Promessas

Jornal O Estado do Maranhão
Quando se pensa na eleição do presidente da Câmara dos Deputados, cargo que pode eventualmente levar seu ocupante a substituir o presidente da República nos impedimentos deste e do vice-presidente, é natural imaginar que os candidatos, por ocasião do pleito, se preocupem prioritariamente com as questões político-institucionais relevantes para o país e para o povo brasileiro. Mas, não se vê nada disso na atual campanha ou, pelo menos, não é essa a impressão que se tem.
Tem-se outra impressão: o futuro presidente, seja ele quem for entre os que têm chance de se eleger, pretende administrar a Câmara apenas no interesse particular dos parlamentares-eleitores, cujas aspirações, em grande parte, ganham expressão nas promessas magnânimas dos aspirantes ao cargo, em número de quatro.
Apareceu um sequer entre eles com propostas, por exemplo, de disciplinamento efetivo do uso de Medidas Provisórias, de triste fama pelos problemas criados ao funcionamento da Casa, devido ao uso imoderado que delas faz o Poder Executivo, muitas vezes trancando a pauta de votação dos assuntos realmente importantes? Alguém pensou em mecanismos que possam tornar mais rápida, sem prejuízo da discussão informada e ponderada, o exame de projetos de lei dos próprios deputados, evitando sua tramitação interminável? Falaram em reforma político-partidária? Não, certamente.
O tema relevante, a julgar pela campanha, é o aumento da remuneração dos deputados, prometido por quase todos os concorrentes. Digo remuneração porque se trata, além dos salários, aumentados, por sinal, em mais de 50% dois anos atrás, de outras vantagens. De acordo com as promessas, os salários seriam de R$ 19 mil, não chegando a mais porque esse valor é o teto do funcionalismo público. Um candidato já chegou, até, a sugerir a desconsideração desse limite, com sua proposta de R$ 21 mil. A chamada verba de gabinete, utilizada na contratação de pessoal, hoje de R$ 35 mil, poderá ser elevada a R$ 45 mil.
Uma das mais curiosas características dessa eleição está na excursão dos candidatos aos Estados, com o fim de pedir votos. O mais desatento observador da cena política nacional imaginaria que seria muito mais fácil pedi-los em Brasília mesmo, se se considera que quase todos os votantes ali se reúnem com uma certa freqüência. Em lugar de pagar jatinhos ou pegar jatões de nossas debilitadas companhias aéreas, seria muito mais barato ficar no Planalto Central e esperar lá os eleitores em vez de viajar às famosas bases estaduais, certamente em busca do apoio das lideranças políticas locais, supostamente capazes de pressionar os deputados. As despesas dos postulantes em conjunto chegarão a mais de R$ 1 milhão.
Veja bem, caro leitor, eleitor também, mas do tipo comum, que a reação contrária de grande parte da sociedade não é exclusivamente à idéia de elevação do pagamento dos nobres deputados. Pouca gente é contra a necessidade de eles ganharem bem, seja lá como se defina esse “bem”. Ninguém gosta é da concessão do aumento – generoso, como não podem deixar de ser todos os aumentos originados em autoconcessão –, quando o resto do funcionalismo público, especialmente do Executivo enfrenta lenta, mas constante, deterioração do poder de compra de sua remuneração, sem reajuste ou com reajuste mínimo ante a inflação acumulada ano após ano. Todos rejeitam, igualmente, a clara prevalência do espírito corporativo, em uma instituição que deveria ser a primeira a combatê-la, porquanto faz leis, iguais para todos em princípio. (O Judiciário tem defendido com sucesso, justa ou injustamente, suas vantagens).
Quem acredita que desse processo resultará uma mesa diretora da Câmara dos Deputados sintonizada com a necessidade de resolução dos grandes problemas do Brasil?

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