Ardil



Jornal O Estado do Maranhão


O Brasil é o país do cadastro. Eu já fiz várias vezes essa afirmativa e repito: país do cadastro. Pois não é que o ministro Orlando Silva decidiu que o cidadão brasileiro terá de fazer um cadastro se quiser ir a jogos de futebol? A proposta não surpreende, dada a simpatia de seu partido, o PC do B, pelo extinto regime ditatorial da Albânia e pelas ditaduras de um modo geral, com a só exigência de serem autointituladas comunistas da linha albanesa.
Pois bem, o burocrata, incapaz de reprimir a violência nos campos de futebol, obrigação do poder público, ou de oferecer segurança aos frequentadores, achou por bem, sob o argumento de assim preparar o país para a Copa do Mundo de 2014, transferir a tarefa aos cidadãos e tenta fazê-lo com o auxílio de um cartão eletrônico de acesso aos jogos. O lógico, contudo, caso se admitisse, num momento de burocratice explícita, a necessidade de mais um cadastro, seria construí-lo pela inclusão dos baderneiros e não do torcedor cumpridor da lei. Se a Fifa tiver notícia da insanidade, é capaz de cancelar a realização do torneio aqui.
Todos se lembrarão do cadastro do titio Berzoini, aquele do PT, ministro por algum tempo. Ele tinha gana de matar os velhinhos brasileiros. Queria dessa forma reduzir as despesas da previdência social bem como aumentar a renda per capita do país, pela diminuição do denominador da divisão da renda nacional pela população. Não deu certo. Mas, como se vê, esse pessoal é persistente.
Na finada União das Repúblicas Socialista Soviéticas, regime liberal vendido ao capitalismo internacional, segundo a inteligente e original avaliação albanesa, as pessoas eram obrigadas a tirar passaporte se quisessem viajar. Não a outros países, mas de uma região a outra da União. Não demora, o Silva vai propor a mesma coisa. Vamos imaginar a seguinte situação. Eu resolvo relaxar no Piauí, na cidade de Parnaíba, e todo contente vou até a fronteira com o vizinho estado. Lá sou barrado por falta de visto em meu passaporte, pois sem que eu soubesse os piauienses decidiram não concedê-lo. Aliás, ninguém tinha me avisado da última do ministro. Fazer o quê? Invadir o antes estado-irmão e anexá-lo ao nosso ou, pelo menos, anexar a porção piauiense do Delta do Parnaíba?
Um dia, estou em casa, filosofando sobre a influência dos meiões do jogador Roberto Carlos na perda de Copas do Mundo, e eis que, inexplicavelmente, sou tomado pelo desejo de ir a uma partida de futebol do campeonato maranhense. Corro para o estádio. Ou melhor, não corro, porque me lembro de que não sou cadastrado e, portanto, seria proibido de entrar, como um desordeiro qualquer. Devo arrancar os cabelos? Ou me valer do mercado negro e comprar por debaixo dos panos um cartão de torcedor, provavelmente falsificado? E um turista da Samoa Americana, fã do futebol brasileiro, que desejasse em sua passagem por São Luís conhecer nossos craques? Teria de passar pela burocracia estatal a fim de satisfazer um prosaico desejo pequeno-burguês?
O certo, isto é, o errado é isto. As autoridades brasileiras, ao se defrontarem com dificuldades no cumprimento de suas obrigações, passam a responsabilidade adiante, e a colocam, de preferência, nas costas do cidadão comum. Adotam a linha que lhes parece de menor resistência a sandices. Os autores de ideias como essa deveriam ser castigados como antigamente nas escolas: uma dúzia de bolo em cada mão, sem direito a choro; depois, curado o inchaço, a repetição no caderninho, mil vezes, da frase: "Devo me comportar bem".
Orlando Silva era o nome do Cantor das Multidões" da era do rádio, que gravou "Lábios que Beijei", "Carinhoso" e outros grandes sucessos populares. Ele subjugava multidões. O Orlando atual deseja subjugar também, não, como o outro, com arte. Com ardil.

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