Reforma política

Jornal O Estado do Maranhão 
Uma das melhores coisas destas eleições, não foi as próprias eleições, mas a rapidez de sua apuração.
Não teríamos motivos de comemoração, se avaliássemos o pleito pelo analfabetismo arrogante de vários candidatos e suas promessas de realização impossível; pela nova fraude do voto migrante, pela qual eleitores, em número capaz de influenciar no resultado da disputa, têm seus títulos transferidos para municípios onde não moram, com o fim de aumentar a votação dos autores do golpe; pela balbúrdia partidária, incentivada pela legislação, permissiva nos assuntos importantes, como o da fidelidade ao partido, e restritiva nos pequenos, numa tentativa inútil de regulação exaustiva da realidade socio-política do Brasil; e pela chatice do programa gratuito de propaganda política.
Todavia, progressos já ocorreram no combate à corrupção, em comparação com o tempo em que inexistiam urnas eletrônicas. Alguns dos problemas de hoje estão mais ligados à cultura política da sociedade do que à tecnologia de realização dos pleitos, não sendo isso uma característica exclusivamente brasileira.
As novas gerações, familiarizadas com a informática, presente em todo lugar e em tudo atualmente, embora às vezes nem se possa percebê-la, não pode sequer fazer uma idéia de como se votava e se faziam as apurações na época das cédulas de papel. Nos anos cinqüenta do século passado, o candidato dispunha de ampla liberdade de imprimi-las, com seu nome (não havia números) e cargo cobiçado. No dia da votação, o chefe político as distribuía a seus eleitores.  Sendo a maioria destes do interior, aqui no Maranhão e em outras regiões pobres e rurais do Nordeste do Brasil, eram muitas vezes confinados em ambientes semelhantes a currais, de onde somente saíam a fim de colocar as cédulas nas pesadas urnas de madeira, difíceis, até, de serem transportadas, conforme me lembra Benedito Buzar. Quem tivesse maior capacidade de arrebanhar – o termo certo é esse, arrebanhar – eleitores acabava vencedor. Era um sistema podre, pois, em detrimento do jogo limpo, privilegiava a força econômica. Era aberto a todo tipo de falcatrua e, portanto, a disputas arbitradas por uma justiça raramente independente.
A totalização durava o tempo necessário à produção de resultados falsos. Era muito comum ouvir-se dizer, ao longo da apuração, que os “redutos”, localidades onde supostamente um possível derrotado era muito popular, ainda não estavam contados, para justificar a escassez de votos de alguns aspirantes a um mandato político.
Evoluímos com a adoção da cédula padronizada, mas ainda de papel, e posteriormente, da urna eletrônica, que permite a soma informatizada, rápida, difícil de ser fraudada e sujeita a mínimas falhas. O interesse de vários países pela nossa tecnologia nesse campo é grande, sinal de sua confiabilidade.
Esses aperfeiçoamentos, porém, ocorreram no ambiente de eleições proporcionais como o nosso em que o voto é da legenda, e não do postulante a um mandato, forma de escolha, hoje em desuso no mundo inteiro, para cargos do poder legislativo, porque cria uma séria distorção na representação parlamentar: candidatos com votação pequena se elegem em detrimento de outros bem votados. Se algum dia o sistema teve alguma justificativa, agora há um consenso sobre seu potencial em distorcer a representação e a vontade populares.
O estabelecimento do voto distrital, misto ou puro, e a criação de legislação que iniba a anarquia dos partidos e os fortaleça são mudanças importantes de aperfeiçoamento político do país. Entre as reformas tão reclamadas pela sociedade brasileira, essa, de cunho político, é a mais importante. Sem ela, não será possível implementar as outras, que as têm como precondição.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Vida kafkiana

Lira de um anjo

Tiro nos pés, cabeça, tronco e membros