7 de abril de 2013

Dragão à solta

Jornal O Estado do Maranhão


          Em diversas ocasiões, neste jornal, fiz referências ao único e importante mérito de Lula na Presidência da República: sua política econômica, aí incluída a defesa da Lei de Responsabilidade Fiscal, fato assinalado, por exemplo, em minha crônica do dia 13/12/2006. Ele manteve em quase tudo as diretrizes “neoliberais” do período anterior ao seu: política monetária dura, com autonomia de fato do Banco Central, como se percebe dos juros altos, pois ele não desejava apertar demais a política fiscal, promovendo cortes profundos nas despesas públicas.
          Os “insaciáveis” banqueiros nunca ganharam tanto dinheiro como então, pois ele não só fez uso da herança, como a levou a extremos, sobretudo no lado monetário. Ninguém foi tão neoliberal como ele, companheiro. Ele pode agora esbravejar contra o neoliberalismo, sem se preocupar com coerência. Seja dito, porém, em seu favor que coerência pode ser apenas outro nome para teimosia, recusa de ver a realidade.
Atribuo a dois fatores seu posicionamento: à influência de Delfim Neto, a quem ele ouvia, apesar de outrora ter sido, esse ministro de governos militares, a encarnação do próprio neoliberalismo. Também ponho sua atitude na conta de sua intuição política. Ele percebeu que desarrumar a economia, na ocasião no rumo certo, era risco político imenso. Imaginem se, no momento do estouro do escândalo do mensalão, a inflação estivesse fora de controle e a economia no chão. A queda era certa, como a do outro, das Alagoas.
          Por que estou falando disso agora? Porque a situação com a administração de Dilma é bem diferente e perigosa. Ela, nas folgas das lutas armadas pela libertação dos pobres e oprimidos, frequentou algumas aulas de economia e acabou se bacharelando. Tal feito, a levou a acreditar na própria capacidade de fazer outra revolução, na teoria econômica pequeno-burguesa. Assumiu a Presidência e decidiu dar provas da possibilidade de se ter ao mesmo tempo expansão de gastos governamentais, em vez de corte, e juros baixos. Para chegar a esse paraíso, tirou a autonomia do Banco Central e mandou expandir o crédito fácil para o consumo das famílias.
          O resultado negativo começa a aparecer com o estouro da meta de inflação Para agravar as expectativas pessimistas dos agentes econômicos ela, como um personagem de Nélson Rodrigues, ergueu a fronte, se adiantou no palco, tropeçou na língua de Camões e quase cai no poço da orquestra (ainda existe isso?) e disse: Não adotarei políticas que mirem o PIB, em nome do combate à inflação. Ora bolas, nenhum governante, nenhum, repito, quer, só de mal, impedir o crescimento “deste país”. É patologia imaginária. Por que razão o faria, se precisa dos votos dos cidadãos? A história é outra.
          O déficit exige fontes de financiamento. Estas são formadas pelos tomadores de títulos emitidos pelo governo. Eles compram os papéis mediante a promessa de um rendimento segundo determinada taxa de juros, que é o preço de usar o dinheiro de terceiros. A taxa será mais altas quanto maior o déficit. Portanto, juros altos resultam de mau comportamento do setor público e tentar baixá-los artificialmente, como Dilma fez, é inútil. É como tentar tabelar qualquer outro preço: não funciona ou, se o controle for efetivo, provoca efeitos colaterais, neste caso pressões inflacionárias. O aumento de juros tem o indesejado e inevitável efeito, ao frear a inflação, de diminuir a atividade econômica. Não é questão de intenção de derrubar o PIB.
          Mas, eu falava mais acima sobre como a situação agora é mais perigosa. Lula percebeu o perigo. Delegou a gente qualificada a condução da economia, com carta branca para adotar o “neoliberalismo”. Com Dilma é diferente, não sabendo nada e achando que sabe tudo, decidiu que ela mesma seria a ministra da Fazenda e a presidente do Banco Central, com as consequências conhecidas.
         A ameaça inflacionária é real. Não existe nunca “só um pouco” de inflação, pois, tudo o mais constante, ela tende a subir. Melhor não atiçar o dragão. Como o leão da canção de Roberto Carlos, ele também já está solto nas ruas.

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