31 de dezembro de 2006

Ano Novo, Ano Velho

Jornal O Estado do Maranhão

Se o final de 2006 servir de indicador de como será 2007, não poderemos ser otimistas no Ano Novo. Dê uma olhada, caro leitor, nos jornais das duas últimas semanas para se convencer disso. Já não falo de acontecimentos lamentáveis como o escândalo da compra de votos no Congresso. Limito-me a casos mais recentes, noticiados pela Folha de S. Paulo, de onde tiro as manchetes.
Comecemos pela crise da aviação civil. “Aeroportos já têm atrasos e filas antes mesmo do Natal”, notícia de um dia depois de o presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) dizer que o feriado seria tranqüilo para os que se arriscassem a viajar de avião. Não foi, sendo necessária a intervenção da polícia a fim de conter a raiva de passageiros frustrados e revoltados com os atrasos. Aliás, o presidente da Anac continua dizendo que não haverá problemas de novo agora. Acredite quem quiser.
“Governo culpa empresas pelos atrasos nos vôos” e “TCU culpa governo pelo apagão aéreo”. É o velho jogo de todo mundo botar a culpa em todo mundo e ninguém tomar providência alguma, como se vê a toda hora. Nunca a culpa é do culpado, assim como o responsável pela epidemia de doenças coronárias é o Mac Donald, não os gulosos e sedentários ameaçados de enfarte, e, pelo câncer de pulmão, o fabricante de cigarro, em vez do próprio fumante. É como tirar da sala o sofá que serviu, digamos, de suporte ao adultério ou culpar os governos precedentes pelas besteiras dos atuais. Veja-se o mantra “herança maldita”, do governo Lula, usado com a finalidade de justificar os mensaleiros.
“Anac promete fiscalizar vendas de passagens aéreas”. Quase a Anac prometia não fiscalizar todo o resto do sistema de controle aéreo do país. Antes não fiscalizavam nem isso? Os pobres passageiros achavam estar num país seguro para a aviação. Vai ver, seguro mesmo é fazer como Ícaro e colocar penas coladas com cera nos braços e sair voando por aí, tendo o cuidado de não chegar perto do Sol, decisão mais sensata do que ir a um aeroporto e lá ficar preso.
E a história do aumento dos salários dos congressistas? Não satisfeitos com os escândalos dos mensaleiros e sanguessugas durante o ano, e, pode-se ver, preocupados com a própria remuneração, não com a do eleitor, eles resolveram em dezembro atribuir-se gordo aumento. “Salário de parlamentar sobe 91%”, para R$ 24,5 mil. Porém, não se iluda, leitor. Essa é só uma parte do dinheiro. Tem mais: R$ 3 mil de auxílio moradia, tenha ou não casa em Brasília o nosso caro legislador e, acredite, R$ 50, 8 mil de verbas de gabinete bem como uma cota de passagens de uso pessoal. Mas, ufa, “Congressistas vão à Justiça contra 91% de aumento”. É que a decisão esperta sobre o aumento foi tomada en petit comité, e nem tudo estará perdido onde há gente capaz ainda de indignar-se com benefícios pessoais, mas por certo contrários ao senso de justiça social.
Nada, no entanto, me faz ficar mais pessimista sobre 2007 do que a onda de violência nas grandes cidades brasileiras, como a desta semana no Rio de Janeiro, reedição de episódio semelhante em São Paulo. Se os próprios policiais são perseguidos e mortos pelos bandidos e o cidadão não pode contar com a proteção do Estado contra a violência que assassina pessoas indefesas, queimando-as dentro do transportes coletivos, algo está errado. Apenas a pobreza e a desigualdade não podem explicar tal barbárie. Enquanto não se resolvem os problemas sociais, não podemos ficar, entra ano, sai ano, sob o domínio dos bandidos.
Até onde iremos, a continuarem assim as coisas? Será preciso morrer mais homens, mulheres e crianças inocentes, pobres e ricos, até que as autoridades abandonem o jogo de empurra e cumpram a obrigação de proteger a sociedade? Será o Ano Novo o Ano Velho de sempre?

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