Passo adiante

Jornal O Estado do Maranhão
Tenho feito diversas referências aqui à inflação que feriu nossa sociedade durante anos. A cura tardia dessa doença econômica trouxe dias melhores a milhares de brasileiros. Antes, porém, por falta de defesa contra ela e diferentemente dos ricos, capazes de defenderem-se, os pobres viam seus minúsculos rendimentos desmancharem-se rapidamente no ar, semelhantemente à dissolução, pelo capitalismo, de valores morais e espirituais, apontada pelos jovens Marx e Engels: “Dissolvem-se todas as relações sociais antigas e cristalizadas, com seu cortejo de concepções e de idéias secularmente veneradas”.
A verdade, contudo, é esta: há muita coisa a ser feita ainda, apesar do muito que já se fez. O fim da desordem no sistema de preços representou, claro, a eliminação do imposto inflacionário, fonte graciosa, para os governos, do financiamento da farra de gastos de então, com as conseqüências desastrosas bem conhecidas. Ora, em um ambiente econômico não-inflacionário, como o prevalecente no país a partir de 1994, o banimento desse tributo perverso não foi compensado por um sistema tributário que incentivasse a formação de poupança no Brasil e criasse, por conseqüência, a possibilidade do equilíbrio orçamentário do governo pelo financiamento interno. Em outras palavras, uma reforma profunda, exigida pelas novas circunstâncias não foi feita. Resultado: a fim de equilibrar suas contas, o governo passou a recorrer cada vez mais ao endividamento externo.
A proposta ora em discussão no Senado propõe prorrogar até 2007 o injusto imposto chamado CPMF bem como a Desvinculação das Receitas da União que permitirá ao governo federal utilizar em outras áreas parte das atuais vinculações orçamentárias da saúde e da educação; unificar a legislação do ICMS e reduzir o número de suas alíquotas a 5, acabando, na prática, com a guerra fiscal entre os Estados; manter tanto os fundos de desenvolvimento regional, adicionando-lhes, porém, um percentual do Orçamento Geral da União, quanto o Fundo de Compensação das Exportações, da forma como foi aprovado na Câmara dos Deputados.
Curiosamente, o texto do relator da reforma fixa o ano de 2007 como de revisão das novas regras, não se sabendo bem por que se deva fazer algo, hoje, com a prévia intenção de reformulá-lo amanhã. Não seria melhor construir alguma coisa mais sólida, que não desmanchasse facilmente?
Muito pouco das mudanças torna as atuais regras mais justas ou mais simples. O setor financeiro, por exemplo, capaz de auferir lucros enormes enquanto os demais setores sofrem profunda recessão, continuará pagando pouco em impostos. Uma sugestão do Ministério da Fazenda, anteriormente aprovada pela Câmara, foi rejeitada pelo relator. Ela previa a incidência sobre o os ganhos dos bancos da maior alíquota da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido. A simplificação do ICMS será superficial, confirmando a pecha de nossa máquina de arrecadação de ser um dos mais complicados do mundo, com suas exigências burocráticas irracionais e infernais. (Não digo satânicas para não ser também exorcizado pelos que costumam exorcizar Satanás eletronicamente pela televisão).
O professor José Cezar Castanhar, da Fundação Getúlio Vargas, observou o seguinte, ao comentar os resultados de um estudo do Banco Mundial, que nos aponta como um dos países onde há mais barreiras à abertura ou liquidação de empresas: “No Brasil, as exigências burocráticas são empecilhos à atividade empresarial. A dificuldade para abrir uma empresa, a carga tributária elevada e a rigidez das regras trabalhistas sã desestímulos que acabam levando a uma maior informalidade”.
O estudo mostra que a simplificação de procedimentos e a justiça tributária não são apenas questões de racionalidade administrativa ou de eqüidade social. São também, ou principalmente, exigências econômicas. Elas tornam a economia mais eficiente e ajudam a criar empregos e combater a pobreza e a corrupção endêmicas.
Uma reforma nessa linha é o passo adiante a ser dado.

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