Greve nas federais

Jornal O Estado do Maranhão 
O professor José Henrique Vilhena, reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, em entrevista recente à Veja, afirma que “existe uma doença que ataca a graduação das universidades, o corporativismo”. Nasce daí um permanente estado de greve que impede a aprovação de qualquer proposta de mudança para melhorar o ensino, apesar do gasto da sociedade brasileira, de bilhões de reais por ano, com essas instituições.
 Agora, 440.000 de seus alunos estão ameaçados de perder o vestibular e um semestre de estudos, com prejuízo imediato de oportunidades de trabalho, por causa de uma greve de dois meses. Os grevistas pedem um aumento de 75% e a incorporação de gratificações aos vencimentos. No caso dos professores, a Gratificação por Estímulo à Docência – GED.
Sem levar em conta a curiosidade de pagar-se alguém para fazer algo para o que já é contratado, através de concurso público, pode-se ver a GED como parte de um sistema de estímulo à produtividade. Quem se esforçar e produzir mais, ganhará mais. A incorporação seria a eliminação de uma das possibilidades de avaliação do trabalho do docente, e teria impactos multiplicados na folha de pagamento.
Pedir 75% de aumento, no atual ambiente econômico-financeiro do país, é achar que o governo ainda conta com o imposto inflacionário para cobrir despesas extraordinárias, o que, felizmente, não ocorre mais. É acreditar na teoria conspiratória da história. Neste caso, ela afirma a existência de um plano do governo, de não dar aumento para os professores, para “sucatear” as universidades públicas, sob as ordens do FMI. Coisas do neoliberalismo e da globalização.
Tenho a impressão de que a verdadeira motivação para a posição dos grevistas quanto à GED é a recusa a qualquer sistema de avaliação. O mesmo ocorreu com o provão. Mas, como o governo não fechou os cursos de notas ruins, a resistência diminuiu. Avaliar defeitos, e também méritos, nos campi, é visto como autoritarismo. Isso em um ambiente no qual se critica descuidada e permanentemente e, portanto, avalia-se, tudo e todos, o tempo todo. Só não vale criticar esses críticos. Avaliação é ótima idéia, para os outros lá fora.
O reitor da UFRJ não falou sobre outra doença universitária, a democratite aguda, de fácil diagnóstico, mas difícil cura. Como o sufixo indica, essa enfermidade é uma inflamação da democracia, provocada por um agente patológico bastante conhecido, o aedis discursorum Brasilis. O sintoma principal é a criação de conselhos e a convocação de assembléias para tudo e para nada, de tal forma que todo mundo discute, finge participar e ninguém assume responsabilidade por coisa alguma, em um triste assembleísmo paralisante.
É parte dessa confusão o sistema de escolha dos reitores e seus auxiliares, por eleição direta, que muito mais prejuízos do que benefícios trouxe ao ensino. Na maioria das vezes, com as exceções de sempre, o eleito é o mais simpático, não cobra nem exige o cumprimento de obrigações, é “legal”, dá boas notas, tem habilidade política ou é do partido tal e tal. O prejudicial não é a politização, mas a partidarização.
No entanto, em instituições destinadas à produção de conhecimentos, o poder deveria estar com o saber. Suas regras de funcionamento não deveriam ser uma cópia daquelas da prática política tão severamente criticada pelo próprio mundo universitário. Os mecanismos de funcionamento da política não servem necessariamente para a vida acadêmica, como a realidade tem demonstrado.
Sem a busca de alternativas de financiamento para suas pesquisas, sem o pagamento do custo dos estudos por aqueles que podem pagar, para que os que não podem possam estudar de graça, sem uma reforma na administração, no ensino, na pesquisa e na mentalidade, as universidades federais não poderão melhorar os baixíssimos salários dos professores, dar uma boa formação aos alunos nem produzir os conhecimentos de que o país tanto necessita para melhorar a qualidade vida de seu povo.

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