13 de outubro de 2002

Reforma política

Jornal O Estado do Maranhão
Os Estados mais populosos do Brasil, particularmente os do Sul, sempre se queixaram de sub-representação na Câmara dos Deputados. É comum ouvir-se dizer, de um eleitor do Acre, para ficarmos no exemplo citado com mais freqüência, que ele vale diversas vezes um do Estado de São Paulo porque, para ser eleito neste, um deputado federal precisa de muito mais votos do que no outro. Se, no caso paulista, por hipótese, forem necessários cem mil votos para eleger um desses representantes e no acreano apenas dez mil, então, claro, o eleitor do Acre equivale a dez sulistas.
Essa é, de fato, a situação. Ela surge de uma limitação imposta pela Constituição federal, com respeito à representação dos Estados na Câmara. O número de representantes de cada um aí é estabelecido na proporção direta, em princípio, de sua população. A maiores populações, portanto, deveriam corresponder, linearmente, maiores representações. Caso não houvesse limite algum, uma unidade da federação com uma população dez vezes maior do que a de outra teria uma bancada também dez vezes maior. A Constituição federal, todavia, no seu artigo 45, parágrafo primeiro, determina que as bancadas não podem ter menos de oito ou mais de setenta deputados. Esse dispositivo causa uma quebra na proporcionalidade estrita, com respeito aos Estados mais e menos populosos.
No primeiro caso, o limite cria uma sub-representação, fazendo com que, em lugar de São Paulo ter, vamos supor, oitenta deputados, número diretamente proporcional á sua população, ele fique no limite de setenta. No caso das unidades federativas menos populosas, dá-se o inverso. Em vez de terem um ou dois deputados, na proporção direta de suas populações, eles acabam ficando com oito, o número mínimo.
Mas, a questão não se esgota em apontar essa distorção, porque a intenção do constituinte foi exatamente essa, de contrapor ao poder econômico estadual que, na maioria dos casos, anda junto com o tamanho da população, uma limitação política, expressa no tamanho da representação dos Estados na Câmara. Não fosse assim, o poderio econômico dos mais populosos seria reforçado pela superioridade numérica de sua representação, criando, dessa forma, a possibilidade de um indesejável desequilíbrio federativo.
Por todas essas razões, é uma ironia a eleição, justamente em São Paulo, de deputados com cerca de duzentos ou trezentos votos. Embora por motivos diferentes dos relacionados aos critérios de estabelecimento do número de deputados de cada Estado, esses eleitores paulistas passaram a valer muitas vezes mais do que os acreanos. A razão está no arcaico sistema de eleição proporcional ainda adotado no Brasil e na Finlândia, apenas. Um candidato, Enéas, de um partido nanico, teve uma quantidade muito grande de votos, sem que isso representasse necessariamente apoio ao partido. Tratava-se somente de um tributo popular ao histrionismo do candidato.
Ao obter uma grande votação, Enéas “elegeu”, na carona de seu bom desempenho individual, vários candidatos de seu partido. No Maranhão, pessoas com uma boa votação não se elegeram, enquanto outras, com pouquíssimos votos, ganharam um mandato. Como, aliás, acontece em todos os pleitos. A aberração surge desse sistema de eleição proporcional, pelo qual um partido que conte com um “puxador” de votos é capaz de eleger outros de seus filiados com uma quantidade pequena de sufrágios, deixando de fora pretendentes de outros partidos com mais votos, mas sem os tais “puxadores”.
Acredito que já exista no país um consenso, reforçado pela ocorrência dessa distorção, que o povo não entende, sobre a necessidade de uma reforma político-partidária. Poderíamos adotar o sistema distrital de escolha dos deputados, a fidelidade partidária e o financiamento público das campanhas. Essas seriam medidas indispensáveis para dar mais estabilidade e representatividade ao sistema obsoleto atualmente em vigor e facilitar a implantação de outras reformas necessárias ao Brasil.

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