Lucy (dez)
Jornal O Estado do Maranhão
E para onde vão esses pés, essa fronte,
livres do óleo que fervia nas tardes?
Eles vão para tudo.
Lucy Teixeira
Elegia Fundamental
livres do óleo que fervia nas tardes?
Eles vão para tudo.
Lucy Teixeira
Elegia Fundamental
Ela possuía a lucidez e a lucidez possui o seu nome: Luci. Lucy Teixeira, a quem conheci em 1998 e com quem, apesar da diferença de idade, fiz uma grande amizade. Lucidez que a acompanhou até o instante de começar a padecer, sem nenhuma necessidade e a despeito dos esforços para protegê-la da amiga que lhe assistia em todos os momentos.
Poetisa, romancista, contista, cronista, crítica literária, ensaísta, teatróloga, artista plástica, agitadora cultural, Lucy marcou a cultura maranhense do século XX como uma de suas figuras mais significativas. Se a sua produção não é conhecida como deveria em nosso país, a razão está unicamente em ter ela morado muitos anos na Europa, a serviço do Ministério das Relações Exteriores.
Conviveu, em Minas Gerais, com grandes nomes da literatura nacional, companheira de estatura intelectual igual à deles: Otto Lara Rezende, Fernando Sabino, Murilo Mendes, Paulo Mendes Campos e o extraordinário contista Murilo Rubião. Na Itália, conheceu Italo Calvino e o poeta Giuseppe Ungaretti, professor entre 1937 e 1942 de Língua e Literatura Italiana na USP. Em São Luís, junto com Ferreira Gular, organizou o Congresso Súbito de Poesia, origem do Grupo Ilha que teve entre seus participantes Bandeira Tribuzzi e José Sarney.
Andou pelo mundo, mas retornou ao Maranhão, atraída pelo chão amado para, definitivamente, nele ficar e fincar sua luz. Quantas vezes, em momentos de desânimo com o provincianismo local, arrependido de ter retornado ao Maranhão, eu ouvi dela, tão experiente em viver no estrangeiro, a observação de nada ser melhor do que estar na própria terra. Nesta, acrescento, se é estrangeiro tão só pela inarredável condição da incomunicabilidade humana. É muito peso, isso. Estar longe das raízes, porém, seria muito mais pesado.
Lucy pertence à linhagem de escritores como Machado de Assis, Murilo Rubião (em alguns dos contos dela, sentimos ecos do mineiro, num tom mais doce e menos angustiado), Franz Kafka, Virginia Woolf e Clarice Lispector. Sua prosa é surpreendente, exata, inovadora, poética, possui certo modo de se apropriar do inverossímil, lembrando um pouco a narrativa kafkiana, e tem grande originalidade e dicção única. Sua leitura acaba por delinear sutilmente, pelo gradual abrandamento do estranhamento inicial, as grandes questões sobre o sentido da vida, as únicas de fato importantes. É moderna no sentido de ter a emoção sob controle, de não se render ao sentimentalismo fácil, à breguice pseudo-lírica, como, aliás, ela vinha pregando desde a juventude. É grande injustiça, derivada de percepção equivocada de sua obra, referir-se a Lucy como expoente da literatura feminina, como tenho ouvido, pois, embora trate da condição da mulher em nossa sociedade (ver Um destino provisório), sua universalidade dispensa tal classificação, que a limita. Demitamos a feminina.
Orgulho-me de ser o único acadêmico recepcionado por ela na Academia Maranhense de Letras e devo-lhe, como já assinalei em outra ocasião, o ter me aventurado no duro ofício de escrever. Durante o preparo para publicação dos originais do seu livro de contos, No tempo dos alamares & outros sortilégios, tarefa de que me encarregou, a mim e à professora Marisa Moreira, como revisora, dizia que eu poderia e deveria escrever, quase me obrigando à árdua, contudo gratificante, empreitada. Na hora de publicar as primeiras crônicas, eu as submetia a sua crítica certeira e benéfica. Depois, iria me cobrar com freqüência a escritura de contos.
Poetisa, romancista, contista, cronista, crítica literária, ensaísta, teatróloga, artista plástica, agitadora cultural, Lucy marcou a cultura maranhense do século XX como uma de suas figuras mais significativas. Se a sua produção não é conhecida como deveria em nosso país, a razão está unicamente em ter ela morado muitos anos na Europa, a serviço do Ministério das Relações Exteriores.
Conviveu, em Minas Gerais, com grandes nomes da literatura nacional, companheira de estatura intelectual igual à deles: Otto Lara Rezende, Fernando Sabino, Murilo Mendes, Paulo Mendes Campos e o extraordinário contista Murilo Rubião. Na Itália, conheceu Italo Calvino e o poeta Giuseppe Ungaretti, professor entre 1937 e 1942 de Língua e Literatura Italiana na USP. Em São Luís, junto com Ferreira Gular, organizou o Congresso Súbito de Poesia, origem do Grupo Ilha que teve entre seus participantes Bandeira Tribuzzi e José Sarney.
Andou pelo mundo, mas retornou ao Maranhão, atraída pelo chão amado para, definitivamente, nele ficar e fincar sua luz. Quantas vezes, em momentos de desânimo com o provincianismo local, arrependido de ter retornado ao Maranhão, eu ouvi dela, tão experiente em viver no estrangeiro, a observação de nada ser melhor do que estar na própria terra. Nesta, acrescento, se é estrangeiro tão só pela inarredável condição da incomunicabilidade humana. É muito peso, isso. Estar longe das raízes, porém, seria muito mais pesado.
Lucy pertence à linhagem de escritores como Machado de Assis, Murilo Rubião (em alguns dos contos dela, sentimos ecos do mineiro, num tom mais doce e menos angustiado), Franz Kafka, Virginia Woolf e Clarice Lispector. Sua prosa é surpreendente, exata, inovadora, poética, possui certo modo de se apropriar do inverossímil, lembrando um pouco a narrativa kafkiana, e tem grande originalidade e dicção única. Sua leitura acaba por delinear sutilmente, pelo gradual abrandamento do estranhamento inicial, as grandes questões sobre o sentido da vida, as únicas de fato importantes. É moderna no sentido de ter a emoção sob controle, de não se render ao sentimentalismo fácil, à breguice pseudo-lírica, como, aliás, ela vinha pregando desde a juventude. É grande injustiça, derivada de percepção equivocada de sua obra, referir-se a Lucy como expoente da literatura feminina, como tenho ouvido, pois, embora trate da condição da mulher em nossa sociedade (ver Um destino provisório), sua universalidade dispensa tal classificação, que a limita. Demitamos a feminina.
Orgulho-me de ser o único acadêmico recepcionado por ela na Academia Maranhense de Letras e devo-lhe, como já assinalei em outra ocasião, o ter me aventurado no duro ofício de escrever. Durante o preparo para publicação dos originais do seu livro de contos, No tempo dos alamares & outros sortilégios, tarefa de que me encarregou, a mim e à professora Marisa Moreira, como revisora, dizia que eu poderia e deveria escrever, quase me obrigando à árdua, contudo gratificante, empreitada. Na hora de publicar as primeiras crônicas, eu as submetia a sua crítica certeira e benéfica. Depois, iria me cobrar com freqüência a escritura de contos.
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