11 de janeiro de 2009

O Acordo Ortográfico II

Jornal O Estado do Maranhão

Como dito na Nota Explicativa do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, ao se analisar o conteúdo dos acordos anteriores, de 1945 e 1986, vê-se que seu objetivo era a imposição de uma unificação ortográfica absoluta ou quase. O de 1986 deveria obter tal resultado em 99,5% do vocabulário geral da língua. Sua principal proposta era de simplificação radical no sistema de acentuação gráfica, com a eliminação dos acentos nas palavras proparoxítonas e paroxítonas. Foi rejeitada pela opinião pública portuguesa.
O de 1945 pretendia chegar a 100%. Os brasileiros recusaram-no porque, ao propor a manutenção das consoantes mudas ou não articuladas, ele promoveria a restauração dessas letras no Brasil, onde havia muito tinham sido eliminadas. Tentava também resolver a divergência de acentuação das vogais tônicas e e o, seguidas das consoantes nasais m e n, das palavras proparoxítonas, pela adoção da norma portuguesa. Exemplo: Antônio, no Brasil, e António, em Portugal. O timbre do o, fechado no Brasil e aberto em Portugal (por isso o circunflexo num caso e o acento agudo no outro), passaria a ser grafado, aqui e lá, somente com o acento agudo (António), sob o argumento de que ele assinalaria tão-só a tonicidade e não o timbre da vogal. Manteve-se agora a dupla grafia: Antônio para nós e António para os lusitanos. Aliás, por que não se deveria adotar duplas grafias no âmbito da lusofonia, se elas são adotadas no Brasil, como no caso de sinóptico e sinótico e de diversas outras palavras? Prevaleceu o bom senso e a fonética que é o princípio orientador da reforma. Cerca de 98% do vocabulário está unificado. O ótimo, como se sabe, é inimigo do bom.
Uma das críticas mais frequentes (sem trema) ao Acordo diz respeito ao uso do hífen, em decorrência de um dispositivo que deixa ao usuário da língua espaço à subjetividade. Contudo, as regras, embora não sejam ainda ideais, são certamente mais simples do que as anteriores. Não há problemas no caso de composição por prefixação. A eliminação do hífen é a norma geral, excetuados os poucos casos explicitados no Acordo. Nos compostos, locuções e encadeamento vocabulares abrem-se pouquíssimas exceções para as ocorrências de uso do hífen já consagradas pelo uso (cor-de-rosa). Todavia, logo no primeiro item da Base IV, Observações, admite-se a grafia aglutinada de certos compostos “em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição [...]”. São dados, então, alguns exemplos, entre eles paraquedas (antes pára-quedas). Alguns falantes terão perdido a noção de composição nesse caso. Outros, como eu, não. Só a divulgação do Vocabulário Ortográfica da Língua Portuguesa poderá sanar as dúvidas.
Escritores são contra e a favor. Em Portugal, Saramago gostaria que o Acordo não existisse, mas quer sua adoção, em cumprimento da palavra empenhada pelo governo português. Vasco da Graça Moura é inimigo radical. No Brasil, há detratores e defensores. Em Angola, Agualusa é a favor. Mia Couto, em Moçambique, é contra.
Entre nós, uma resolução do Fundo Nacional de Educação autorizou a adequação ao Acordo das obras do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio e do Programa Nacional Biblioteca da Escola. As editoras de livros didáticos deverão fornecer obras adaptadas em 2009. Os alunos do ensino fundamental as receberão em 2010 e os do ensino médio em 2011 Em 2012 vestibulares, concursos e avaliações em geral terão de se adaptar às novas regras.
Vejo o Acordo como benéfico para o português. A existência de duas grafias oficiais tem sido prejudicial ao prestígio de nossa língua no mundo. Abrem-se perspectivas de maior intercâmbio cultural entre os países lusófonos, que têm 240 milhões de falantes, pela mais fácil circulação entre eles de textos escritos em todos.

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