Colégio de Obama

Jornal O Estado do Maranhão

Os Estados Unidos da América, ou simplesmente América, como os americanos gostam de se referir ao próprio país, são realmente um país extraordinário. Eles têm incrível capacidade de se reno-var, de se refundar. Há somente pouco mais de vinte anos, quando tive a oportunidade de concluir lá os cursos de mestrado e doutorado em economia, depois de uma temporada de cinco anos ininterruptos, não ocorria a ninguém a idéia de um negro ser eleito presidente da República. No entanto, Barak Obama, negro e filho de emigrante do Quênia, tendo vivido também na Indonésia, país de maioria muçulmana, agora é o presidente eleito da nação mais poderosa do mundo.
Grande já era, por ocasião de minha estada naquele país, o progresso dos direitos civis da população negra. No governo do presidente Lyndon Johnson, em 1964, com a promulgação do Civil Rights Act, Lei dos Direitos Civis, mudou-se a vergonhosa situação anterior. A Suprema Corte dos Estados Unidos, por exemplo, desde 1896, havia dado liberdade aos estados para impor legislação segregacionista e eles as impunham. Houve época em que os negros eram obrigados, por lei, a andar na parte de trás dos ônibus, deixando a da frente à disposição dos brancos. Nada indicava que hoje, meros 25 anos depois de minha volta para o Brasil, seria possível acontecer o que aconteceu na última terça-feira, com a eleição de Obama. A América merece a admiração do mundo, até dos esquerdistas primários, especialistas em “fazer uma colocação” contra o demônio ianque.
Perguntam-me leitores como surgiu o Colégio Eleitoral, que tem a função de eleger o presidente. Com o fim de responder, é preciso ir à história americana. As 13 colônias da costa leste da América do Norte conquistaram independência da Inglaterra em 1776. Exceto pelos Artigos da Confederação, tão-só um esboço de constituição, em vigor a partir de 1781, cinco anos, portanto, depois da separação da Inglaterra, nada havia que as unisse institucionalmente. Além disso, elas retificaram a Constituição em vigor até hoje apenas em 1789, ano da revolução Francesa e 13 anos após a independência. Este período testemunhou a existência de um Congresso fraco, como a única autoridade comum, a ausência de um Poder Executivo federal e outras dificuldades com origem no desejo de autonomia das ex-colônias. Havia tensão entre as aspirações autonômicas delas e a necessidade de um governo central com um mínimo de força capaz de mobilizar os recursos da nova nação para a adoção de medidas de interesse de todos.
No modelo adotado com o advento da Constituição, implantada sob influência dos federalistas Alexandre Hamilton, James Madison e John Jay, o presidente da nova república deveria ser eleito por um colegiado ao qual os estados enviariam representantes, eleitos, estes sim, diretamente pelo povo. Tratava-se de consolidar a federação, através da criação de um executivo federal forte, e, ao mesmo tempo, manter a autonomia dos membros. Estes, não o conjunto da população do entes federados, elegeriam o presidente, através de delegados.
O sistema não causaria divergência entre o resultado obtido pela soma dos votos populares de todo o país e o resultado do colégio eleitoral se não tivesse prevalecido ao longo do tempo a regra de o candidato a presidente ficar com todos os delegados onde ele obtiver a maioria dos votos populares, mesmo que por apenas um voto (sistema winner-take-all, o vencedor leva tudo). A alternativa seria uma divisão dos delegados, proporcional ao número de votos de cada candidato nos estados. Mas, nesse casso, o povo elegeria diretamente o presidente, contrariando o princípio da eleição pelos membros federados, que permitiu a criação da União ou, mais propriamente, dos Estados Unidos da América.
Essa, a história.

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