1 de novembro de 2009

Assim, não Vale



Jornal O Estado do Maranhão, 1/11/2009

O pessoal do PT não estava brincando quando falou em reestatizar a Vale. É um posicionamento  explicável, mas não justificável, porque, caso tal besteira prevalecesse, estaríamos frente à criação de milhares de boquinhas em forma de cargos estatais a serem colocados nas mãos – em verdade, também nos bolsos e nas contas bancárias – dos companheiros do partido. Como, aliás, já se comprovou repetidas vezes pelo já realizado em outras estatais, agências reguladoras e assemelhadas.
Pois agora é o próprio presidente da República quem resolve agir como se a Vale continuasse a ser empresa do governo. Lula decidiu, num acesso de chavismo que, tenho esperança, será temporário, ditar estratégias e táticas empresariais e escolher as áreas em que a empresa deveria investir. Sugeriu, por exemplo, que a Vale deveria fazê-lo em siderurgia, com certeza respaldado em detalhados e sofisticados estudos de mercado. Ora, tal linha de ação empresarial levaria a uma ilógica concorrência da empresa com seus atuais clientes, que dela compram minério de ferro. Também, a Vale passaria a atuar num ramo cuja tecnologia, expertise gerencial e outros fatores estratégicos ela não domina e cuja aquisição demanda tempo e gastos adicionais.
Há mais, porém. Como o bê-á-bá da economia nos alerta, investimentos já realizados, neste caso na exploração do minério de ferro, não se transferem, total ou parcialmente, com facilidade ou em prazo curto, de um setor a outro. Isso requer um tempo longo o suficiente para permitir a conversão dos ativos atualmente utilizados na exploração do minério (máquinas e equipamentos, em especial) em ativos adequados à área siderúrgica. Inversões novas nesta exigiriam recursos adicionais não disponíveis de imediato. Ou será que os economistas de araque pensam nos recursos da Vale como infinitos? Em termos práticos, atender ao pedido de Lula seria como criar uma nova e gigantesca empresa, com prazo dilatado de maturação. Mas, qual palpiteiro se importa com isso se os recursos dele não entram no jogo?
Por ironia, os gastos em programas do governo andam claudicantes e são mal feitos, com cronogramas atrasados e denúncias de má aplicação de recursos. De quem, a culpa? Responde o governo: do Tribunal de Contas da União e do Ibama. Este porque supostamente faz exigências ambientais descabidas, aquele porque exageraria na fiscalização. Os dois se tornaram os vilões dessa história. A incompetência gerencial pública, não.
Alegam os estatizantes que a Vale foi construída com dinheiro do povo e, assim sendo, deveria voltar a seu controle. Confundem, com essa pobre visão, uns de boa, outros de péssima fé, burocracia estatal com povo e se esquecem de que a empresa, depois de privatizada, multiplicou empregos, receitas, lucros e impostos para as já abarrotadas burras governamentais em quantia muito mais elevada do que a dos parcos dividendos pagos antes por ela ao erário, como estatal.
O que a trajetória estatizante no Brasil e no resto do mundo torna evidente, senão a apropriação por uma elite burocrática, politicamente escolhida, arrogante e sem conexão necessária com a competência profissional, do controle de empresas estatais, em seu benefício? É tocante, até, ver pessoas, em geral jovens, bradando em passeatas contra a privatização e defendendo, na prática, privilégios desse tipo, sob a ilusão de defenderem "o povo" e não os tecnocratas. O Brasil não precisa de reestatização, com a imensa e inevitável procissão de novas oportunidades de corrupção – lembremos que o setor público já consome quase 40% do nosso Produto Interno Bruto. Precisa, sim, de mais  capitalismo e privatização. Da Petrobras, por exemplo, sempre usada eleitoralmente, como todas as estatais seriam e são.
O preço do estatismo selvagem e interessado, feito com um olho em cargos da burocracia do governo, é a ineficiência econômica e, por conseguinte, o desperdício de recursos escassos, mas tão necessários a um país que precisa acelerar de verdade seu crescimento, para não empacar.
Assim, não vale.

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