18 de abril de 2004

Encantamentos

Jornal O Estado do Maranhão 
Havia encantamentos na terça-feira passada, dia 13 de abril, no Armazém da Estrela, à rua da Estrela no centro histórico de São Luís. Um deles eram as brincadeiras, as folias, as festas, os brinquedos, enfim, do Maranhão. Todos têm um encanto misterioso em suas próprias existências ou nas dos livros, como este em que foram retratados – dizer retratados é dizer melhor do que dizer fotografadas, porque é ir além da máquina fotográfica, mero instrumento para o registro da visão do artista – por Albani Ramos em Brinquedos encantados lançado entre as maiores estrelas do mundo cultural maranhense, com prefácio de José Sarney.
O outro encantamento era o livro, pela beleza de suas imagens, que revelam a sensibilidade do autor para as manifestações populares de nossa cultura, e pelo cuidado de edição e bom-gosto de concepção e execução. Essa característica encantatória permite que se possa imaginar esse trabalho, creio eu, como realizado, intencionalmente ou não, por meio da utilização de uma meta linguagem, pois se trata de um encantamento, o livro, falando de encantamento também, os brinquedos do povo.
Albani nos dá uma síntese visual da cultura popular do Maranhão em sete grandes áreas ou temas: Ciclo Natalino, Carnaval, São Bilibeu, Divino Espírito Santo, Bumba-meu-boi, Festas, e Culto Afro. Cada uma delas tem um texto introdutório do membro da Academia Maranhense de Letras, o escritor Sebastião Moreira Duarte. Muito apropriadamente, ele, na apresentação geral, diz que “fundamos aqui uma Província das Festas, de uma ponta a outra do calendário”, afirmação confirmada pelo Calendário das Festas, feito pelo autor, em que se vê que, de janeiro a dezembro, não há uma única semana sem uma festa popular por estas bandas.
Afora o prazer estético proporcionado por suas imagens em cores fortes e pela ênfase no movimento, em que o elemento africano negro, tão forte na nossa formação humana e social, aparece tão nitidamente, Os brinquedos encantados desempenham uma função importante, a de registro histórico e sociológico. A dinâmica cultural, com o ciclo de nascimento, vida e morte de suas manifestações, únicas em cada sociedade, mas inevitavelmente envolvidas em constantes universais reveladoras dos elementos comuns a todos os humanos, seres que se distinguem dos outros pela capacidade de construir conscientemente sua cultura, a dinâmica cultural, eu dizia, leva ao incessante desaparecimento de alguns de seus próprios modos de expressão e ao nascimento de outros ou a sua adaptação a novas circunstâncias.
Trabalhos desta natureza, com tal diversidade de registro, amplitude de cobertura, cuidado de sistematização e consistência de enfoque são inexistentes em nosso meio. Este de Albani compõe agora, e mais irá compor no futuro, um bom alicerce de ajuda aos sociólogos e aos historiadores de nossa cultura no estudo de nossa sociedade. Mas, enquanto a posteridade não chega (de qualquer maneira nós não estaremos presentes a ela) poderemos ter o privilégio de tê-lo em nossas mãos para com ele nos conhecermos melhor como um povo orgulhoso de suas tradições.
A publicação de Brinquedos encantados é o resultado de um trabalho meritório em favor da cultura maranhense, que vem sendo desenvolvido pelo Instituto GEIA, sob a direção do economista Jorge Murad. Mobilizando o apoio de um grupo de empresas localizadas no Maranhão e outras entidades, ele dá continuidade ao trabalho iniciado no governo Roseana Sarney com a publicação da coleção Maranhão Sempre, de trabalhos importantes da historiografia do Maranhão e de obras dos mais aclamados poetas maranhenses contemporâneos. A Coleção Geia de Temas Maranhenses, que agora publica seu terceiro volume, deu a público anteriormente O Maranhão Histórico, de Ribeiro do Amaral, e Administrações Maranhenses 1822-1929, de Henrique Costa Fernandes. Em algumas semanas, o quarto livro da série, A revolta de Bequimão, do historiador Mílson Coutinho, se juntará aos outros três.
Por enquanto, é ter olhos para ver os encantamentos dos brinquedos.

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