao mesmo tempo fala ao telefone e o número de veículos, ficará inalterada ou perto disso. O trânsito continuará tão seguro (ou inseguro) e a cidade tão limpa (ou suja) quanto no ano anterior.
          E se todos pensarem e agirem assim? Aí, não haverá sistemas de saúde emergencial e de coleta de lixo capazes de atender às novas demandas pelos serviços criados pela nova situação. O inofensivo, quando praticado por um cidadão apenas, não causará transtornos à população. Lembram-se da história de estacionar no meio da rua, bloqueando o trânsito, e dizer que a demora será pouca? É a mesma coisa. Se um, tão só, se comportar dessa forma, não haverá prejuízo. Se todos, porém, seguirem o mau exemplo, o trânsito não andará. É a falácia da composição: um comportamento individual, aparentemente sem potencial de causar problemas, poderá paralisar a comunidade, quando agregado simultaneamente a partir de cada um de seus membros.
          O princípio se aplica à ocupação irregular de áreas públicas. Uma só pessoa que as ocupe comete uma irregularidade. Se muitas fizerem o mesmo e não forem reprimidos pelas autoridades, então estaremos em presença de uma impossibilidade prática de funcionamento, pelo caos instituído. De ocupação em ocupação, chegaríamos à lei da selva, onde o mais forte e mais cara de pau prevalece.
          Tal a razão de eu ter escrito um texto chamado Ação Civilizatória, publicado no meu blog, em que eu fazia comentários elogiosos à ação do Ministério Público, por intermédio, em especial, de dois de seus promotores, Cláudio Cabral e Cláudio Guimarães, que, em parceria com o o Crea-MA, a Blitz Urbana, da Prefeitura de São Luís, o Corpo de Bombeiros, do Estado, e a Secretaria Municipal de Urbanismo e Habitação, promoveram correta e legalmente a demolição de construções irregulares em áreas públicas.
         Os atingidos pelas medidas receberam notificações diversas vezes, sem dar bola às advertências. Haverá sempre alguém, todavia, disposto a dar a sugestão de se fazer, antes de operações de natureza análoga à da realizada, “campanhas de conscientização”. Ora, se elas dessem resultados consistentes e permanentes, teríamos de acabar com as polícias por falta de trabalho. Bastaria promover uma dessas campanhas, em que se diria que ninguém deve roubar, furtar, matar, praticar estelionato, caixa dois de campanha, promover mensalão, e pronto. Os problemas desapareceriam. Mas nossas cidades não são habitadas pelos bons selvagens de Rousseau, um dos pais do totalitarismo moderno, que de tanto amar a humanidade abandonou os cinco filhos num orfanato. Amava a espécie humana e odiava o espécimen, como os esquerdistas e socialistas de hoje.
         O “estamos trabalhando”, como alguns alegaram, não justifica a transgressão. Se a lei for ruim (não é), ela deve ser, primeiro, modificada para algo como: “as áreas públicas podem ser invadidas por quem chegar na frente, etc.”, mas nunca descumprida.
         O Ministério Público e os outros órgão mostraram que é possível juntar duas esferas de governo e entidades privadas (o Crea) pelo bem estar dos cidadãos e pela civilidade entre eles. A esse respeito, menciono o fato de, em uma das situações encontradas, a de um bar que ameaçava um bem nacional tombado, houve a atuação paralela, mas de igual eficácia, de Katia Bogea. Ela, na qualidade de representante no Maranhão, do Iphan, órgão encarregado da proteção de bens desse tipo, informou ao Ministério Público Federal, autor de ação civil pública contra o estabelecimento, a intenção deste de promover um réveillon na proximidade da edificação, com potencial de aglomerar grande número de pessoas e danificá-la. O MPF foi à Justiça Federal que ampliou medida liminar anterior e aumentou a multa já arbitrada, evitando o provável dano. Todas são medidas acertadas em benefício da cidade.

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