13 de novembro de 2005

Gato por Lebre

Jornal O Estado do Maranhão 
Nos velhos tempos, o Partido dos Trabalhadores desejava ser diferente. Ele teria virtudes ausentes nos outros e estes teriam defeitos dos quais ele não padeceria. E assim se passaram 25 anos. Durante esse tempo se ouvia sobre os seus adversários a acusação de que eram corruptos e não faziam o necessário para tirar o povo da miséria porque lhes faltava “vontade política”, não uma vontade qualquer, como a insinuar nos partidos “burgueses” a existência de outra, a de desviar dinheiro público, e como se a resolução dos problemas nacionais dependesse só dessa vontade.
Para quem se dizia socialista ou marxista achar que apenas tal predicado dos dirigentes resolve os problemas de um país revela um idealismo filosófico – idealismo não no sentido comum referente a pessoas desprendidas, indiferentes à riqueza e de nobres ideais, pois já se sabe não ser esse o caso dos petistas – muito distante das teses materialistas nas quais a sociologia desse pessoal supostamente se funda. Falo do idealismo que atribui primazia às idéias e não à realidade, na sua explicação das ações humanas.
Aliás, esse idealismo coloca em dúvida a possibilidade de conhecimento da própria realidade, servindo tal idéia, parece, à esperança de certo grupo do PT de nunca se conhecer a origem do dinheiro usado na compra de alguns deputados, operação executada pelo tesoureiro do partido, em benefício da aprovação de projetos de interesse do governo Lula, e apelidada de mensalão pelo ex-deputado Roberto Jefferson.
Seja como for – idealista ou realista – o PT sempre repeliu qualquer identificação moral com o resto da turma e disso se orgulhava. A estrela vermelha na lapela dos militantes era uma forma de afirmar a diferença, de anunciar uma nova sociedade, um admirável mundo novo, quando afinal o poder fosse alcançado, como principiava a acontecer, pela conquista de várias prefeituras ricas de São Paulo e de diversos Estados. Aí veio a conquista do poder federal.
A nova administração petista adotou de forma correta, mas contrariando expectativa de seus próprios simpatizantes, a rígida disciplina fiscal e monetária da política econômica anterior, antes execrada como neoliberal. Pelo menos acertou em alguma coisa, pois quem estuda história econômica nunca viu a irresponsabilidade nesse campo produzir alguma coisa que não altas taxas de inflação, prejudicial em especial aos pobres. No entanto, gente da própria administração, a ministra da Casa Civil Dilma Rousseff, ataca a política econômica, único e importante sucesso do governo até agora.
Na área social, onde todos, até seus adversários, esperavam bons resultados, o fracasso do Fome Zero, anunciado como redentor dos pobres do Brasil, exemplifica muito bem a decepção dos brasileiros. Se continua a existir, ninguém sabe a quantas anda. A fome de que falava era outra.
Por fim veio o mensalão. Considerando a história do PT não importa a origem do dinheiro, embora não seja assim do ponto de vista criminal na hipótese de a fonte do dinheiro mensaleiro ser pública. Importa que se tornou igual aos outros, status, por sinal, reclamado hoje pelos seus filiados. “Nós cometemos crimes, mas vocês também o fizeram”. Antes, queriam ser diferentes, agora, iguais. Conseguiram.
Está aí a razão principal das insistentes críticas ao lulo-petismo, o comportamento de camaleão. Não se condena apenas o terem feito como a maioria. O PT tem razão em dizer que muitos fazem. Nem se trata de implicância ideológica ou moralismo pequeno-burguês, para usar o jargão esquerdista. Se ao menos usassem meios ilícitos em favor do bem público muitos estariam dispostos a fechar os olhos e conceder ao partido o benefício da dúvida. O fato é que ninguém gosta de comprar gato por lebre. Ou de ver alguém comprando.

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